Ocupação de 182 escolas em SP vira teste de resistência de Alckmin
Governo tenta ganhar tempo sem uma estratégia de negociação clara
Em frente à Escola Estadual Alves Cruz, na zona oeste de São Paulo, a professora Regina Helena Demange estava apreensiva. Seus dois filhos estudam na escola, que é uma das 493 que funcionam em período integral em todo o Estado. Naquele dia, os alunos organizavam uma assembleia para decidir se iriam ou não ocupar o prédio. "Não sei se é este o caminho, mas é um direito deles [de ocupar]", disse a mãe, do lado de fora.
A assembleia decidiu que a escola entraria para o movimento que hoje soma 182 escolas ocupadas no Estado. A onda de ocupações, que foi iniciada pela Escola Estadual Diadema há duas semanas, avança em um ritmo acelerado. Provavelmente, até a publicação desta reportagem, esse número já tenha aumentado.
Enquanto os alunos ocupam suas próprias escolas, o governo Geraldo Alckmin tenta ganhar tempo e esperar que o movimento perca o fôlego com o final do ano e as aulas que esses estudantes estão perdendo. Sem uma estratégia de negociação clara, o secretário de Educação Herman Voorwald diz que está aberto ao diálogo, mas a única conversa ocorrida com os estudantes desde que as ocupações começaram terminou sem acordo. Nesta semana, o Tribunal de Justiça de São Paulo convocou os dois lados para uma nova tentativa de conciliação, mas nenhum representante do Governo apareceu.
A secretaria de Educação afirma que há diálogo com a comunidade escolar e a prova disso é que 38 escolas que chegaram a ser ocupadas, voltaram atrás. Porém, um levantamento realizado pela Folha de S. Paulo apontou que dessa lista, 29 escolas nem chegaram a ser ocupadas. Ou seja, o Governo teria inflado esse número. Nesta semana a lista de escolas que vão fechar foi reduzida, mais uma vez. Inicialmente, eram 94 unidades. Mas o Governo reviu sua decisão sobre a escola Augusto Melega, na zona rural de Piracicaba e, nesta semana o mesmo ocorreu com a escola Bairro do Embauzinho, em Cachoeira Paulista, no Vale do Paraíba.
A reorganização escolar tornou-se indigesta para os estudantes e seus pais por impactar diretamente a vida de cerca de um milhão de alunos. Mesmo os que não serão transferidos serão atingidos. É o caso dos filhos da professora Regina. Na escola Alves Cruz ninguém será transferido. "Mas como vai ser quando chegarem os estudantes das outras escolas? As salas vão ficar mais cheias ainda", diz ela. Ao todo, 754 das 5.147 escolas terão seus ciclos alterados com a reorganização.
O Governo argumenta que nenhum aluno será transferido para uma escola longe de onde mora. Mas, muitas vezes a distância limite de um quilômetro e meio determinada pelo colégio para as transferências pode se transformar na diferença entre ir a pé ou de ônibus para jovens em idade escolar, o que acarreta em uma logística imprevista. Há, ainda, o capital afetivo das famílias em relação às escolas frequentadas pelos alunos, e o nível de ensino de cada unidade. “Escola é igual trabalho: se ela é boa, você viaja para ir atrás”, disse Regina. A família mora em Mairiporã, e viaja todos os dias por mais de uma hora para chegar no colégio. "Até o ano passado, eles estudavam em escola particular, mas não dava mais pra gente pagar", explica a mãe. Esse é outro fator importante nesta discussão: o atual cenário econômico do país pode levar mais famílias de classe média a transferir os filhos da escola privada à escola pública.
Alckmin certamente não esperava a resistência que encontrou de alunos que aprenderam a usar as redes sociais para se organizar. Sem eleger líderes, eles partilham métodos de convivência por WhatsApp e Facebook. Assim, os estudantes atuam de maneira coordenada, limpando as escolas, fazendo a comida e organizando eventos. Adotam cartilhas focadas em orientações jurídicas, em como ocupar uma escola, com proceder se a polícia chegar e como boicotar o Saresp, exame que foi realizado nesta semana na rede. Lembram, nesse aspecto, o processo de ocupação das escolas no Chile em 2006 pelos que ficaram conhecidos como “pinguins”, que brigaram por mudanças na educação. Tomaram as escolas e em seguidas as ruas, chegando a parar o país.
Não há vestígios de que o protesto chegue a tanto no Brasil, mas o número crescente de escolas demonstra que o governador está diante de um processo maior do que ele esperava. Os alunos não assumem uma liderança, o que traz à memória a atuação do Movimento Passe Livre que em junho de 2013 obrigou o governo estadual a voltar atrás no desejo de aumentar a tarifa de metrô depois que protestos eclodiram no país inteiro.
Há quem critique os estudantes porque supostamente estariam a serviço de partidos políticos. Eles garantem que não. As tradicionais organizações estudantis, como a União Municipal dos Estudantes Secundaristas (UMES), União Paulista dos Estudantes Secundaristas (UPES) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), por exemplo, stão à margem do movimento. Partidos políticos e o sindicato dos professores, a Apeoesp, contribuem com doações de mantimentos e colchões, mas não falam em nome do movimento. Tampouco podem permanecer dentro das escolas.
