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Depoimento de Lula a Sérgio Moro: o que diz a acusação e o que diz a defesa

Advogados do ex-presidente pediram adiamento em tribunal, mas recurso foi negado nesta terça Apartamento no Guarujá é principal mote da acusação contra o petista neste processo da Lava Jato

Gil Alessi

Nesta quarta-feira o ex-presidente Luiz lnácio Lula da Silva ficará frente a frente com o juiz Sérgio Moro pela primeira vez. Sentado no banco dos réus, o petista terá que depor sobre o caso do tríplex no Guarujá com valor estimado de 3,7 milhões de reais. De acordo com denúncia da força-tarefa da Operação Lava Jato, o imóvel foi ofertado a ele pela empreiteira OAS como parte do pagamento de propinas devido ao PT referente a três contratos obtidos pela empreiteira junto à Petrobras. Localizado no edifício Solaris, o imóvel se tornou uma dor de cabeça para Lula e alvo de uma guerra de versões sobre a real titularidade do apartamento. Neste processo - o petista já é réu em outros quatro casos -, ele responderá pelos crimes de corrupção passiva, ativa e lavagem de dinheiro. Ainda não há prazo para que Moro termine o julgamento. Caso seja condenado, o petista ainda poderá recorrer à segunda instância.

O edifício Solaris, onde fica o tríplex.
O edifício Solaris, onde fica o tríplex.Divulgação

A defesa de Lula tentou adiar o depoimento, alegando que não tinha tido tempo de analisar cerca de 100.000 páginas anexadas após um pedido seu pela Petrobras ao processo, mas o recurso foi negado. Em setembro de 2016, ao apresentar a denúncia contra o ex-presidente, o procurador Deltan Dallagnol chegou a afirmar que ele era o "maestro de uma organização criminosa". A apresentação foi marcada pela exibição de um controverso powerpoint no qual todas as setas - "José Dirceu", "Petrolão", "Mensalão" e "Vértice comum" - convergiam para o nome de Lula. O ex-presidente, no entanto, não foi denunciado formalmente por formação de quadrilha.

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No mesmo processo Lula também é julgado pelo recebimento de vantagens indevidas por parte da construtora, que teria arcado com os custos do transporte e armazenamento de seu acervo presidencial. A defesa alega que este tipo de prática é comum com ex-presidentes, e que diversas empresas colaboram com a manutenção dos acervos e dos Institutos criados pelos ex-mandatários após o término do mandato.

A denúncia da força-tarefa da Lava Jato, de que o tríplex seria "reservado" a Lula, foi reforçada pelos depoimentos de executivos da OAS, dentre eles o ex-presidente da empreiteira, Leo Pinheiro, que negocia um acordo de delação premiada com a Justiça. No entanto, a defesa de Lula afirma que as provas concretas apresentadas são bastante tênues e que Lula jamais foi proprietário.

Entenda o caso.

De quem é o tríplex?

Formalmente o apartamento está registrado em nome da construtora OAS. O imóvel foi assumido da Bancoop, cooperativa insolvente do Sindicato dos Bancários de São Paulo. Após adquirir o empreendimento, a empresa reformou o tríplex com seus próprios recursos, a um custo estimado de mais de um milhão de reais.

Lula nunca foi dono de nenhuma unidade do Solaris?

O ex-presidente e sua mulher, Marisa Letícia, morta em fevereiro deste ano, adquiririam em 2005 uma cota de investimento no prédio. Como a Bancoop, responsável pela obra, teve dificuldades financeiras, em 2009 a OAS comprou o empreendimento. Foi dado um prazo para que os detentores de cotas vendessem sua parte ou adquirissem o imóvel. Segundo o Instituto Lula, Marisa, a titular da cota, “perdeu a assembleia e o prazo [para optar com relação à compra do apartamento] em 2009. Perdeu assim a unidade que estava reservada para eles, a 141. Mas seguiu com o valor investido no empreendimento, declarado no Imposto de Renda”.

Por que a acusação diz que a unidade em questão estava reservada para a Lula?

