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Editoriais
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Usar a Europa em vão

Bruxelas se opõe à tentativa separatista de intercessão da UE

Concentração na Praça Sant Jaume do Governo da Catalunha
Concentração na Praça Sant Jaume do Governo da CatalunhaMassimiliano Minocri (EL PAÍS)

A Governo regional catalão apela à mediação europeia para resolver em favor da independência (com as desculpas do direito de decidir ou das ações policiais do domingo) o embate que mantém com o Estado de direito espanhol.

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E depois o fará ante mais órgãos internacionais, buscando ganhar força – brandindo tristes imagens impactantes –, o que foi incapaz de conseguir dentro, pela via de convencer politicamente.

É uma apelação extemporânea. Porque essa mediação não se enquadra no Tratado da União, que em seu artigo 4 obriga todos a respeitarem a integridade territorial e a Constituição de todos os Estados membros. E é cínica porque a aliança que sustenta oscila entre a indiferença em relação à UE e a hostilidade a ela.

A Esquerra Republicana fez uma campanha agressiva contra o Tratado Constitucional, que resultou no atual Tratado de Lisboa, porque, no seu entender (certeiro) não abrangia o direito à secessão. O Convergència (hoje PdeCat) chegou a beirar essa mesma posição, provocando uma crise considerável com seus setores mais europeístas.

E o antissistema CUP renega a Europa, à qual tacha de expressão máxima do neoliberalismo capitalista e cuja bandeira queima alegremente nas ruas. Talvez ignore que a mais frequente crítica ao clube comunitário é exatamente a contrária: está nas mãos de seu impressionante Estado de bem-estar, que sobreviveu aos embates dos desreguladores; dos ideólogos do anarquismo conservador e da Grande Recessão, que levou ao extremo a ideia de desmantelar direitos e subsídios do modelo social invejado no mundo inteiro.

O caráter fraudulento da pretensão separatista se evidencia em que pede à Europa apoio mediador para uma causa cuja última finalidade é a fragmentação do Estado. Ou seja, exatamente o contrário da filosofia fundacional da UE, que postula a superação dos demônios que os nacionalismos excludentes sempre trouxeram para a Europa.

Além do mais, essa mediação é pedida para um diálogo que na realidade é um ultimato, pois apresenta como requisito irrenunciável a aceitação de um falso direito a votar a separação ou, diretamente, o reconhecimento da independência.

Ao cinismo dessa petição se soma o viés oportunista de sua formulação. Já fica evidente que esse plano é uma mera operação de propaganda. Busca caricaturizar a democracia espanhola como um Estado democraticamente inviável, com o objetivo de forjar um álibi para uma secessão “remediadora”, que alivie os excessos de uma (inexistente) ditadura.

Não será assim, como reiterou nesta segunda-feira a Comissão Europeia, porque a UE está obrigada a respeitar a integridade territorial de cada Estado membro e suas respectivas Constituições. E em consequência porque a solução para o litígio tem surgir em todo momento a partir do ordenamento espanhol.

O Governo de Mariano Rajoy tem de empenhar-se a fundo nisto, depois de ter dilapidado uma a uma todas as oportunidades de se contrapor à máquina de propaganda separatista. Sua ausência na recente cúpula da UE em Tallin, onde devia ter explicado as razões que sustentam a razão do Estado de direito espanhol, é o símbolo perfeito de todas as suas ausências.

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