Como a onda de ocupações vem crescendo, estão surgindo iniciativas da comunidade para apoiar a causa de alguma maneira. Uma delas é a plataforma De Guarda pelas Escolas, desenvolvida pela ONG Minha Sampa. O apoiador cadastra um número de celular e recebe mensagem toda vez que uma escola estiver sendo desocupada à força pela Polícia Militar ou pela direção.
Outra é o Doe uma aula. Qualquer pessoa pode se inscrever por aqui para dar uma aula sobre qualquer assunto em uma das escolas ocupadas. "Esta é o maneira mais efetiva de se pressionar por uma educação de qualidade, construindo coletivamente o programa e demonstrando para o governo a força do apoio popular", diz o site.
Neste sábado, ocorre o Encontro das Escolas de Luta, na escola Brigadeiro Gavião Peixoto. Alunos, pais e professores de outras unidades foram convidados a comparecer para receber orientação jurídica e trocar experiências sobre as ocupações. Segundo um dos alunos que está organizando o evento, haverá um controle no portão para garantir que não haja "nenhum tipo de sabotagem."
Alterações no maior vestibular do país
Neste domingo ocorre a primeira fase da Fuvest, o maior vestibular do país em número de inscritos. Como algumas escolas que receberiam os vestibulandos estão ocupadas, a organização precisou alterar o local de algumas provas.
Até o fechamento desta reportagem, dez escolas tiveram seus locais alterados. Confira:
Escola Original | Nova Escola |
033-ESCOLA ESTADUAL LASAR SEGALL RUA DR. TIRSO MARTINS, 211 VILA MARIANA, SÃO PAULO, 04120-040 | 033-COLÉGIO CRISTO REIAV. CONSELHEIRO RODRIGUES ALVES, 658VILA MARIANA, SÃO PAULO, 04014-002 |
034-ESCOLA ESTADUAL BRASÍLIO MACHADO RUA AFONSO CELSO, 311 VILA MARIANA, SÃO PAULO, 04119-001 | 034-FAPCOM - FACULDADE PAULUS DE TECNOLOGIA E COMUNICAÇÃORUA MAJOR MARAGLIANO, 191VILA MARIANA, SÃO PAULO, 04017-030 |
050-ESCOLA ESTADUAL SÃO PAULO RUA DA FIGUEIRA, 500 BRÁS, SÃO PAULO, 03003-000 | 050-UNIVERSIDADE SÃO JUDAS - ANDARES 1 E 2 - UNIDADE MOOCARUA TAQUARI, 546MOOCA, SÃO PAULO, 03166-000 |
058-ESCOLA ESTADUAL PROFA. ANTONIETA BORGES ALVES AV. D. PEDRO I, 365 VILA CONCEIÇÃO, DIADEMA, 09991-000 | 058-FAD - FACULDADE DIADEMA - PISO 2AV. ALDA, 831CENTRO, DIADEMA, 09910-170 |
059-ESCOLA ESTADUAL SENADOR FILINTO MÜLLER RUA SAFIRA, 33 CENTRO, DIADEMA, 09920-460 | 059-FAD - FACULDADE DIADEMA - PISO 3AV. ALDA, 831CENTRO, DIADEMA, 09910-170 |
062-ESCOLA ESTADUAL CONSELHEIRO CRISPINIANO AV. ARMINDA DE LIMA, 57 VILA PROGRESSO, GUARULHOS 07095-010 | 062-UNG - UNIVERSIDADE DE GUARULHOS - PRÉDIO "U"PRAÇA TEREZA CRISTINA, 88CENTRO, GUARULHOS, 07023-070 |
067-EE PROF ESTEVAM FERRI RUA CANTÍDIO MIRAGAIA, 100 MONTE CASTELO, S JOSÉ DOS CAMPOS, 12215-110 | 067-FACULDADE BILAC - BLOCOS 1 E 2RUA FRANCISCO PAES, 84CENTRO, S JOSÉ DOS CAMPOS, 12210-100 |
068-EE JOÃO CURSINO AV. FRANCISCO JOSÉ LONGO, 782 JARDIM SÃO DIMAS, S JOSÉ DOS CAMPOS, 12245-001 | 068-FACULDADE BILAC - BLOCOS 3, 4 E 5RUA FRANCISCO PAES, 84CENTRO, S JOSÉ DOS CAMPOS, 12210-100 |
106-EE PIRASSUNUNGA RUA JOSÉ BONIFACIO, 325 CENTRO, PIRASSUNUNGA, 13630-010 | 106-CENTRO UNIVERSITÁRIO ANHANGUERA - PIRASSUNUNGAAV. PADRE LEO LUNDERS, 2065VILA GUILHERMINA, PIRASSUNUNGA,13634-200 |
111-EE OTONIEL MOTA RUA PRUDENTE DE MORAES, 764 CENTRO, RIBEIRÃO PRETO, 14015-100 | 111-UNIP - CAMPUS RIBEIRÃO PRETO - BLOCO CRUA MAGDA PERONA FROSSARD, 571JD. NOVA ALIANÇA, RIBEIRÃO PRETO, 14026-596 |
Fonte: Fuvest
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