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Macri, ex-sócio de Trump, inquieto diante de uma guinada que o prejudica

O Governo argentino apostou em Clinton. “Vamos nos adaptar”, diz a chanceler

Carlos E. Cué
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, numa entrevista coletiva em outubro.
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, numa entrevista coletiva em outubro.Presidencia

A política argentina passou um ano inteiro olhando para os EUA para quase tudo. A relação tinha se recomposto depois de anos de confronto durante o kirchnerismo. O apoio da administração de Barack Obama, que viajou para Buenos Aires em março numa visita histórica, foi determinante para que a Argentina voltasse aos mercados financeiros, fechasse um acordo com os fundos abutre e que Mauricio Macri conseguisse um apoio internacional ainda maior daquele que tem em seu próprio país. Por isso as eleições nos EUA tinham, para a Casa Rosada, sede do Governo argentino, um valor especial. E a vitória de Donald Trump, que Macri conheceu muito bem, porque foram sócios na década de 80, criou um desconcerto absoluto.

O Governo de Macri apostou claramente em Hillary Clinton, sem dissimulação, e sua derrota deixou todos deslocados e afundados nos cálculos econômicos e políticos das consequências de uma guinada que contradiz completamente a aposta de Macri na ortodoxia e na abertura econômica. Macri se limitou a um rápido cumprimento diplomático no Twitter: “Felicito Donald Trump por sua vitória e espero que possamos trabalhar juntos pelo bem dos nossos povos”. Susana Malcorra, a chanceler, que poucas horas antes tinha insistido que a Argentina estaria “mais confortável” com Clinton, também escolheu essa via, mas sem dissimular sua decepção.

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“O povo americano falou nas urnas. Donald Trump venceu. Felicitações pela democracia e suas instituições”, afirmou Malcorra no Twitter, onde também disse: “Felicitações a Hillary Clinton pela grande eleição. Uma pena não ver uma mulher tão capaz eleita para essa importante responsabilidade”. Mais tarde, na rádio Mitre, admitiu sua frustração: “Temos de nos adaptar. Já estamos fazendo contatos para fazer fluir essa relação”. Malcorra — que fracassou recentemente em sua tentativa de se tornar secretária-geral da ONU — também criticou que não foi eleita uma mulher à frente dessa organização.

Macri é um dos presidentes que melhor conhece Trump. Mas não pela política. Ambos mantiveram uma relação intensa e conflituosa quando quiseram fazer negócios imobiliários juntos em Nova York, em meados dos anos 80. Encontraram-se em inúmeras ocasiões, jogando golfe e se divertindo, mas a relação não funcionou e Macri acabou vendendo sua parte aos Trump. Desde então, quando perguntado sobre Trump, Macri muda de expressão ao lembrar esses anos de negócios milionários e constantes viagens para Nova York com seu pai para ver o magnata. A recordação que ficou para ele do mundo de Trump não é em absoluto positiva, apesar de que seu percurso pessoal tem algumas semelhanças, pois ambos são milionários e ricos herdeiros que chegaram à política vindos do mundo dos negócios.

A inquietude argentina é principalmente econômica. O apoio das empresas e, especialmente, do mundo financeiro dos EUA é fundamental para o país sul-americano, que continua apostando num endividamento pesado e precisa de investimento estrangeiro o mais rapidamente possível. A equipe econômica de Macri é muito influenciada pelos EUA, um país para o qual a maioria deles viaja constantemente e onde alguns ministros têm suas poupanças.

O paradoxo que o Governo argentino enfrenta é que enquanto Trump está apostando em limitar o livre comércio, na América Latina presidentes como Macri, o brasileiro Michel Temer ou o peruano Pedro Pablo Kuczynski encabeçam uma onda a favor da abertura comercial e da aproximação com os EUA que não se via há muitos anos na região. O momento mais pró-EUA da América Latina coincide assim com um presidente que, ao menos pelo que disse em campanha, pretende se fechar e apostar no protecionismo que até então dominava na política latino-americana.

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