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“Nas próximas décadas, veremos muitas coisas nunca vistas antes”

O pai do experimento que detectou a primeira onda gravitacional diz que os jovens cientistas é que devem receber o crédito

Nuño Domínguez
Kip Thorne, na coletiva de imprensa de ontem.
Kip Thorne, na coletiva de imprensa de ontem.GARY CAMERON (REUTERS)
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Kip Thorne é um dos principais especialistas em buracos negros do mundo. Desde sexta-feira, também é um dos favoritos para o prêmio Nobel de Física. Nos anos setenta, foi contra a maré da maioria da comunidade astronômica mundial. Ao contrário deles, que se concentravam no desenvolvimento de telescópios ópticos para capturar a luz em todos seus comprimentos de onda, Thorne propôs uma nova maneira de observar o cosmo, ou melhor, de escutá-lo, através de ondas gravitacionais. Este físico teórico desenvolveu a maior parte de sua carreira no Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech na sigla em inglês), onde promoveu a construção do Observatório de Interferometria a Laser de Ondas Gravitacionais (LIGO), ao lado de Ronald Drever, também do Caltech, e Rainer Weiss, do MIT. Além disso, é uma estrela da divulgação — foi assessor científico do filme Interstelar — e prepara um outro filme, com Stephen Hawking.

Na sexta-feira, Thorne falou com o EL PAÍS por telefone de Washington, onde apresentou ao mundo a primeira detecção de uma onda gravitacional e o início desta nova era da astronomia, que vem sendo liderada por ele há quatro décadas.

Pergunta. Como ficou sabendo da descoberta?

Resposta. Estava trabalhando em casa, na manhã de 14 de setembro, e me mandaram um e-mail para que olhasse o site interno do LIGO. A página armazena automaticamente os resultados do experimento. Recebe os dados de Hanford e Louisiana [local onde se encontram os dois detectores] e faz um gráfico das frequências recebidas. E, nas detecções de ambos os lugares, vi o que chamamos de um sinal sonoro, cuja frequência aumenta com o tempo. Era exatamente o sinal que esperávamos que as ondas gravitacionais produzissem. Olhei e disse: "Meu Deus, provavelmente temos [o sinal], isso é muito bom para ser verdade".

"Era exatamente o sinal que esperávamos que as ondas gravitacionais produzissem. Olhei e disse: “Meu Deus, provavelmente temos [o sinal], isso é muito bom para ser verdade"

P. Como se sente depois desta descoberta?

R. A maioria das pessoas envolvidas na detecção diz que estão entusiasmadas. No meu caso, é um sentimento de profunda satisfação. Tenho trabalhado muito duro desde os anos setenta, tanto na construção do LIGO quanto no desenvolvimento das simulações para compreender o que vemos, e que têm desempenhado um papel fundamental.

P. Por que essas ondas são tão importantes?

R. São importantes pelo futuro a que nos levam. Por um lado hoje [sexta-feira] fizemos muitos descobrimentos pioneiros. A primeira detecção de ondas gravitacionais chegando à Terra, a primeira observação de dois buracos negros chocando-se e unindo-se para criar um novo, as simulações do evento, que nos permitem observar pela primeira vez como se comportam o espaço e o tempo quando ambos estão oscilando de forma violenta como em uma tempestade no oceano.

Mas o mais importante é que se abre à observação humana a um novo tipo de radiação. Tudo o que fizemos até agora essencialmente se apoia em ondas eletromagnéticas.

Agora acessamos outro tipo de radiação completamente novo. Nas próximas duas décadas vamos ver o mesmo desenvolvimento que na astronomia convencional, compreenderemos quatro tipos de ondas gravitacionais com diferentes períodos de oscilação e cada uma nos dirá coisas muito diferentes sobre o universo. As ondas que vimos oscilam em períodos de milissegundos. Mas usando a LISA, que será uma antena espacial, algo assim como um LIGO no espaço, vamos captar períodos que são 1.000 vezes mais longos, de minutos a horas. Vamos ver até períodos de anos e décadas. Vamos ver a marca deixada no céu por ondas com períodos de milhões de anos. Vamos ver muitas coisas que não tínhamos visto antes, e isto acontecerá nas próximas duas décadas.

P. Quem deve receber o crédito por essa descoberta?

R. O crédito é dos cientistas jovens que levaram o experimento adiante. Tanto no projeto, como na construção e na análise de dados. A descoberta é deles.

P. Acredita que ganhará o Nobel?

R. Não. O Prêmio Nobel deve ser para os grandes físicos experimentais envolvidos na descoberta, especialmente Rai Weiss, o principal inventor dos interferômetros do LIGO. Ele foi o líder intelectual desse esforço durante 45 anos, desde o começo até hoje.

P. Como seria estar perto do evento que observaram?

R. Veria o tempo acelerar e desacelerar, veria o espaço expandir-se e contrair-se de forma muito violenta. Viajaria no tempo de certa forma porque o tempo avançaria mais lento do que o normal e depois muito mais rápido, tudo de forma brusca. É um evento muito breve, que dura só uma fração de segundo. Assim, o que precisamos é enviar um robô que possa captá-lo tudo muito rápido. Ninguém sobreviveria a um evento como esse.

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