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Ciro Gomes: “Essa violência difusa, de garotos se matando, é nossa grande frustração no Ceará”

Pré-candidato, que usa conquistas do Estado como vitrine, fala da escalada de homicídios

Ciro Gomes em seu apartamento na Santa Cecília, em São Paulo.
Ciro Gomes em seu apartamento na Santa Cecília, em São Paulo.TONI PIRES

Homem-forte da política do Ceará, Ciro Gomes usa do Estado governado por seu aliado, o governador petista Camilo Santana, como vitrine de sua pré-candidatura à presidência da República. Apesar de não ter cargo formal na administração, fala como se estivesse também no comando, seja qual for o setor. Repete os bons índices de educação básica, destaque nas avaliações nacionais, mas se vê às voltas com a escalada da violência no Estado que ganha holofotes nacionais. Uma parte da longa entrevista que concedeu ao EL PAÍS foi para comentar o tema.

Pergunta. Falando sobre um problema do Ceará. Violência. Há pessoas lá que dizem não ter coragem de andar dez minutos com segurança em alguns bairros.

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Resposta. Ei, eu moro lá. Não ando com segurança, dirijo meu próprio carro. O problema é a caricatura. Não estou dizendo que o Ceará é um paraíso, não. O Ceará é um dos Estados mais pobres do Brasil. O que eu estou é querendo mostrar de onde vem minha convicção de que o Brasil pode fazer diferente. O Ceará é mais pobre e consegue essas coisas. Você acha que a gente vai conseguir enfrentar a violência sem educar o povo? Cem por cento das pessoas sabem que não e nós estamos tentando educar o povo. Você acha que vai ter combate à violência se você não melhorar a renda per capita? O Ceará acabou de multiplicar uma vez e meia seu PIB industrial com um empreendimento que nós fizemos rodar depois de 30 anos de luta, a siderúrgica do Pecém. Nós estamos funcionando, levamos um calote do Lula e da Dilma na refinaria (da Petrobras), que estava lá com terreno, com tudo, com gastos monstruosos do Estado para fazer, mentiram para nós e estamos com essa pendência. O Ceará tem aumentado consistentemente sua renda per capita e a violência explodiu.

P. Qual o seu diagnóstico?

R. Boa pergunta. Estou agarrado nesse assunto. Estamos tentando de tudo.

P. A avaliação de alguns analistas lá no Ceará é de que esse secretário é linha dura.

R. O novo. Porque tentamos os linhas-mole também. Tentamos tudo. Estou aprovando esse secretário, mas com os linha-mole os índices de homicídio estavam caindo e agora com linha-dura está aumentando.

P. Há críticas às buscas e apreensão por zona…

R. Eu mesmo coordenei, a pedido do Cid, para fazer uma avaliação. Eu mesmo coordenei todos os esses experimentos. Nas drogas nós estamos acertando a mão. A política de droga para o usuário, redução de danos. Somos o único Estado que tem vagas sobrando para internação, mas não usamos internação compulsória. Não temos cracolândia. São os homicídios de jovens na periferia que está nos assustando e ninguém sabe o que fazer. Tolerância Zero, ainda foi o Tasso. Trouxemos o cara de Nova York e não funcionou. Polícia comunitária: copiamos o exemplo, ronda do quarteirão, triplicamos o efetivo, o nível de formação do policial do Ceará, inclusive acho que isso virou um problema, é o melhor do Brasil. Nós estamos com 70% dos novos policiais de rua com nível superior e eles têm horror a pegar num revólver para enfrentar a confusão. Então é um problema grave, gravíssimo. Agora o PCC foi criado em São Paulo e está lá? E sou eu que vou responder pela atuação de uma cria de 20 anos de omissão dos tucanos e que se estabeleceu nos presídios de Fortaleza?

P. Seja como for, o próximo presidente vai ter que responder a essa questão. Algumas pessoas enxergam que o Bolsonaro, por exemplo, tem uma resposta, ao menos retórica, para esse clamor.

R. Então elejam o Bolsonaro. Você já perguntou para ele?

P. Não se trata disso, candidato.

R. Hoje é a nossa grande frustração no Ceará. Um Estado onde a saúde está bombando, a educação está bombando, a economia, e a violência só cresce, especialmente homicídio entre os jovens. O resto até está diminuindo. Sequestro nós acabamos. Porque é um lugar onde temos uma polícia técnica científica, o que é de mais moderno, e zeramos o sequestro, que era de 26 por ano na média. Mas essa violência difusa, de bairro pobre, de garotos se matando é uma coisa absolutamente chocante. Em Sobral: nós temos a melhor educação do país, renda per capita maior que a de Fortaleza, uma cidade de 200.000 habitantes com 28.000 estudantes universitários. Todos os indicadores, de formação de plateia e a violência explodindo.

P. Estamos numa fase de diagnóstico, então.

R. Eu tenho meu diagnóstico, mas eu não sou especialista no ramo. Eu acho que o que produz isso é um fenômeno global, que foi tropicalizado no Brasil em suas caricaturas mais graves, que é o seguinte: a felicidade como objetivo de vida transitou de um ambiente espiritual, e eu não estou falando de religião, para o consumismo. E o garoto precisa dos elementos simbólicos, os símbolos de aceitação pelo grupo, a menininha admirá-lo. (Para isso) ele precisa portar esses elementos simbólicos - o celular - e ele não tem renda para isso. A vida é uma crônica de frustrações e ele quer morrer. Ele quer simplesmente tomar e morrer. É uma pulsão suicida, na minha opinião.E isso é fruto dos valores hoje no país. 76% das famílias de Sobral hoje são monochefes, as mulheres chefiando. Fizemos uma pesquisa importante lá ouvindo usuários e presos e mães e vítimas de homicídio e é  impressionante: 80% dos garotos que mataram ou morreram conheceram pela primeira vez a droga em casa, a arma também. Mas vamos mexer nisso, estamos mexendo.

P. Por que a educação não é um elemento que ajuda?

R. É claro que ajuda. Essa meninada que está tendo essa oportunidade mais recente acredito que terá outro destino. Essa criançada que está acolhida, que está em tempo integral na escola, zero chance de se envolver nisso. Quase 200 são escolas profissionalizantes. Zero incidência de crime nesses entornos. Acho que vai ser por aí.

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