Candidatos tentam última cartada na Globo e Bolsonaro ganha palanque na Record
Presidenciáveis tentaram constranger o deputado pela ausência no último debate. Atrás dos votos do deputado do PSL, adversários também concentraram críticas no PT
Líder das pesquisas de intenção de voto, Jair Bolsonaro (PSL-RJ) faltou ao último debate entre os candidatos à presidência desta campanha, organizado pela Rede Globo, mas seu nome frequentou as discussões mais do que qualquer outro presidenciável. De quebra, o capitão reformado do Exército ainda ganhou, no mesmo horário do debate, 30 minutos exclusivos na televisão concorrente, a Record, que dobrou a audiência na faixa das 22h e atraiu metade das atenções dirigidas ao debate. "Faz 30 anos que esse país saiu de uma ditadura. Muita gente morreu e foi torturada. Tem mãe que não conseguiu enterrar seu filho até hoje. Meu sogro me contou as torturas que sofreu. Se você vai poder votar é porque teve quem deu a vida por isso", disse Guilherme Boulos (PSOL) em um dos vários ataques diretos a Bolsonaro, que faz elogios frequentes ao regime militar.
A três dias do primeiro turno, o encontro na principal TV do país representava a última cartada dos candidatos para tentar movimentar suas intenções de voto, no momento em que só Bolsonaro aparece em curva ascendente nas pesquisas –segundo o Datafolha desta quinta, ele chegou a 35% dos votos (39% dos votos válidos). Ao longo do debate, Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT), Henrique Meirelles (MDB) e Geraldo Alckmin (PSDB) criticaram a ausência do candidato de extrema direita e a entrevista concedida à Record, além de lembrar as recentes polêmicas da campanha do deputado do PSL, protagonizadas pelo seu vice, general Hamilton Mourão, e pelo economista Paulo Guedes. Uma “entrevista em situação de absoluto controle, em tom amigável”, disse Meirelles em referência ao programa exibido pela Record — ele também lembrou o Governo Fernando Collor para criticar "salvadores da pátria".
Marina afirmou que Bolsonaro "amarelou" e Ciro lembrou que foi ao último debate presidencial com uma sonda pendurada ao corpo. "Bolsonaro hoje está de alta, deu entrevista longa e fugiu. Você acha correto que um homem que quer ser presidente do Brasil não se submeta ao debate?", perguntou a Meirelles. Em pelo menos dois momentos, os candidatos dirigiram perguntas a adversários dizendo que gostariam de fazê-las a Bolsonaro.
Ainda que a entrevista na Record seja inusual no histórico de campanhas recente brasileiro, não é a primeira vez, contudo, que um candidato bem posicionado nas pesquisas falta a um debate na eleição presidencial brasileira. Longe disso. Em suas duas eleições, vencidas no primeiro turno, Fernando Henrique Cardoso compareceu a apenas um debate, em 1994. Levantamento do portal Nexo aponta ainda que Fernando Collor de Mello não frequentou nenhum embate televisivo no primeiro turno de 1989. Em 2006, quando se reelegeu, Luiz Inácio Lula da Silva também não foi aos debates do primeiro turno, enquanto Dilma Rousseff faltou a dois debates em 2010, quando se elegeu pela primeira vez. Nesta eleição, Bolsonaro foi apenas aos dois primeiros debates, na Band e da RedeTV. Todos os outros ocorreram depois do atentado de que ele foi vítima em Juiz de Fora (MG), a justificativa de sua ausência nos embates da televisão desde então.
PT e Temer
O outro polo de ataques no debate desta quinta-feira foi o PT, que "perdeu a condição política de reunir a população brasileira para enfrentar o fascismo e a radicalização estúpida que Bolsonaro representa", segundo Ciro, que ainda tenta arrancar votos à esquerda e à direita para tentar ir ao segundo turno. Marina cobrou uma autocrítica de Haddad sobre o PT — que não veio —, enquanto o senador Alvaro Dias (Podemos-PR) compareceu ao debate determinado a mencionar os governos petistas em todas as suas perguntas, mesmo quando o tema foi definido por sorteio.
"Imaginávamos que a Operação Lava Jato tinha chegado a seu limite, mas estamos longe do fundo do poço", disse, destacando que não faz sentido debater outros assuntos enquanto a questão da corrupção não for resolvida. Ele carregava um pedaço de papel que, como repetiu em dois momentos, pretendia entregar a Fernando Haddad (PT) para que ele levasse ao "verdadeiro candidato do PT", em referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso em Curitiba desde abril.
Esse foi o primeiro debate em que Alckmin buscou o confronto direto com Haddad, longo na primeira oportunidade que teve. Ao lado de Ciro Gomes, o tucano ainda almeja votos úteis daqueles que não pretendem ver nem Bolsonaro nem um candidato do PT eleitos. Já o tucano foi o alvo preferencial de Boulos, que lhe dirigiu três de suas perguntas, geralmente o associando ao Governo Michel Temer. O presidente da República foi, aliás, outro foco de críticas, principalmente em relação a Meirelles, que foi seu ministro da Fazenda e, ao ser questionado sobre suas relações com um presidente denunciado duas vezes por corrupção, disse que é ficha limpa.
Em meio a todos esses ataques, as propostas dos candidatos acabaram diluídas. Meirelles refez suas promessas de criar 10 milhões de empregos e mencionou seu programa para criar vagas em creches. Haddad concentrou seu discurso em programas sociais, dirigido a eleitores de baixa renda. "Essa narrativa é para dizer para o eleitor 'que o tempo bom' vai voltar. É um discurso que busca ter apelo eleitoral junto ao eleitor de menor renda e escolaridade", analisa o cientista político Eduardo José Grin, professor da FGV, que comentou o embate em tempo real no EL PAÍS.
Ao falar sobre segurança pública com Boulos, Ciro Gomes destacou que "as ações da Taurus, fábrica de armas, cresceram 180%". "Tem várias pessoas associadas à turma do Bolsonaro ganhando dinheiro com a evolução das pesquisas", disse, em mais uma crítica ao deputado do PSL. O ex-governador do Ceará também destacou sua gestão no Estado, durante a qual, segundo ele, abriu duas creches por dia. Para Grin, foi uma forma de Ciro lembrar aos eleitores lulistas do Nordeste que ele também é de lá.
Já Alckmin chamou atenção para a a necessidade de reformas e para a melhoria da segurança pública. "Com esse discurso mais duro na segurança pública, Alckmin busca dialogar com o eleitor de Bolsonaro, que tem nessa visão punitiva contra o crime uma de suas bandeiras", avalia Grin. Quando Marina não estava criticando a polarização, ela destacou temas como educação. "Eu vou usar o imposto que você paga para que você possa ter educação de qualidade. Vamos criar a Renda Jovem, para que os jovens tenham uma poupança quando saírem do Ensino Médio", prometeu, falando diretamente aos eleitores.
Todas as propostas sobre segurança, saúde, saneamento básico e educação, transmitidas para a maior audiência desta campanha até agora, pareceram obscurecidas pela ausência do candidato que se tornou a referência nas últimas semanas da corrida eleitoral. O crescimento constante de seus índices de intenção de voto, que alimentam inclusive a expectativa de uma vitória no primeiro turno, parecem ter tornado todos os outros temas secundários a três dias da eleição.
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