8 fotosDiário da minha primeira criseJovens da geração milênio contam em primeira pessoa como enfrentam a instabilidade econômica e políticaHeloísa MendonçaMaría MartínRio de Janeiro - 23 abr. 2016 - 21:43BRTWhatsappFacebookTwitterBlueskyLinkedinLink de cópiaFERNANDA LENSKY, 23 ANOS, SÃO PAULO. Sou mãe de um menino de quatro anos. Já viajei para mais de seis países diferentes, diversas vezes. Pude aprender diversas línguas durante as viagens, conhecer o mais variado tipo de cultura. Me formei em um colegial técnico particular ultra moderno e assim que terminei o colegial, engravidei. Tinha 18 anos. Mesmo assim pude continuar com a rotina de faculdade e estágio, como qualquer outra adolescente da minha idade, porque meu pai, além de pagar minha faculdade, pagava uma escola de período integral para o meu filho. No auge do Governo Lula, meu pai decidiu abrir uma empresa própria, e durante os dois anos seguintes as coisas ainda iam muito bem e estáveis. Até que a crise foi ganhando visibilidade, os impostos aumentaram e o ramo da importação, onde atuava, entrou declínio. No final do ano passado, a empresa dele faliu e foi quando eu também perdi o emprego. Tive que trancar a faculdade e hoje fico em casa para cuidar do meu filho e economizar com a escola dele. Ele não estuda mais em período integral, e até o fim do ano também termina o contrato com a escola particular – o qual não temos o intuito de renovar. [Continua...]Raquel Cunha... Eu não tenho mais a opção de trabalhar e estudar ao mesmo tempo. Não diria que a culpa desta crise é do Governo, e muito menos partidária. Eu diria que a crise é inevitável em se tratando de um sistema capitalista, a gente entra em crise periodicamente, todo mundo está propenso, independentemente de se governa a esquerda ou a direita. É engraçado porque na minha casa somos dois extremos. Meu pai é muito engajado e a favor do impeachment, mas eu, por ter tido contato com classes sociais mais baixas, e notar a melhora deles nesses anos de Governo, me posiciono contra. Participei de manifestações contra o impeachment e o que mais me assusta não é a crise econômica, eu sei que vai embora. Assusta a crise política que causou uma divisão social absurda.Raquel CunhaHUGO MACHADO, 23 ANOS, RIO DE JANEIRO. Sou o caçula de três irmãos e sempre estudei em escola pública. Minha mãe trabalhava em casa de família como faxineira e meu pai numa fábrica de telhas. Eu nasci numa época em que as coisas foram ficando mais fáceis e mais acessíveis para todos e cresci com privilégios que meus irmãos mais velhos não tiveram: eu tive computador, celular, brinquedos modernos... Eu trabalhava num escritório de uma loja de tecidos, foi meu primeiro emprego com carteira assinada. Mas com a crise eu, que era o mais novo, fui demitido. Depois disso, fiz um curso de produção de moda e conheci um grupo de gente da minha idade e acabamos montando um coletivo de moda. Estamos começando agora e não temos um retorno muito bom, mas a gente pretende continuar tentando. Ainda procuro emprego, mas nem me chamam para entrevistas. Com isso, cortei gastos com as contas do celular, com as saídas e com a compra de roupas. Hoje dou prioridade às necessidades de casa, pois preciso ajudar meus pais. Eu percebi que com a crise fiquei mais responsável, me espelho mais nos meus pais na hora de cuidar da casa e não fico mais jogando dinheiro fora com coisas desnecessárias. Eu acho que essa crise já vem de alguns anos, mas a operação Lava Jato foi mostrando a cara de cada um e foi atrapalhando as coisas e acabou caindo a culpa em quem está no comando, o PT, mas poderia ser qualquer outro partido. Não me sinto muito engajado politicamente, não vou às manifestações, mas acompanho tudo pela televisão.JULIANA RODRIGUES, 26 ANOS. Sou nascida em São Caetano do Sul, classe média, moro sozinha há quatro anos. Antes da crise eu vivia muito bem com menos de 1.000 reais trabalhando de quinta a sábado. Pagava aluguel, água, luz e compras de mercado. Hoje com uma renda fixa de 1.200 e um aluguel mais baixo, preciso fazer bicos aos finais de semana para chegar ao fim do mês. O lado bom, pois sempre tiramos lição das crises, é que minha consciência sustentável e política aumentou ainda mais. Quanto à política, acho lindo o despertar de uma nação, fez com que as pessoas olhassem acima do umbigo. Vejo que muitos ainda estão perdidos e sem saber pelo que estão lutando. Precisamos de novos governantes e não acredito que seja desta vez (posso estar errada), que vamos