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Eleições na Venezuela
Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

A Venezuela clama por liberdade

Cinco dirigentes de diferentes países condenam os excessos do Governo contra a oposição

El País
Lilian Tintori, mulher de Leopoldo López, veste camiseta pela sua libertação.
Lilian Tintori, mulher de Leopoldo López, veste camiseta pela sua libertação.JUAN BARRETO (AFP)

No pensamento político dos verdadeiros democratas, Montesquieu continua a ser uma referência incontornável. A separação de poderes é considerada inerente ao surgimento da democracia. A independência do Judiciário, a liberdade de opinião e de expressão e o respeito ao sufrágio universal também estão indissociavelmente ligados à cultura política ocidental e, portanto, de toda a América Latina. Efetivamente, uma das maiores referências intelectuais e políticas latino-americanas, o humanista universal Andrés Bello, cujo aniversário acabou-se de comemorar no dia 29 de novembro, dedicou sua vida a fazer da América Latina um pilar fundamental da cultura e dos valores ocidentais.

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Em quase todos os Estados latino-americanos, portanto, a Constituição consagrada esses princípios fundadores da democracia. Assim, ninguém deveria ser vítima de perseguições ou de hostilidade nem preso arbitrariamente simplesmente por se opor de modo pacífico ao Governo no poder. Tampouco se deve admitir que seja condenado sem um processo justo. Liberal ou popular, a democracia, sem requerer adjetivos, é única e universal.

A Venezuela não é nem deveria ser uma exceção. A Constituição da República Bolivariana da Venezuela também ostenta como princípios fundamentais os valores de liberdade, justiça e pluralismo político, assim como o exercício democrático da vontade popular. Ao mesmo tempo, determina que prevalecem internamente dentre os direitos os tratados sobre direitos humanos ratificados pelo país. A esse respeito, cabe recordar o 9º artigo da declaração Universal dos Direitos Humanos: “Ninguém poderá ser detido, preso ou exilado arbitrariamente”. E, portanto, também cabe insistir em que o Governo da Venezuela deve respeitar e aplicar a sua própria Constituição.

Por causa das manifestações pacíficas iniciadas em fevereiro de 2014, muitos oposicionistas, estudantes ou líderes políticos foram objeto de prisões arbitrárias, que incluíram até mesmo cidadãos europeus. Alguns chegaram a morrer. Os que foram julgados não puderam apresentar livremente a sua defesa. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, seu grupo de trabalho sobre Detenções Arbitrárias, seu comitê contra a tortura, assim como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e as principais organizações não-governamentais de defesa dos direitos humanos exigem a imediata libertação de todas as pessoas pressas arbitrariamente, entre elas o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma; o prefeito de San Cristóbal, Daniel Ceballos; e o dirigente da oposição Leopoldo López. Este último foi recentemente condenado a quase 14 anos de prisão, praticamente sob isolamento e a partir de provas falsas.

Prender um democrata é trair a democracia. Fazemos um apelo à Venezuela no sentido de que garanta uma Justiça independente. E fazemos um apelo à Justiça venezuelana para que liberte imediatamente Leopoldo López e todos os políticos oposicionistas presos.

A Venezuela é um grande país, que sempre foi exemplar e generoso. Depois da Guerra Civil espanhola e da Segunda Guerra Mundial, centenas de milhares de emigrantes e exilados europeus encontraram na Venezuela uma esperança renovada, como novas oportunidades. Após o desastre mundial, os venezuelanos abriram seus braços e as portas de sua pátria. Por isso, o Parlamento Europeu, entre outros, foi claro em sua última resolução sobre a situação na Venezuela (12 de março de 2015), pois “convida a UE, seus Estados membros e a comunidade internacional a fazerem declarações e a tomarem medidas para demonstrar sua solidariedade com o povo venezuelano neste momento difícil”. Não estamos fazendo outra coisa, portanto, se não trocar solidariedade por solidariedade.

No dia 6 de dezembro, serão realizadas as eleições legislativas para renovar a Assembleia Nacional da Venezuela. Vários candidatos foram inabilitados pelas autoridades políticas, que, além disso, rejeitam a presença dos observadores internacionais propostos pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e a União Europeia. Essa atitude é bastante preocupante. O Secretário Geral da OEA já expôs sua inquietação diante das condições eleitorais em uma carta aberta sem precedentes dirigida à presidenta do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela. Não recebeu nenhuma explicação, mas apenas insultos inadmissíveis. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos humanos voltou a expressar sua preocupação após o assassinato, no dia 25 de novembro, de um dirigente oposicionista em um comício com a presença de Lilian Tintori, mulher do dirigente preso Leopoldo López. Unimo-nos às suas palavras: a democracia não funciona quando o ambiente eleitoral se vê dominado pela violência, pelas ameaças e pela intimidação à oposição.

O presidente Maduro é o fiador da Constituição. Ele deve garantir quer sejam realizadas eleições verdadeiramente livres, transparentes e em paz. E deverá respeitar o resultado. Eis uma condição essencial para a convivência pacífica do povo venezuelano.

Não podemos ficar indiferentes diante das legítimas reivindicações da oposição democrática venezuelana. Calar também é tomar partido. Exigir a liberdade, a democracia e o respeito aos direitos humanos na Venezuela não é uma ingerência: é nossa obrigação como democratas. Trata-se de valores universais que defendemos para o mundo inteiro, não só para nós.

Fazemos um apelo ao conjunto das democracias para que se unam à nossa petição e para que protejamos juntos o nosso patrimônio cívico comum. Denunciemos as arbitrariedades e defendamos a democracia e a liberdade.

Mariano Rajoy, presidente do Governo da Espanha

David Cameron, primeiro-ministro do Reino Unido

Thorbjørn Jagland, secretário-geral do Conselho da Europa

Felipe González, ex-presidente do Governo da Espanha

Ricardo Lagos, ex-presidente do Chile

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