_
_
_
_

O concurso de desastres da confeitaria (e outros programas para ver na Semana Santa)

Semana Santa em casa? Sofá e pipoca? Nestes dias de recolhimento, selecionamos os programas de culinária mais divertidos para ver na Netflix, a plataforma que mais aposta na gastronomia. Amém.

Rapunzel desmilinguida.
Rapunzel desmilinguida.NETFLIX
Mais informações
Aaargh! Não faça isso à mesa
As fotos que mostram o açúcar oculto em sua comida
Curso de dois minutos para assar perus e outras aves

Se você gosta dos programas de culinária, seja na forma de documentários ou de concursos, pode se fartar com a Netflix. Talvez você não goste tanto das suas séries, é possível que no seu infinito catálogo haja mais filmes ruins do que numa videolocadora turca, mas a aposta dessa plataforma na gastronomia é pantagruélica: até dizer chega.

Netflix é para ver e para comer. Numa oferta tão colossal, você pode achar material delicioso, como a série Chef’s Table – sobre a qual falarei mais adiante –, mas também pode se deparar com pilhas de tranqueiras, como o recém-estreado Zumbo’s Just Desserts, um concurso de confeitaria que transforma o Diazepam em estimulante.

Digo isto porque a Semana Santa se aproxima, com suas tardes agônicas de recolhimento e borbulhas no nariz, e porque – depois de queimar as retinas durante semanas –, selecionei o caviar da Netflix para que neste feriadão você deguste os melhores pratos da plataforma e não acabe na Globo, vendo Charlton Heston disparando raios divinos pelos olhos.

A Rapunzel dos seus pesadelos.
A Rapunzel dos seus pesadelos.NETFLIX

Nailed It!: Onde vivem os monstros

Concurso culinário ou comédia escancarada? Chama-se Nailed It!, e à primeira vista parece um produto de baixo orçamento indigno de um Olimpo audiovisual como a Netflix. As aparências NÃO enganam: o programa foi feito com quatro dólares mal contados, o cenário é menor que o meu quarto, a aparência geral é bastante amadora, mas é mais divertido e vicia mais do que muitas séries da plataforma.

NETFLIX

Nailed It! é um concurso millenial até a medula, pois deriva de um fenômeno viral da Internet conhecido como cake fail. Ou seja: confeiteiros amadores que tentam imitar bolos maravilhosos e acabam fabricando desastres ecológicos de primeira magnitude. O concurso transfere essa ideia para um formato de concurso televisivo em que três pessoas deverão reproduzir complexos bolos profissionais num limite de tempo: o ganhador ou ganhadora leva um prêmio de 10.000 dólares. Os membros do júri são a hilária apresentadora Nicole Byer, o mestre chocolateiro Jacques Torres e um convidado que muda a cada episódio. A graça? Convidar participantes muito confiantes nas suas habilidades confeiteiras, confrontá-los com a crua realidade das suas horríveis criações e chapinhar na vergonha alheia: tão simples e tão eficaz.

Com apenas seis capítulos de meia hora cada um, esse formato supera concursos de cozinha com muito mais orçamento, talvez porque não se leve a sério, coloque o senso de humor à frente da técnica e ainda por cima queira rir conosco. Porque somos todos Nailed It!: nunca um concurso de cozinha havia gerado um efeito-espelho tão brutal. Quando você vê aqueles pobres diabos agonizando entre selvas de bolacha e montanhas de manteiga, parindo aberrações que nem a própria natureza aprovaria, é invadido por uma empatia que depois se metamorfoseia em gargalhada. Você se vê ali, na sua cozinha, criando suas próprias monstruosidades. Estende-se um fio de solidariedade entre participante e espectador. De desastre para desastre. Quando nos rimos de algum tonto e dos seus bolos disformes em Nailed It!, na verdade estamos rindo de nós mesmos. Há algo mais saudável do que isso?

A engrenagem humorística do programa funciona porque a comparação entre os bolos de alta confeitaria e as aberrantes imitações sempre acaba sendo uma cena de terror muito mais horripilante do que você tinha imaginado. O desfile de bizarrices em forma de bolo é lacrimogêneo, e contribui para gerar um clima ultradescontraído de gozação entre os membros do júri. Você se diverte tanto que os seis episódios parecem curtíssimos.

