Paixão em linha reta: os 10 maiores casos de amor próprio do pernambucano
Em Pernambuco, os moradores têm o hábito de exaltar obras e feitos “maiores do mundo”. Para estudioso, a história de resistência do pernambucano reflete sua boa autoestima
Se você decidiu neste verão visitar Pernambuco, saiba que este estado nordestino é muito mais do que as belas praias de Porto de Galinhas, mais do que os lindos bairros históricos de Olinda e Recife, mais do que o agitado carnaval de rua... Para os pernambucanos, é tudo isso elevado à enésima potência.
Ao chegar à capital Recife, um simples bate-papo com um morador revelará um povo que gosta de exaltar determinados feitos ou características próprias — às vezes num tom de brincadeira, às vezes num tom mais sério, mas sempre como sinal de boa autoestima. Pode ser uma construção, uma atividade cultural, um hábito... Você poderá escutar, por exemplo, que a Avenida Caxangá foi durante muito tempo “a maior avenida em linha reta do Brasil” ou que o Instituto Ricardo Brennand é “o maior museu de armas brancas do mundo”. E atenção: não se trata de meros exageros, mas sim de realidade na maioria dos casos.
Antônio Paulo de Morais Rezende, professor de História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), acredita que esta característica do pernambucano de exaltar aquilo que lhe pertence reflete “a construção do imaginário coletivo social”. Ele explica que o Estado de Pernambuco, hoje muito pobre e muito desigual, foi a principal referência durante a maior parte do período colonial. “A cana-de-açúcar foi a maior riqueza da colônia e o produto que mais deu dinheiro para Portugal. Então aqui a escravidão foi muito forte e a luta pela autonomia foi muito forte... A minha interpretação histórica é que isso pode ter criado certa vaidade, uma memória coletiva de luta, de resistência”, explica ele.
Pernambuco foi, de fato, rebelde durante o período colonial e imperial: em 1817, uma série de revoltas separatistas desembocou na Revolução Pernambucana, que chegou a instituir uma república independente; em 1824, logo após a independência do Brasil, líderes pernambucanos proclamaram a Confederação do Equador, que buscava reunir as províncias de Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí; em 1848, a Revolução Praieira também pregava ideais republicanos. Paralelamente, a decadência da cana-de-açúcar provocou a mudança do eixo econômico para o Sul e Sudeste. E, como consequência, “a historiografia passou a destacar muito mais o que aconteceu no Sudeste e passou a se omitir em relação a certas coisas que aconteceram” em Pernambuco, diz Rezende. Assim, a exaltação é também “uma forma de resistência, de dizer que algo aqui é maior”. Cabe destacar que Pernambuco, em especial a capital Recife, permaneceu ao longo do tempo como um dos principais polos culturais e de vanguarda do país.
Durante uma semana no Recife, o EL PAÍS foi anotando algumas dessas anedotas que estão na boca dos pernambucanos e que, por vezes, soam como folclores locais. Eis as principais.
Avenida Caxangá
Uma das principais vias arteriais do Recife, a avenida Caxangá foi durante muito tempo, com seu percurso reto de 6,2 quilômetros, "a maior avenida em linha reta do Brasil". Ela foi superada em 1990 pela avenida Teotônio Segurando — em Palmas, capital do Tocantins —, que possui um trecho de 10,2 quilômetros em linha reta num total de 19,2 quilômetros. Isso não impede, claro, que os recifenses sigam exaltando sua avenida, construída ainda no século XIX. E que lembrem que a Caxangá continua sendo a mais longa avenida cuja extensão total se desenvolve numa linha reta.
Festa de São João em Caruaru
A festa junina brasileira foi desenvolvida no Nordeste, onde se agradece à São João Batista e São Pedro pelas chuvas caídas nas lavouras. Espalhada por todo o Brasil, ainda hoje a maior festa está em Caruaru, principal cidade do agreste pernambucano, com mais de 350.000 habitantes e a 130 quilômetros da capital Recife. Segundo os pernambucanos, trata-se da "maior festa de São João do Brasil" e da maior festa regional ao ar livre do mundo. Algo que foi respaldado inclusive pelo Guinness World Records. Mas não só isso: segundo garantem, nesta festa você também encontrará os maiores pé de moleques, os maiores bolos de milho, as maiores canjicas...
