_
_
_
_
_

Brunei começa a punir com apedrejamento o adultério e a homossexualidade

A aplicação da lei islâmica desencadeia campanhas de boicote e condenação internacional

O apedrejamento ou mutilação de membros são punições baseadas na lei islâmica (sharia) que entraram em vigor nesta quarta-feira no Sultanato de Brunei, em meio a campanhas de boicote e condenação por parte da comunidade internacional.

A reforma legislativa do Código Penal significa consumar a virada conservadora desta nação muçulmana do Sudeste Asiático governada com mão de ferro pelo sultão Hassanal Bolkiah, que assume também a função de mais alto representante do islã no país.

Mais informações
Morrer por ser gay: o mapa-múndi da homofobia
Índia despenaliza a homossexualidade
Casamentos homossexuais como resistência a Bolsonaro

O novo Código Penal inclui apedrejamento por crimes de homossexualidade e adultério; mutilação da mão ou do pé por roubo; pena capital por blasfêmia, difamação do nome do profeta Maomé e apostasia; e o açoitamento por aborto, entre outras.

A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, disse nesta semana que a aplicação dessas leis "seria um sério retrocesso para os direitos humanos em Brunei".

O novo Código Penal é brutal no seu núcleo ao impor esses métodos arcaicos de punição por atos que não deveriam ser considerados crimes", declarou nesta quarta-feira Phil Robertson, o vice-diretor do Human Rights Watch para a Ásia.

O gabinete do primeiro-ministro, cargo ocupado pelo sultão (72 anos), famoso por sua vida opulenta e vários casos de amor escandalosos, anunciou no sábado a medida com um breve comunicado no qual afirma que a sharia vai ajudar a manter "a paz e a ordem" e visa "educar, respeitar e proteger os direitos legítimos de todos os indivíduos de qualquer raça e fé".

O sultanato, próspero graças a suas vastas reservas de petróleo e gás, começou a introduzir penalidades com base na lei islâmica em 2014, com um primeiro conjunto de emendas para as condenações menos duras, em um plano de dois anos por etapas que foi suspenso temporariamente pela campanha internacional de boicote contra o emaranhado de negócios de propriedade do país.

Matthew Woolfe, fundador da organização The Brunei Project, disse que as mudanças na legislação penal criam medo e ansiedade entre os habitantes, muitos dos quais não se atrevem a falar ou só fazem isso sob a condição de anonimato.

Entre eles um bruneiano que está em processo de busca de asilo no Canadá e deixou o país por medo do futuro que o aguardava por ser transgênero.

O ator norte-americano George Clooney renovou, em um artigo publicado no órgão de mídia Deadline, o boicote aos hotéis em Brunei, incluindo o Beverly Hills, em Los Angeles, o Plaza Athénée em Paris e o Eden em Roma, uma medida à qual se uniram outras celebridades, políticos e entidades em favor dos direitos humanos.

"Toda vez que nos alojamos, nos reunimos ou comemos em qualquer um desses nove hotéis estamos dando dinheiro para quem opta pelo apedrejamento ou chibatadas até a morte de seus próprios cidadãos por serem gays ou acusados de adultério", escreveu Clooney. O cantor britânico Elton John apoiou o apelo de Clooney.

Embora o atual Código Penal já preveja a pena de morte, desde 1957 Brunei não executou ninguém.

A nova legislação será aplicada principalmente aos cidadãos que professam a fé muçulmana, que representam 70% da população do sultanato (cerca de 300.000 bruneianos), mas em alguns casos, também será empregada com estrangeiros ou pessoas de outras crenças, em sua maioria budistas e cristãos.

"Obviamente, a apostasia, que acarreta pena de morte, só se aplica aos muçulmanos. Entre as punições mais cruéis, o adultério e sodomia entre dois homens – punida com apedrejamento – serão aplicadas se uma ou ambas as pessoas forem muçulmanas. No caso de não ser um crente no Islã, não será aplicável ", diz Woolfe.

"Para a mutilação de extremidades do corpo no caso de roubo, a punição se aplica independentemente de a pessoa ser muçulmano ou não", afirma o fundador do Brunei Project. Os não-muçulmanos já eram proibidos desde 2014 de usar 19 palavras islâmicas, incluindo "Allah", e são sancionador por impressão, divulgação, disseminação e distribuição de publicações contrárias ao ensinamento islâmico.

A homossexualidade já era ilegal no sultanato. O delito por vestir roupa classificada como indecente acarreta uma pena de até seis meses de prisão e o consumo de álcool em locais públicos é punido com até dois anos de prisão.

Brunei tem um duplo sistema legal que combina tribunais civis, baseados em leis britânicas – o sultanato era o protetorado britânico até 1984 –, e os islâmicos.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_