De Meu Pequeno Pônei a pudim chorão.
De Meu Pequeno Pônei a pudim chorão.NETFLIX

Tubarões radioativos de bolacha e cobertura de manteiga que parecem ter sobrevivido a um holocausto nuclear; dinossauros de marzipan que pedem aos gritos a eutanásia; vulcões doces que se confundem com montanhas de vômito; princesas comestíveis que poderiam ser filhas do Chucky, o brinquedo assassino; um Donald Trump que parece ter superado o tifo e um vício em metanfetamina ao mesmo tempo! Nailed It! é uma festa. A celebração do péssimo confeiteiro que temos dentro de nós. O anticoncurso de cozinha definitivo.

Ugly Delicious: quanto mais gorduroso, mais bonito

Se Nailed It! é minha recomendação leve para estas jornadas de contrição, Ugly Delicious se situa no polo oposto: esta série documental recém-estreada leva a comida muito, mas muito a sério. É uma celebração da gastronomia popular. Uma abordagem epidérmica, apaixonada e sem preconceitos a esses pratos que não são estéticos nem consumidos em caríssimos menus de degustação, mas que no final das contas são os que mais gostamos e mais emoções nos trazem.

Arroz frito, frutos do mar, dumplings e pizza, objetos de estudo em ‘Ugly Delicious’.
Arroz frito, frutos do mar, dumplings e pizza, objetos de estudo em ‘Ugly Delicious’.NETFLIX

Pizzas, churrascos, tacos, camarões e caranguejos, receitas caseiras, frango frito, arroz frito e coisas recheadas são os pratos escolhidos. O melhor é que nossos guias nessa viagem pela feiura são David Chang, dono do império de restaurantes Momofuku, colecionador de estrelas Michelin e outros prêmios e chef midiático por excelência, e Peter Meehan, crítico gastronômico que esteve ligado a Chang desde seu início: o livro Momofuku e a extinta revista Lucky Peach são resultado desta aliança.

Com uma plêiade de convidados como Aziz Ansari, Jimmy Kimmel, Gillian Jacobs e René Redzepi, os dois protagonistas percorrem o mundo, descobrem as origens e mutações de cada receita, emocionam-se mastigando, suam com o picante, engorduram dedos e arriscam a pele comendo. A paixão de Chang é contagiosa – e também sua veemência –: a imagem do chef chorando feito criança, depois de provar o yakitori perfeito em um restaurante japonês, vale mais que mil bocados.

Chang toma-lho muito em sério
Chang toma-lho muito em sérioNETFLIX / GIPHY

Embora caótico em sua estrutura, Ugly Delicious se revela como uma série inovadora sobre comida tradicional. Comida que não é bonita, mas, como um rio enfurecido, arrasta incontáveis histórias, emoções e formas de entender a vida. Um programa maiúsculo que se vale da celebridade dos produtos para construir relatos, nos fazer rir, chorar e debater, com os pratos mais populares e o carisma de Chang como único combustível.

Pot-pourri para glutões

Se estas duas opções não lhe convencerem, não se preocupe: a Netflix pode satisfazer seu apetite com a série de documentários Chef’s Table, uma viagem à mente dos grandes chefs do mundo, com um profundo peso filosófico e lirismo a rodo. Magia. Mas se o que você quer é se afundar na miséria, Rotten é a sua droga: outra série documental que expõe a autenticidade e salubridade dos alimentos que consumimos, abordando a crise e o colapso do sistema de produção alimentar.

Se for curioso, The Search for General Tso tentará descobrir a origem de um dos pratos mais populares da cozinha chinesa: o frango à General Tso. Se você gosta de comida japonesa, pode degustar as séries de ficção Midnight Dinner: Tokyo Stories e Samurai Gourmet – duas pequenas grandes joias que você vai amar. E não se esqueça de dar uma chance à segunda temporada da comédia Master of None, em que Aziz Ansari dá rédea solta à sua paixão pela comida e até faz uma visita à Osteria Francescana de Massimo Bottura. Vão ter que usar aguarrás para tirar o controle remoto da sua mão.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_