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Secundaristas são pressionados, mas ocupações resistem nas escolas do Paraná

Justiça determina a reintegração de posse de 25 colégios em Curitiba e movimentos pressionam pela desocupação, mas estudantes prometem resistir

O Colégio Estadual do Paraná, que segue ocupado.
O Colégio Estadual do Paraná, que segue ocupado.Geraldo Bubniak

Os secundaristas do Colégio Estadual do Paraná, no centro de Curitiba, passaram a manhã deste sábado varrendo os corredores da escola. Depois que a Justiça determinou a reintegração de posse de 25 colégios da cidade nesta sexta-feira, os alunos estavam prestes a desocupar o prédio, onde se alojaram desde o dia 6. Mas, em uma assembleia realizada no início da tarde deste sábado, decidiram permanecer no colégio e resistir. “Não vamos desocupar hoje”, disse Lyah, estudante do segundo ano do ensino médio. “Nem nós, e nem os outros colégios [os outros 24 que constam na determinação da Justiça]. Vamos resistir”.

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Esse sentimento tem guiado os estudantes em um movimento que chega a cerca de 800 escolas ocupadas, contra a PEC 241 e a reforma do Ensino Médio, e completa um mês na semana que vem. Junto com as escolas paranaenses, há outras dezenas de instituições de ensino ocupadas no país. Os protestos se adensaram no Estado, que vive a véspera do segundo turno em três cidades, e deve alterar a rotina de 700.000 eleitores nesta eleição de domingo. Tornaram-se, também, a ponta visível dos focos de resistência às mudanças que começaram a chegar à Educação com o Governo Temer: redução de investimento com a PEC 241, e mudanças de currículos que ainda não são consenso com a reforma.

Manter as ocupações virou uma questão central no Paraná, ainda mais quando os estudantes da cidade de São Paulo, que tiveram êxito no ano passado ao adotar essa tática no ato contra a reorganização escolar do Governo Alckmin (PSDB), foram mal-sucedidos em sua tentativa desta vez.

Ceder é desarmar o movimento como um todo, por isso a decisão dos alunos, tanto do Colégio Estadual do Paraná, quanto dos outros colégios, é de resistir à ordem da Justiça. Dois fatores beneficiam os alunos curitibanos, pelo menos até agora. A capital paranaense está em clima de véspera de eleição, um momento em que os políticos tentam se eximir de questões mais espinhosas. O Governador do Estado, Beto Richa (PSDB), por sua vez, tem se manifestado oficialmente contra as ocupações, mas tem medido seus gestos, à sombra do dia 29 de abril do ano passado. Naquele dia, durante a greve dos professores do Estado, mais de 200 pessoas ficaram feridas durante a repressão policial ao movimento. As imagens de cachorros mordendo professores e balas de borracha atiradas até contra jornalistas, chocaram o mundo e tiraram de Beto Richa muito do seu capital político.

O Governo, porém, aposta que a segunda-feira, dia 31, será o dia D para o fim das ocupações. “Até às 18 horas de segunda-feira, todas as escolas devem ser desocupadas. Se isso não ocorrer, vamos partir para a reintegração de posse e tomar as medidas legais, com responsabilização judicial dos líderes do movimento e, inclusive, dos pais desses estudantes”, disse o procurador-geral do estado, Paulo Rosso, segundo o jornal Gazeta do Povo.

Entre as medidas legais que podem atingir os estudantes do Colégio Estadual do Paraná está uma que pode afetar o bolso dos manifestantes: uma multa de 10.000 reais por dia de descumprimento da ordem judicial. Mesmo assim, decidiram correr o risco em uma semana em que alguns militantes do Movimento Brasil Livre (MBL) tentam articular ações de desocupação de escolas em Curitiba, por meio do movimento recém-criado Desocupa Paraná.

O MBL se notabilizou pela organização de protestos anti-Dilma durante o processo de impeachment. Tem proximidade com o PSDB, do governador Beto Richa, e o PMDB, de Michel Temer. A peregrinação de seus membros pelos colégios tem causado tensão e reacende a polarização política que ficou durante o embate pela saída da ex-presidenta. Vídeos com brigas agressivas entre alguns curitibanos pró e contra ocupação têm circulado nas redes sociais esquentando ainda mais a animosidade. A velha rixa entre “ricos e pobres” e coxinhas e petralhas voltou à baila nesses confrontos que, por ora, são pontuais.

De qualquer forma, as ocupações não são unanimidade. “Sou contra a PEC 241 e a reforma do Ensino Médio, mas acho que temos que ir para as ruas. Ocupar não é a solução, porque eles ficam lá dentro fazendo nada”, afirma uma estudante do colégio Leôncio Correia, durante um ato pela desocupação, na quinta-feira.

As opiniões sobre as ocupações também estão divididas pelas ruas de Curitiba. Para a vendedora Márcia Soares, 36, que trabalha em uma loja próximo ao Colégio Estadual do Paraná, "é hora de parar" [com as ocupações]. “Quantas outras mortes terão que acontecer?”, questiona ela, referindo à morte do estudante Lucas Mota, 17, assassinado dentro do colégio Santa Felicidade, em Curitiba. De acordo com a polícia, ele foi morto por um colega adolescente, da mesma escola.

Já a atendente Isabela Garcia, 26, que trabalha no centro da cidade, acha que os alunos devem continuar mobilizados. “Mesmo que eles desocupem, eu acho que eles devem ir para as ruas”, diz.

Para além do bate-boca, a pressão anti-ocupação não chegou a surtir efeito entre todas as 850 escolas ocupadas, mas conseguiram reverter uma ocupação importante. O medo de ofensivas mais violentas fez com que os alunos do Colégio Senador Manoel Alencar Guimarães, onde estuda a secundarista Ana Júlia Ribeiro, cujo discurso na Assembleia Legislativa viralizou nesta semana, encerrassem a ocupação.  “Saímos porque ficamos com medo da repressão de grupos antiocupação, como o MBL [Movimento Brasil Livre]”, contou Amanda Rodrigues, 16, aluna do 2º ano.

Não houve ato pela desocupação na porta da escola dela, mas, ainda assim, os alunos temiam que algo acontecesse. "Nem recebemos a visita do oficial de Justiça. Saímos por medo mesmo. Ontem um carro parou aqui na porta, ficou tirando fotos, não sei quem era, mas ficamos preocupados”. A escola faz parte das 25 que tiveram a reintegração de posse determinada pela Justiça.

Houve resistência, porém, às investidas do MBL em frente à Colégio Estadual do Paraná. Na sexta-feira, Renan Santos, um dos líderes do movimento, permanecia calado, enquanto o professor Diego da Silva lia, em forma de jogral, uma reportagem do portal UOL. O texto listava processos aos quais Renan Santos responde, entre ações cíveis e processos trabalhistas. Em minoria, ao lado de outros três militantes, Renan não respondeu às provocações. Na noite anterior, eles passaram por outras duas escolas, com carros de som e megafones. Houve muita discussão, mas não conseguiram adesões a ponto de mudar o quadro. Das três manifestações por desocupações que a reportagem acompanhou, nenhuma convenceu os alunos a saírem de suas escolas.

A eleição deste domingo, porém, que vai alterar a rotina de milhares de eleitores por causa das ocupações, pode ser um teste decisivo para o futuro da manifestação: se resiste à decisão da Justiça que obriga os secundaristas a se retirarem nesta segunda, ou se saem das escolas para protestar de outra forma.

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