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A obra maior de Albert Einstein completa 100 anos

Em novembro de 1915, o físico alemão apresentou em Berlim a Teoria Geral da Relatividade

Albert Einstein, quando já era um famoso físico em EUA, em 1947.
Albert Einstein, quando já era um famoso físico em EUA, em 1947.Biblioteca do Congreso dos Estados Unidos

Em 25 de novembro de 1915, Albert Einstein apresentou à Academia Prussiana de Ciências, em Berlim, a teoria que acabaria de construir seu mito. A Relatividade Geral era uma continuação da Relatividade Especial, a ideia que havia apresentado dez anos antes, quando era funcionário do Escritório Suíço de Patentes. Naquele milagroso ano de 1905, Einstein mostrou como o movimento modifica a percepção do espaço e do tempo, mas que a velocidade da luz e as leis da física sempre são as mesmas, independentemente da velocidade à qual o observador se desloque.

Com esses fundamentos, em 1907 Einstein teve a ideia que considerou ser a mais feliz da sua vida. Em um de seus famosos experimentos mentais, percebeu que uma pessoa em queda livre e alguém que flutua no espaço teriam uma sensação similar, como se a gravidade não existisse. Mais adiante, observou também que estar de pé sobre a Terra, atraído pela força da gravidade do planeta, não seria muito diferente de se encontrar numa espaçonave que se acelerasse para produzir o mesmo efeito.

A partir dessa intuição, Einstein cogitou que tanto a gravidade como a aceleração deveriam ter a mesma causa, que seria a capacidade dos objetos com muita massa, como os planetas ou as estrelas, de curvarem um tecido contínuo formado pelo espaço e o tempo, duas dimensões que durante milênios foram consideradas separadas e absolutas, nas quais a matéria existia e interagia. O efeito dessa curvatura e dos objetos se deslocando sobre ela é o que percebemos como a força da gravidade ou, explicado nas palavras de John Archibald Wheeler, o espaço diz à matéria como se mover, e a matéria diz ao espaço como se curvar.

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As primeiras consequências assombrosas das teorias de Einstein surgiram rapidamente. Poucas semanas depois da sua apresentação em Berlim, Karl Schwarzschild, outro pesquisador afastado das instituições acadêmicas, escreveu a Einstein mostrando seus cálculos sobre como o campo gravitacional ao redor de uma estrela se comportaria de acordo com a relatividade geral. Schwarzschild, um físico reputado, havia chegado à sua conclusão fazendo cálculos em seus momentos livres enquanto trabalhava como soldado de artilharia na frente russa, durante a Primeira Guerra Mundial. Além de mostrar a eficácia das equações de Einstein para descrever o mundo real, os resultados de Schwarzschild sugeriam a existência de objetos cósmicos inesperados. Ao calcular os efeitos da curvatura do espaço-tempo dentro e fora de uma estrela, observou que, se a massa da estrela fosse comprimida em um espaço suficientemente pequeno, o tecido espaço-temporal parecia ruir. Era a inverossímil antevisão dos buracos negros, objetos a cuja atração gravitacional nem a luz consegue escapar, e que nem sequer Einstein considerou possíveis.

Um resumo: o espaço diz à matéria como se mover, e a matéria diz ao espaço como se curvar

A primeira grande experiência que serve para confirmar os pressupostos da Relatividade Geral foi dirigida pelo astrônomo britânico Arthur Eddington em 1919. Durante um eclipse solar, ele observou que, tal como previa a teoria, a massa do Sol fazia com que a luz procedente das estrelas atrás dele se curvasse. Ficava provado assim que um grande objeto era capaz de deformar o espaço-tempo, e que inclusive a luz precisava se desviar para seguir a nova geometria. Exatamente um ano depois da grande guerra, um cientista do bloco vencedor havia feito jus com seu esforço a outro cientista, este nascido no país derrotado. A partir desse momento de alto valor científico e simbólico, o criador das teorias relativistas se tornou para sempre o cientista mais reconhecido do mundo.

Apesar do que já se disse em algumas ocasiões, Einstein, além de ter uma capacidade diferente da maioria para ver o mundo, foi ótimo aluno e esteve sempre entre os primeiros de sua classe. Mas também, como quase todas as pessoas que alcançam feitos proeminentes, tinha uma ambição descomunal e não sentia reverência alguma pela autoridade. Aos 22 anos, ainda sem ter conseguido nada, não hesitou em se dirigir ao físico Paul Drude para apontar falhas na sua teoria do elétron. “Dificilmente ele terá algo sensato com que me refutar”, escreveu Einstein à namorada, Mileva Maric. Drude teve a deferência de lhe responder, mas rechaçou suas objeções, e Einstein demonstrou que tinha um ego indestrutível: “A partir de agora, não me dirigirei a esse tipo de gente, e em lugar disso os atacarei sem piedade nas revistas científicas, como merecem”, disse ele a Maric.

As chaves do sucesso de Einstein foram seu desdém pela autoridade e um ego indestrutível

Com o tempo, e sobretudo a partir da apresentação da Teoria da Relatividade, o próprio Einstein se transformou em uma dessas autoridades que ele sempre havia ignorado. Em várias ocasiões, apesar de ter sido capaz de transformar a física com suas teorias, rejeitou algumas de suas derivações mais revolucionárias. Descartou os buracos negros, mas inventou uma constante cosmológica para manter o universo estático, apesar de suas fórmulas dizerem o contrário. Tampouco aceitou as ondas gravitacionais, ondulações do tecido espaço-temporal produzidas por objetos cósmicos como os buracos negros ou as estrelas de nêutrons, e custou a aceitar a teoria do Big Bang, exposta por físicos como George Lemaître e consequência natural das ideias presentes na relatividade geral.

Há 100 anos, Albert Einstein transformou nossa visão do mundo, ou pelo menos a forma como os físicos são capazes de entendê-lo. Como conta Ignacio Fernández Barbón, pesquisador do Instituto de Física Teórica da Universidade Autônoma de Madri, Einstein “era um gênio, mas é provável que só tenha antecipado em uma ou duas décadas a descoberta da Relatividade Geral”. O avanço conjunto da comunidade científica teria acabado por encontrar aquela forma de ver a realidade. Nem sequer os gênios como Einstein chegam às suas conclusões do nada ou são imprescindíveis, mas pouca gente duvida de que ele foi o melhor do século.

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