Feira de Caruaru
Também em Caruaru está "a maior feira ao livre do mundo", segundo os pernambucanos. Considerada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) como patrimônio imaterial do Brasil, na feira todo tipo de produto é vendido: comida, eletrônicos, roupas, utensílios para a vozinha, bolsas, animais, ferragens...
Galo da Madrugada
Os que estão pensando em passar o carnaval no Recife, atenção: saiba que na capital pernambucana está "o maior bloco de carnaval do mundo", um fato inclusive reconhecido pelo Guinness em 1995. O Galo da Madrugada, que começou suas atividades em 1978 para "fazer renascer o tradicional, espontâneo e criativo carnaval de rua do Recife", arrasta nos sábados de carnaval mais de dois milhões de foliões para as ruas do centro.
Instituto Ricardo Brennand
O instituto Ricardo Brennand é um castelo, inaugurado em 2002, que abriga as coleções de arte do empresário pernambucano Ricardo Brennand. As obras abrangem pinturas, esculturas, tapeçarias, artes decorativas e mobiliário. Entretanto, o castelo ficou conhecido por abrigar "a maior coleção de armas brancas do mundo". Ele chegou inclusive a ser eleito como o melhor museu da América do Sul pelo site turístico TripAdvisor.
Alto do Moura
O Alto do Moura é um bairro de Caruaru que fico conhecido por causa de um de seus moradores, o artesão Mestre Vitalino. Em seus bonecos de barro ele retratou a cultura e o modo de vida dos nordestinos, especialmente aqueles que viviam no interior de Pernambuco. Seu trabalho original, que ficou conhecido como arte figurativa, pode inclusive ser encontrado no museu do Louvre, em Paris. Já o Alto do Moura continua sendo um importante polo de produção de artesanato, ou ainda "o maior centro de artes figurativas do mundo".
Diário de Pernambuco
"O jornal mais antigo em circulação na América Latina - 192 anos de credibilidade". Este é o slogan do Diário de Pernambuco, que foi fundado em 1825 no Recife. Precisa dizer algo mais?
Shoppings em Recife
Pernambuco parece não ter apenas uma tradição em feiras a céu aberto, mas também de grandes shoppings. Inaugurado em 1980, o shopping Recife, o primeiro grande centro de compras de Pernambuco, foi considerado na época como o maior shopping do Brasil, com seus 175.000 metros quadrados de área construída. "Lembro que era muito orgulho para nós!", disse ao EL PAÍS uma recifense. Hoje, o RioMar Shopping de Recife, inaugurado em 2012, com seus 295.000 metros quadrados de área construída, é o maior da cidade e "um dos maiores do Brasil" — está em quarto lugar no ranking.
O maior consumidor de whisky
Se você digita no Google "Recife maior", automaticamente aparece, em primeiro lugar, "consumidor de whisky". Os recifenses garantem: a cidade é a principal consumidora de whisky do Brasil e uma das principais do mundo. Em 2009, a publicação inglesa The Whisky Magazine respaldou a crença e disse que a capital pernambucana detinha o maior consumo per capita da bebida em todo o mundo, com uma média de 16 doses anuais por habitante. Na ocasião, o diretor de marketing da Diageo, que controla as marcas Smirnoff, Johnnie Walker, Captain Morgan, Baileys, J & B, José Cuervo e a cerveja Guinness, explicou ao jornal Folha de S. Paulo que que a empresa executava ações específicas para Pernambuco. "O Brasil, hoje, é o país onde mais se consome Johnnie Walker Red Label no mundo, e Recife corresponde a pelo menos 40% desse volume", disse.
O encontro dos rios Capibaribe e Beberibe
Recife é uma cidade cercada por rios e cortada por pontes. Lá, os rios Capibaribe e o Beberibe se encontram antes de desaguar no oceano Atlântico. Mas os pernambucanos, especialmente os recifenses, adoram dizer que eles eles se encontram "para formar o Oceano Atlântico".
É ou não é o melhor povo do mundo?
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