Recuperar a estatura política
“A Espanha era um exemplo de inteligência política coletiva”, diz o escritor Aguilar Camín
![Jan Martínez Ahrens](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/https%3A%2F%2Fs3.amazonaws.com%2Farc-authors%2Fprisa%2Fa8d3d51b-63fb-4044-90fa-fc3e6fdae017.jpg?auth=71cb888c68a3f94c3df73f306ba94a01247a7b5ba098ef4cc58889f1128b4244&width=100&height=100&smart=true)
![Imagem do desfile de independência na última sexta-feira.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/WH4V3RNNJUUHPZCCY2PNWUG5IA.jpg?auth=f0da72cc2de67ded433eca9c128426ec649efb21d642f5650c53389951a93a70&width=414)
As dificuldades políticas da Espanha geram perplexidade no México. É certo que o mapa peninsular, com seus vulcões nacionalistas, nunca teve uma explicação fácil. Mas agora tudo é ainda mais ininteligível. “E o que vai acontecer?”, costuma ser a grande pergunta em qualquer conversa sobre a Espanha. A narrativa tradicional resumia o país como uma nação de bipartidarismo claro e transições fluidas. Ao contrário dos dolorosos processos de mudança mexicanos, o parlamentarismo espanhol oferecia um modelo de alternância altamente funcional e europeu. Neste momento, contudo, com uma terceira eleição no horizonte, o feitiço foi quebrado.
“A Espanha me preocupa e me intriga. É uma pena que, havendo quatro forças, embora enfraquecidas, não seja possível chegar a um acordo que alcance maioria suficiente”, diz o ex-ministro das Relações Exteriores do México, Jorge G. Castañeda.
“Desde a Transição, tenho visto a Espanha como um modelo de inteligência política coletiva. Agora vejo essa inteligência fragmentada e lutando, tanto no âmbito político como no territorial”, diz o escritor e intelectual Héctor Aguilar Camín. “Há um problema institucional também: se o sistema parlamentarista espanhol não serve para construir maiorias governantes, então para que serve? É preciso repensá-lo, introduzir cláusulas de governabilidade. A fragmentação me preocupa porque não será solucionada pelo eleitorado. Terá que ser resolvida pelos políticos.”
“Sobrevivem sem Governo”
Essa preocupação não significa, de modo algum, que haja temor quanto à piora dos laços econômicos nem repúdio às conquistas obtidas. Para um país em que o Estado é uma construção inacabada, e em algumas áreas até mesmo uma ficção, a Espanha está dando uma lição de fortaleza contra a adversidade. “Em princípio, nos entusiasma ver que um país sobrevive sem Governo. A Espanha não parece necessitá-lo, ao menos não tanto. Certo é que poderia passar por dez eleições e continuar igual”, afirma o escritor Juan Villoro.
Mas diante desse cenário de resistência, após tantos meses de bloqueio, há muita vontade de que se volte à normalidade. “O que pode dar uma estabilidade política de longo prazo à Espanha é a coalizão do PP e do PSOE, mas isso parece impossível. De modo que me calo, observo e contemplo as disputas corpo a corpo dos outrora admiráveis políticos espanhóis”, diz Aguilar Camín.
“Suponho que Pedro Sánchez terá que ceder um pouco para permitir que o PP e o Ciudadanos formem Governo. Ante a impossibilidade de vencer, Sánchez pode obter estatura de estadista caso, por um momento, transforme-se no que [o poeta alemão Hans Magnus] Enzensberger chama de herói da retirada. Seria a primeira demonstração de que esse homem alto tem altura. O Governo resultante não geraria grande entusiasmo, mas haveria quem responsabilizar pelos desastres”, diz Villoro. “Seja qual for a fórmula final, poucos no México acreditam que o bloqueio se manterá eternamente. Ou pelo menos é o que se espera. Em terras americanas, a Espanha ainda é vista em muitos sentidos como um exemplo, não um problema. “Eu gostaria de pensar”, diz Aguilar Camín, “que os políticos espanhóis recuperarão seu senso estratégico, o que significa, entre outras coisas, sua capacidade de fazer acordo com o que rejeitam.”