“Todas as crises mostram a vulnerabilidade da economia brasileira”
Economista Alexandre Saes, professor da USP, compara as crises do Brasil
O economista Alexandre Saes, presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica (ABPHE) e professor da USP, conversou com o EL PAÍS sobre as crises que o Brasil já enfrentou.
Pergunta. Qual o tamanho da recessão que estamos atravessando?
Resposta. É um momento crítico e conturbado tanto por questões externas como internas. O Governo gosta muito de fazer um discurso sobre as causas externas, já os críticos apontam o problema para a nova matriz econômica e os problemas de corrupção. Evidentemente, é uma grande crise e, segundo alguns indicadores, pode se converter em uma das piores recessões que o Brasil vai passar. No entanto, ela possui elementos muito comuns a outras crises que já enfrentamos.
P. Quais seriam essas semelhanças?
R. A condição comum a todos esses períodos é o fato que sempre há um quê de vulnerabilidade da economia. Por exemplo, na década de 80, o país vinha de um período de milagre econômico dos anos 70, mas por conta do própria modelo de financiamento da industrialização, o Brasil voltou a estar vulnerável pela política econômica internacional, pela elevação da taxa de juros dos Estados Unidos, o que, a partir dos anos 80, culmina em uma crise da dívida externa. Mesmo, nos anos 90, com a criação do Plano Real, que gerou um quadro de estabilidade, com instituições mais seguras, a instabilidade também prosseguiu. Se pegarmos a transição do Governo do Fernando Henrique Cardoso, em 97 e 98, que foi na época da crise asiática, a política econômica ficou nas mãos de uma conjuntura externa. A saída de capital estrangeiro exigiu uma elevação brutal da taxa de juros e a paridade monetária - que era um dos pontos chaves do plano - acabou sendo alterada, demonstrando outra vez essa fragilidade. Quatro anos depois, a eleição de Lula gerou novamente um cenário de incertezas com relação a economia, ninguém sabia o que ele iria fazer. O que é comum em todos esses períodos e volta agora é que nesses cenários de incertezas, o país vai perdendo as condições para controlar sua própria política econômica.
P. Em que momento o Brasil perdeu o rumo do crescimento?
R. O país acabou dependendo muito, durante os anos 2000, das exportações de commodities, mas a estratégia parou de funcionar com a desaceleração da China. Em plena crise de 2008, o Brasil conseguiu sobreviver ao cenário apostando no mercado interno, que já mostrava claramente esgotado pela queda do crescimento. O governo errou em manter um modelo comprometido e não abriu novas portas para setores que poderiam sustentar. Quando ele se justifica citando elementos externos, evidentemente quer se eximir da culpa.Não dá para negar que não conseguimos criar condições internas sólidas que ajudassem a se dissociar dessa dependência do capital estrangeiro. Esse é o problema.Vivemos um dilema. Se resolvemos desassociar desse capital, teremos que lidar com condições poucos favoráveis para o crescimento, mas nos tornaríamos menos vulneráveis a essas oscilações.
P. Essa dependência não é globalizada?
R. Essa dependência é generalizada, mas países que são mais industrializados e possuem sistemas financeiros mais fortes e rigorosos são mais imunes a esses efeitos. Uma coisa são os EUA se endividarem com dólar, outra é o Brasil. O grau de vulnerabilidade é muito maior. No momento que a gente acaba tendo uma desvalorização cambial que é boa para o mercado interno, de um lado há uma explosão da dívida em dólar.
P. Corremos o risco de perder muitas das conquistas socioeconômicas das últimas décadas? Até 2014 estávamos quase com o pleno emprego no país…..
R. De fato algumas conquistas importantes, como a das famílias que, pela primeira vez, colocaram o filho na faculdade - tanto por uma questão financeira que elas não precisavam que todos os filhos trabalhassem para sustentar a casa, como pelos financiamentos criados pela educação, podem ser alteradas. Se esse cenário de recessão continuar, os jovens que começaram a poder entrar no mercado de trabalho mais tarde terão que novamente abandonar os estudos para trabalhar e ajudar a família. Claramente também poderemos ter uma retração nos ganhos relacionados ao consumo e ao acesso a serviços.
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