Nas escolas de SP, quase metade acreditam que há “trabalhos só de homens”
Pesquisa da Fundação Carlos Chagas com alunos e professores da rede pública mostra como os estereótipos de gênero ainda estão presentes na escola
Uma pesquisa realizada em escolas públicas de Ensino Médio de São Paulo aponta que os estereótipos de gênero ainda estão bastante presentes na educação. Dos cerca de 1.000 estudantes e professores entrevistados, 45,7% deles disseram acreditar que há certos trabalhos que devem ser realizados só por homens, 60,8% que as mulheres precisam prestar atenção ao tipo de roupa que usam para ir a determinados lugares e 35,6% que a mulher é mais capacitada para o trabalho doméstico do que os homens. Quase três em cada dez também afirmam que em uma profissão exercida por uma maioria de homens, dificilmente uma mulher será bem-sucedida, mesmo sendo muito competente.
O levantamento Elas nas Ciências foi realizado pela Fundação Carlos Chagas, com o apoio do Instituto Unibanco, com o objetivo de analisar como a desigualdade de gênero na educação impacta as escolhas profissionais das mulheres. Ele faz parte de uma iniciativa que fomenta projetos que buscam incentivar o interesse de meninas do Ensino Médio para a área de exatas e será apresentado nesta segunda, em um seminário no Rio que reunirá especialistas para discutir a questão.
"Nós mulheres tivemos conquistas muito grandes no campo da educação. Em pouco mais de 50 anos, somos a maioria no ensino superior, a maioria das que concluem a educação básica, estamos na pós-gradução. Mas quando a gente vai esmiuçando essas afirmativas da pesquisa, a gente percebe que esses estereótipos, que muitas vezes são considerados como superados na nossa sociedade, se mantêm. Tanto entre os estudantes como entre os professores e professoras", destaca Thaís Gava, uma das realizadoras do estudo.
Ainda que metade dos entrevistados tenha discordado, por exemplo, de que as mulheres não têm tanto interesse em física quanto os homens, 20% dos que responderam à afirmação concordaram com ela. Outros 20% também disseram acreditar que uma mulher que se torne uma boa cientista terá que abrir mão de ter filhos. E, para outros 22%, o fato de as meninas não serem boas em matemática acontece porque elas não têm interesse no assunto. Essas expectativas de gênero podem influenciar na escolha delas por determinadas áreas, como as profissões de exatas, que detém mais prestígio na sociedade e, consequentemente, um maior retorno financeiro, afirma Gava. Ou seja: em um ambiente onde se entende que determinadas coisas não são para mulheres, algumas portas profissionais podem acabar se fechando.
A pesquisadora destaca que, em 2016, as mulheres representavam quase metade dos aprovados no vestibular para a Universidade de São Paulo (USP), mas eram apenas uma em cada 5 estudantes dos cursos de ciências exatas. Naquele ano, apenas 18% dos calouros da Escola Politécnica da USP, que reúne os cursos de engenharia, eram mulheres e só 23% dos da Faculdade de Física. Ainda, segundo Gava, de acordo com o Censo da Educação Superior de 2016, 82,1% dos que cursavam enfermagem no país eram mulheres, enquanto em Ciências da Computação elas somavam apenas 13,3%.
"As mulheres estão em áreas em que o cuidado é uma característica muito forte. Geralmente, essas áreas são desvalorizadas tanto socialmente quanto economicamente. Em contrapartida, quando a gente olha para as que são mais valorizadas socialmente ou economicamente são as áreas onde há uma presença maior dos homens", destaca a autora do estudo. Por isso, ressalta o levantamento, é preciso que se criem políticas de apoio à promoção de mulheres nas áreas das exatas desde o ensino médio, que se amplie a discussão de gênero na formação dos professores de todos os níveis (já que a questão precisa ser abordada desde o ensino infantil) e que se promovam temas relacionados à diversidade dentro da escola.
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