_
_
_
_
_

América Latina fica sem presidentas

Fim da era Bachelet encerra etapa com uma destacada representação feminina nos Executivos da região

Cristina Kirchner (esquerda), ex-presidenta da Argentina, Michelle Bachelet do Chile (centro) e Dilma Rousseff, do Brasil
Cristina Kirchner (esquerda), ex-presidenta da Argentina, Michelle Bachelet do Chile (centro) e Dilma Rousseff, do BrasilCLAUDIO REYES (AFP/GETTY IMAGES)
Elvira Palomo
Mais informações
“A esquerda pensa que é a única com legitimidade para governar o Chile”
Urnas punem FARC por meio século de guerra
“Se Maduro não cumprir as condições, eu me retirarei das eleições”

Os palácios presidenciais da América Latina ficam sem presidentas. Com a passagem do bastão de comando no Chile nesse domingo, que foi da socialista Michelle Bachelet a Sebastián Piñera, se encerra uma etapa com uma destacada representação na qual quatro mulheres chegaram a comandar seus países ao mesmo tempo na região.

O fim da era Bachelet, que foi presidenta em dois períodos, o primeiro entre 2006-2010 e esse último que começou em 2014, finaliza uma etapa de referência: a das mulheres governantes latino-americanas. Quando Bachelet ocupava o Palácio da Moneda, a brasileira Dilma Rousseff (2011-2016) governava no Palácio do Planalto, a argentina Cristina Kirchner (2007-2015) na Casa Rosada e na Casa Presidencial da Costa Rica, Laura Chinchilla (2010-2014), um fato sem precedentes nessa parte do mundo.

A primeira mulher latino-americana eleita presidenta nas urnas foi a nicaraguense Violeta Barrios de Chamorro em 1990, quando venceu o líder da Frente Sandinista Daniel Ortega, atual presidente do país. Chamorro era viúva do jornalista e líder da União Democrática de Libertação (UDEL), Pedro Joaquín Chamorro, opositor à ditadura de Anastasio Somoza e que foi assassinado em 1978. Foi seguida pela panamenha Mireya Moscoso, que governou entre 1999 e 2004 – período em que os Estados Unidos devolveram ao país a soberania do Canal do Panamá –. E em 2006 Bachelet chegou ao Chile, pediatra, filha de um general torturado que morreu em uma prisão de Pinochet e ex-ministra da Saúde e de Defesa. Sua liderança sofreu altos e baixos. Bem cotada no panorama internacional após essa primeira etapa, esteve à frente da agência das Nações Unidas especializada na mulher (ONU Mulheres).

Em 2007, Cristina Kirchner chegou à presidência da Argentina, a única que conseguiu manter-se por dois períodos consecutivos, após vencer a reeleição em 2011. Antes de ocupar a presidência foi deputada e senadora durante a presidência de seu esposo Néstor Kirchner, falecido em 2010. Atualmente é senadora e a Justiça argentina a investiga sob a suspeita de ter protegido cinco iranianos responsáveis pelo atentado terrorista contra o Centro de associação judaico-argentino AMIA em 1994.

Presidentas latino-americanas a partir de 2000
Presidentas latino-americanas a partir de 2000

Dilma Rousseff foi eleita em outubro de 2010, após ocupar vários cargos no Governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Foi reeleita em 2014, mas não pôde acabar seu mandato acusada de irregularidades para maquiar as contas públicas. Após um longo julgamento político, o Senado aprovou em agosto de 2016 o impeachment definitivo de Dilma. A ex-presidenta sustentou sua inocência.

A Costa Rica também teve sua primeira mulher presidenta, Laura Chinchilla, que ocupou o cargo entre 2010 e 2014, como representante do Partido Libertação Nacional (PLN, socialdemocrata). Chinchila foi deputada, vice-ministra e ministra de Segurança, da Justiça e vice-presidenta da República durante a presidência de Óscar Arias.

“Nós mulheres voltaremos a dirigir nossos países”. Lara Blanco, diretora regional adjunta da ONU Mulheres para as Américas e o Caribe

As presidentas interinas

Antes delas outras mulheres assumiram a presidência temporariamente por diversas circunstâncias. Foi o caso de Isabel Martínez de Perón na Argentina (1974-1976), que chegou à presidência do país após a morte de seu marido Juan Domingo Perón, uma vez que era a vice-presidenta.

Na Bolívia, o Congresso designou Lidia Gueiler presidenta em 1979, após o golpe de Estado do general Alberto Natushch Busch, que derrubou o Governo interino de Walter Guevara. A previsão era que Gueiler ficasse no cargo até que se convocassem eleições em junho do ano seguinte. Antes de Hernán Siles assumir o cargo, entretanto, um novo golpe de Estado liderado por Luis García Meza obrigou Gueiler a partir ao exílio. Lutadora política progressista, membro do Partido Revolucionário de Esquerda Nacional (PRIN), foi até hoje a única mulher presidenta do país.

Em 1997, a vice-presidenta do Equador Rosalía Arteaga assumiu temporariamente a presidência do país, após a destituição de Abdalá Bucaram – declarado “mentalmente incapaz” pelo Congresso –. Seu mandato durou apenas três dias em meio a um caos político que não lhe permitiu terminar a formação de seu Governo. Arteaga, advogada e fundadora do Movimento Independente por uma República Autêntica (MIRA), foi subsecretária de Cultura e ministra da Educação com o presidente anterior, o conservador Sixto Durán. Arteaga tentou chegar à presidência, sem sucesso, nas eleições de 1998 e abandonou a política após a derrota.

No Caribe também existiram mulheres pioneiras. A juíza do Supremo Tribunal do Haiti Ertha Pascal-Trouillot também tomou as rédeas de seu país provisoriamente em 10 de março de 1990 após a saída do Estado do general Prosper Avril, depois de uma semana de protestos populares. Pascal-Trouillot convocou eleições e 11 meses depois entregou o poder ao seu sucessor, Jean Bertrand Aristide. Na Guiana, Janet “Rosenberg” Jagan foi presidenta no período 1997-1999, após a morte de seu esposo Cheddi Jagan.

De quatro a zero

Passada essa etapa em que a região foi uma referência no mundo, fica a questão de quando chegará a nova geração de presidentas. De acordo com dados da ONU Mulheres, continuam existindo diferenças nas porcentagens da média de parlamentares dependendo da região do mundo. Assim, em junho de 2007, dos países da América Latina, em 11 havia uma representação de 30% de mulheres no Parlamento, e somente a Bolívia superava a paridade, com 53,1% de mulheres. “Há cada vez mais provas fidedignas de que a liderança das mulheres nos processos políticos e de tomada de decisões melhora tais processos”, diz a instituição.

Em uma entrevista por conta do Dia Internacional da Mulher, na semana passada, a diretora regional adjunta da ONU Mulheres para as Américas e o Caribe, Lara Blanco, lamentou esse vazio, mas se mostrou esperançosa, porque “cada vez existem mais mulheres participando na política”, disse em declaração à agência EFE. “Nós mulheres voltaremos a dirigir nossos países", finalizou Blanco.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_