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Editoriais
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Um muro de democracia anti-Trump

Sua vitória, legítima, o obriga a respeitar o sistema que o levou ao poder

O presidente norte-americano, Barack Obama, junto ao vice-presidente, Joe Biden, durante sua primeira declaração sobre as eleições.
O presidente norte-americano, Barack Obama, junto ao vice-presidente, Joe Biden, durante sua primeira declaração sobre as eleições.MICHAEL REYNOLDS (EFE)

Após a vitória inesperada de Donald Trump nas eleições norte-americanas, tanto a candidata derrotada, Hillary Clinton, quanto o presidente Barack Obama, concordaram em reconhecer a Trump como legítimo vencedor. A primeira, além disso, também se ofereceu para ajudar o novo presidente a unir o país e, o segundo, a realizar uma transição de poder tão exemplar como a que o beneficiou ao receber a presidência de George W. Bush em 2008. Com essas duas declarações Clinton e Obama exibem seu espírito democrático e sua fé na solidez das instituições da democracia norte-americana.

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Precisamente porque duvidamos que Trump teria se comportado de forma tão exemplar se houvesse perdido é que comemoramos um gesto que não só mostra como Clinton e Obama estão acima de alguém como Trump, mas também elimina qualquer possibilidade de abertura de um período de incerteza e deslegitimação que seriam ainda mais prejudiciais do que já representa a vitória de Trump.

Mas admitir a vitória, como observou Hillary Clinton, não significa abdicar da responsabilidade. Embora Trump, em seu discurso de abertura, tenha oferecido um perfil conciliador e moderado, seria ilusório pensar que esse discurso mostra que, depois de alcançada a vitória e de ter chegado à Casa Branca, Trump vai se reinventar como um líder moderado, respeitoso de todos os credos, raças e ideologias. Todos os fatos, promessas e ameaças que pontuam seu caminho até a Casa Branca são tão graves e tão alarmantes que as pessoas de bem nos EUA ou no exterior, longe de conceder um voto de confiança a Trump, devem se unir e lançar uma mensagem de forte rejeição e firmeza contra qualquer tentativa de Trump de — aproveitando sua vitória nas urnas — passar por cima dos direitos básicos dos norte-americanos.

Seria ilusório pensar que o novo presidente vai se reinventar como moderado e respeitoso

A combinação de uma presidência com amplos poderes executivos com um Congresso dominado pelos republicanos (tanto o Senado quanto a Câmara dos Representantes ficaram tingidas de vermelho, a cor republicana) vai significar um verdadeiro teste de estresse para a democracia norte-americana. É hora de que as instituições independentes desse país, do Supremo ao FBI passando pela Reserva Federal, com a ajuda dos meios de comunicação, cumpram seu papel de assegurar que os princípios básicos da democracia norte-americana, incluindo a separação de poderes e a submissão à lei, estejam fora do alcance de um demagogo perigoso como Trump.

É verdade que, para muitos, nos EUA e fora, a escolha de Trump significa um duro golpe ao sonho americano, entendido como a garantia de igualdade de oportunidades dos cidadãos independente de seu credo, raça, sexo, origem ou condição social. Mas embora não confiemos em Trump, acreditamos na força da democracia norte-americana e na crença de que o único império possível é o da lei.

Desconfiamos de Trump, mas estamos confiantes na força da democracia dos EUA

Quanto ao resto do mundo, a atitude deve ser a mesma que desenharam Clinton e Obama: mão estendida para cooperar na resolução dos problemas que envolve a todos, mas firmeza absoluta para exigir que a política externa dos EUA não destrua décadas de compromissos políticos, econômicos e de segurança alcançados depois de muito trabalho. Da mudança climática até a segurança internacional passando pela pobreza, as pandemias ou as leis penais, os desafios que a humanidade enfrenta exigem mais, não menos, governança global, instituições multilaterais e recursos financeiros.

Então preocupa muito que, com Trump, os EUA se voltem para o nacionalismo econômico, usem seus próprios interesses como critério e comecem a desmantelar todo o tecido de acordos que garantem nossa paz e segurança compartilhada. Os líderes populistas do mundo têm todas as razões para aplaudir a vitória de Trump como se fosse própria — os da extrema-direita fizeram isso abertamente, os da extrema esquerda se protegeram atrás de declarações sobre as classes populares —, pois permite que amplifiquem em casa suas reivindicações nacionalistas e soberanistas. Poderíamos facilmente estar vendo o início de uma dinâmica que faria o Brexit empalidecer. Os EUA são a chave da ordem internacional: se essa peça for removida, essa ordem se tornará ipso facto naquilo com que Moscou, Pequim e outras capitais sonham: uma selva, onde vai imperar a lei do mais forte. O mundo também deve estar firme e vigilante.

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