A vitória da esquerda no México, um alerta para o Brasil?
Os problemas reais e mais angustiantes da sociedade mexicana aparecem como um espelho das inquietudes que balançam o Brasil
A vitória da esquerda no México, que governará o país pela primeira vez, é um alerta para as eleições presidenciais no Brasil. Não porque López Obrador, o vencedor, possa ser comparado com qualquer dos candidatos brasileiros, nem mesmo com Lula, mas porque os problemas que ele prometeu resolver não são tão diferentes dos enfrentados pelo Brasil.
Os problemas reais e mais angustiantes da sociedade mexicana aparecem como um espelho das inquietudes que balançam o Brasil. Lá, os três pilares que o candidato de esquerda prometeu enfrentar foram: o medo de uma violência cada vez mais sangrenta, a corrupção que afeta grande parte da classe política e empresarial e uma pirâmide social cada vez mais desequilibrada por causa das desigualdades criadas pelos privilégios das elites.
López Obrador, apesar de sua grande vitória, é um desconhecido para os analistas políticos nacionais e internacionais por seu caudilhismo e messianismo. Não há dúvida, no entanto, que com suas propostas de governo ele conseguiu convencer a grande maioria dos cidadãos a lhe dar sua confiança e eles o fizeram nas eleições mais pacíficas da história mexicana.
A receita de Obrador pode parecer simplista: combate à corrupção que, segundo ele, gerou o aumento da violência, uma das mais graves do continente. Corrupção e violência que, para o novo líder revolucionário, seriam as causas da grande desigualdade social do México, com 40 milhões de pessoas ainda vivendo na pobreza.
“Vou ouvir todos, mas dando preferência aos mais humildes e esquecidos”, resumiu assim sua promessa de combater a desigualdade social. Uma mulher na rua entendeu a mensagem e comentou: “Nunca pensei que viveria este momento em que nos dão uma oportunidade aos de baixo.” No México, como no Brasil, as oportunidades são uma iguaria para os que estão no topo.
López Obrador também conquistou o voto de milhões de jovens que, como escreveu Sonia Corona neste jornal, “são a geração do século XXI com necessidades e demandas diferentes das de seus pais e avós.” E uma dessas necessidades é a de uma vida política menos corrupta e mais próxima dos novos problemas de uma sociedade em profunda transformação. E uma sociedade onde se possa sair de casa com a certeza de poder voltar inteiro.
Novidade ou não, o desafio lançado pelo líder esquerdista Obrador foi ouvido por 53% dos eleitores, a maior votação em muitos anos no México. E o Brasil? Ignoro a leitura que os vários partidos da esquerda deste país, e especialmente o PT de Lula, estão fazendo da surpresa da vitória da esquerda mexicana. Uma coisa é certa, os pilares sobre os quais Obrador se apoiou para conquistar a sociedade farta de seus partidos de direita são os mesmos que hoje preocupam os cidadãos brasileiros: a corrupção, a insegurança e a luta por uma sociedade mais justa e mais igual. A esquerda brasileira apresenta, sem dúvida, uma sensibilidade maior que a direita em relação à angústia econômica e social da sociedade mais desamparada. O que se cabe perguntar é se os cidadãos brasileiros sentem, por parte da esquerda, essa mesma urgência em relação à corrupção e à violência. Deixar essas duas bandeiras nas mãos da extrema direita seria o suicídio da esquerda, que, como no México, teria hoje uma possibilidade de voltar ao poder. Não conseguirá sem ser tão clara quanto a direita no tocante ao que pretende fazer para regenerar a vida política e contra a violência que mancha de sangue inocente tanto ou mais que as guerras.
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