Os principais pontos das eleições que dividem a Venezuela
Maduro convoca para a eleição de uma Assembleia Nacional Constituinte no dia 30. A oposição rejeita a convocatória porque as bases do pleito favorecem o chavismo
O Governo de Nicolás Maduro convocou os venezuelanos às urnas no próximo domingo, dia 30 de julho, para eleger os membros de uma Assembleia Nacional Constituinte que rejeita explicitamente a oposição e que o regime chavista vê como uma saída para restabelecer a ordem no país, mergulhado há três meses em constantes protestos de rua que já causaram quase uma centena de mortos. Com que Maduro está jogando nessas eleições para escolher deputados encarregados de reescrever a lei fundamental e por que são tão polêmicas?
Para que uma Assembleia Constituinte?
Foi o próprio presidente, amparado pelo artigo 347 da Constituição, que convocou as eleições em 1º de maio. Detalhou na época que não queria uma assembleia “dos partidos de elite”, mas “uma Constituinte cidadã, operária, comunitária, camponesa”. Segundo Maduro, este projeto representa a última possibilidade para “o diálogo profundo” na sociedade e a paz no país. A oposição denuncia que, por trás da convocação, se esconde o propósito de estabelecer um novo marco normativo que permita ao regime desfazer-se dos poderes públicos que hoje o incomodam, como a Assembleia Nacional e a Promotoria, adiar eleições e dar um passo decisivo para um Estado autoritário.
O que se elege no domingo, 30 de julho?
Os venezuelanos elegerão 545 deputados. Deles, 364 serão representantes territoriais e 173 do denominado “âmbito setorial” —24 dos estudantes; oito dos camponeses e pescadores; cinco dos empresários; outros tantos das pessoas deficientes; 28 dos aposentados; 24 dos conselhos comunitários e 79 de sindicatos e grêmios— e 8 das comunidades nativas.
Quem concorre?
De pouco mais de 50.000 pessoas que se apresentaram por conta própria ou sob os auspícios de grupos de eleitores, o órgão eleitoral aprovou quase 6.000 candidatos. As condições determinadas para o pleito proibiram candidaturas dos partidos políticos, uma estratégia do Governo para evitar que o voto reflita uma rejeição à sua gestão. No entanto, a maioria dos candidatos são membros do partido do Governo e aliados, ou pelo menos simpatizantes. Vários ministros e figuras próximas ao regime renunciaram de seus cargos para concorrer à Constituinte. Não se registrou nenhum candidato, porém, cujas propostas sejam contrárias às premissas do Governo.
Se, como diz a oposição, o Governo é minoria e por isso evitou as convocatórias a referendo revogatório e a eleições regionais, por que resolveu organizar eleições?
Pelo desenho sectário e sob medida do pleito, estabelecido nas chamadas “bases comiciais” que o presidente Maduro, por ser quem convocou a Assembleia Constituinte, redigiu e publicou mediante decreto presidencial em 23 de maio, e o órgão eleitoral aceitou como oficiais. Nessas bases se desfazem os circuitos eleitorais tradicionais e se adota a paridade de um deputado “territorial” por município, sem importar a população da circunscrição. Com isso, outorga-se uma vantagem desproporcional às zonas rurais, onde a situação conserva certo apoio e tem maior poder para pressionar os eleitores. Assim, por exemplo, um voto no estado de Falcón, uma província semirrural do noroeste da Venezuela, “vale” 26 vezes mais do que um de Caracas, fortemente antichavista. Além disso, a definição dos chamados “setores” segue critérios obscuros que, em todo caso, se alinham com os âmbitos de ação das missões sociais do Governo, quando não se trata de grupos abertamente pró-governamentais, como as comunas. A introdução do “âmbito setorial” corporativo também faz com que cerca de 70% dos eleitores possam votar para dois cargos, enquanto um em cada três só o fará para um.
E se mesmo assim a oposição pudesse vencer, por que não participaria das eleições?
Além de sua relutância em legitimar um recurso que representa uma fuga para a liderança do regime, a oposição questiona a negativa de Maduro a submeter a referendo popular o chamado a escrever uma nova Constituição. Em 1999, o próprio comandante Hugo Chávez convocou um referendo, que ganhou, antes de reunir a assembleia. É uma objeção compartilhada pela ala “crítica” do chavismo, que pela primeira vez se pronuncia em público contra o que considera uma tentativa da cúpula de Maduro de conservar o poder rebaixando a Constituição original “de Chávez”.
Diante dessas sinalizações, Maduro respondeu afirmando que o propósito da iniciativa é aperfeiçoar a Constituição de 1999, que o próprio comandante revolucionário imaginou. Também prometeu que o texto constitucional que resultar da assembleia será submetido a um referendo.
Se o Governo não tem adversários nas eleições, são relevantes os resultados de domingo?
Sim. Uma presença nas urnas abaixo de 25% do padrão eleitoral (com um total de 19 milhões de eleitores) ou menor do que os 7,5 milhões de participantes que a oposição diz ter convocado para sua consulta popular oficiosa em 16 de julho representaria um revés político para o Governo e tiraria legitimidade da Assembleia. Por isso, a situação aposta todas as suas fichas em garantir que haja votantes nesse dia. Pressiona os funcionários públicos e promete controlar, mediante o chamado “Carnê da Pátria”, a presença dos beneficiários de seus programas sociais aos locais de votação. Também conta com a cumplicidade do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), dominado por ele. O CNE recentemente aprovou que os eleitores que se sentirem ameaçados pela violência da oposição em seus centros de votação podem ir a outras mesas; ao mesmo tempo, tornou praticamente impossível votar em branco no dispositivo eletrônico.
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