O Ministério Público, endossado por alguns executivos da OAS, afirma que o apartamento seria repassado a Lula e seu valor seria abatido dos créditos que o PT teria a receber por conta de propinas de contratos firmados entre a empreiteira e a Petrobras. A defesa do ex-presidente reafirma que, segundo os próprios funcionários da OAS, formalmente o imóvel sempre foi da empresa.

Mesmo após ter desistido do imóvel no Guarujá em 2009, Lula o visitou em 2014 na companhia do empreiteiro Léo Pinheiro

O tríplex não é o único imóvel ligado a Lula que a força-tarefa acredita ser fruto de propina: existe também a polêmica envolvendo um sítio em Atibaia, que também seria um presente de empreiteiras para o ex-presidente. Este caso é investigado em outro processo.

O ex-presidente chegou a visitar o imóvel?

Mesmo após ter, de acordo com a defesa, desistido do imóvel no Guarujá em 2009, Lula o visitou em 2014 na companhia do empreiteiro Léo Pinheiro. De acordo com informações preliminares, a empresa gastou mais de 1 milhão de reais na reforma do tríplex, que incluiu a instalação de um elevador privativo no apartamento. O Instituto Lula afirma que “o valor da cota [adquirida em 2005] foi mantido aguardando a conclusão do edifício. Quando ele foi concluído, visitaram uma unidade, a 164 A, para avaliar a compra”. Em 2014 Lula e Marisa desistiram de adquirir o tríplex: "Mesmo tendo sido realizadas reformas e modificações no imóvel (que naturalmente seriam incorporadas ao valor final da compra), as notícias infundadas, boatos e ilações romperam a privacidade necessária ao uso familiar do apartamento", diz a nota do Instituto Lula.

A mulher do ex-presidente, Marisa Letícia, e um dos filhos do casal também visitaram o local em 2014, na companhia de funcionários da empreiteira.

Que provas e depoimentos corroboram a versão do Ministério Público?

Em depoimentos vazados à imprensa, Leo Pinheiro teria afirmado que acertou com o então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, que o valor do imóvel seria abatido dos crédito que o partido tinha com a OAS fruto de propina. “Nesse contato, perguntei para João Vaccari se o ex-presidente Lula tinha conhecimento do fato, e ele respondeu positivamente”, teria dito o empreiteiro. Roberto Moreira Ferreira, que trabalhou na construtora até o início de 2017 e era responsável pelas benfeitorias feitas no tríplex, afirmou a Moro que a unidade estava “reservada” para Lula.

Os advogados de Léo Pinheiro entregaram à Justiça documentos para endossar a tese de que Lula seria o beneficiário final do tríplex. Entre as provas estão registros de que veículos registrados em nome do Instituto Lula passaram pelos pedágios rumo a Guarujá entre 2011 e 2013. No entanto, os documentos não apontam que eles se dirigiram para o edifício Solaris.

Além disso, foram anexados e-mails com a agenda do ex-presidente onde constam encontros com Pinheiro, e registros telefônicos de conversas entre o empreiteiro e pessoas ligadas ao Instituto Lula.

Léo Pinheiro também teria afirmado em seu depoimento que o ex-presidente pediu, em 2014, que ele destruísse as provas que pudessem incriminá-lo. Como isso foi dito durante a oitiva feita ao juiz Moro, não consta na denúncia do Ministério Público, mas provavelmente Lula será questionado pelo magistrado sobre o assunto.

O que a defesa diz sobre o fato do imóvel estar “reservado” para Lula?

De acordo com a defesa de Lula, documentos apresentados “provam que a empresa [OAS] não somente era dona, mas usava seu apartamento tríplex no Guarujá como garantia em contratos com terceiros”. Ou seja além da OAS ser proprietária de fato do imóvel, “se dispôs a entregá-lo a terceiros em caso de necessidade”. “Se o apartamento estivesse destinado ao ex-presidente da República, a OAS jamais o teria oferecido como garantia em um contrato”, afirmam os advogados do petista, que dizem também que a propriedade consta na recuperação judicial da companhia como parte do patrimônio.

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