tê-los, mas estamos cada vez mais politizados e nos importando mais com o país e suas questões. Também devemos virar nosso olhar para a natureza, ela nos proporciona o que precisamos, até matéria-prima para construção de casas. Devemos nos comunicar mais, explicar para cada vez mais pessoas o que temos de solução.Nickolas Valverde, 24 anos, São Paulo.CRISTINA JABER, 31 ANOS. Há nove meses deixei de lado minha empresa de mídia sociais e voltei a um emprego fixo com carteira assinada numa empresa. A crise foi decisiva para eu tomar essa escolha pela possibilidade de estar empregada e com algumas garantias para enfrentar o cenário de crise atual. Eu tive sorte e gosto do meu emprego atual, por isso não reclamo... mas a responsabilidade de mantê-lo e com isso manter um estilo de vida completamente fora do que acredito é pesada. Bato ponto, trabalho finais de semana, e não tenho mais tempo para fazer outras coisas que eu gostava e acostumava fazer como dar uma caminhada, sair com os amigos ou viajar. Não acredito que tenha um culpado, acho que a crise vem se cozinhando embaixo do tapete há muito tempo. Não acho que seja uma coisa localizado no Brasil, é muito atrelado no nosso sistema e nosso modelo de gastar, de ser aquilo que a gente consome e não o que realmente somos. Eu tento me isolar de todo o barulho da crise política, mas não tem como. Tenho até um grupo de Whatshap de meditação onde chegam mensagens sobre a crise. Até agora não tenho ido a nenhuma manifestação. Eu não acredito que a solução seja azul ou vermelha. A minha sensação é de insegurança diante o rumo e as consequências que todo isso pode acarretar para o Brasil e para os sonhos que a gente constrói a largo prazo, como ter filhos.BRANCA PELLICER, 26 ANOS, ILHABELA. Fiz faculdade de Design de Interiores na Belas Artes, me formei em 2014. Comecei a fazer estágio desde cedo e era certo que se eu continuasse me empenhando, logo estaria ganhando um bom salário ou já estaria trabalhando por conta própria mesmo recém-formada. Acontece que foi bem no ano em que a crise estourou e minha área é uma das primeiras a serem afetadas. Os escritórios de arquitetura e interiores começaram a fazer cortes e a oferecer salários muito abaixo do que eu esperava receber. No momento, para não ficar parada, trabalho em um escritório de arquitetura, recebendo menos do que eu pretendia. Em paralelo, estou tentando trabalhar por fora com mais dois amigos mas está muito difícil conseguir clientes. Também estava nos meus planos já estar morando sozinha e fazer uma pós-graduação fora do Brasil. Mas estou tendo que adiar. A crise está sendo um grande problema, mas acredito muito que grandes problemas vêm para termos grandes soluções, para sairmos da comodidade. Acho que o Governo tem culpa sim pela crise, acho que Dilma é fraca, mas não acho que a solução seja o impeachment.BERNARD MORAES, 33 ANOS, RIO DE JANEIRO. Sou formado em Administração de Empresas pela UFRJ, porém, há anos exerço atividades diferentes daquelas de um administrador. Durante a faculdade realizei alguns estágios, o último na Coca-Cola, quando percebi que ser administrador não era minha vocação e tampouco trabalhar no meio corporativo me faria feliz. Ao término da graduação, sem trabalho, entrei para o turismo, primeiramente na hotelaria. Paralelamente, tinha como hobby a meditação e outras práticas holísticas, que aos poucos foram crescendo na minha vida, até eu me tornar um terapeuta. Ser bem sucedido e ter status profissional nunca foram prioridades, minha maior ambição sempre foi trabalhar com algo que me deixasse feliz. Atualmente trabalho como guia de turismo. Por ironia, a crise não foi uma das dificuldades enfrentadas, ao contrário. Com a moeda enfraquecida, passear no Brasil tornou-se ainda mais barato para os estrangeiros, que representam quase todos os meus clientes. Logo, quanto mais fraco estiver o real, mais trabalho terei. Esta crise econômica e política são consequências da má administração de nossos ex e atual presidentes, aliada aos escandalosos casos de corrupção. Estudiosos e economistas já previam esta atual recessão econômica, em contraste com a imagem de prosperidade econômica que até pouco o país transmitia. Muito se investiu no curto prazo, dando dinheiro para famílias que nada tinham e se encontravam na miséria. Entretanto, a médio e longo prazo, que seria o investimento na educação, saúde etc, nada de tão relevante parece ter sido feito, tendo em vista a queda do PIB, desemprego, entre outros.