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Black Friday: por que não conseguimos resistir às ofertas

Comércio apresenta ofertas como oportunidades únicas e limitadas no tempo

Jaime Rubio Hancock
Aglomerações para aproveitar oferta em Londres.
Aglomerações para aproveitar oferta em Londres.L. McGregor (Reuters)

As ofertas e descontos da Black Friday marcam o início da campanha de compras natalinas nos Estados Unidos. Embora a sexta-feira depois da Ação de Graças deva seu nome ao fato de ser um dia horrível para o trânsito por causa dos congestionamentos provocados por quem saía de lojas, a partir dos anos 1980 começou a circular uma teoria alternativa que é um claro sinal dos bons resultados da campanha: a sexta-feira é negra porque as contas das lojas saem do vermelho para entrar nos lucros.

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O sucesso desse dia de compras contra o cronômetro mostra que não sabemos resistir ao que nos parece uma boa oferta: ao prazer de comprar une-se a satisfação de fazê-lo a um preço bom (ou nisso acreditamos). “O ser humano é um saco de desejos que, por sua própria natureza, pedem para ser satisfeitos – explica ao Verne o psicólogo Miguel Silveira –. Nisso consiste grande parte da felicidade”, que em nossa sociedade se apresenta frequentemente como “o desejo de possuir, adquirir ou comprar”.

Conforme nos conta Silveira, o impulso de comprar ganha força durante a Black Friday por meio de dois mecanismos psicológicos: o princípio da escassez e o fenômeno do contágio.

1. Princípio da escassez

Quando nos dizem que temos um tempo limitado para fazer nossas compras, conseguem “ativar e acelerar esse desejo, e as pessoas compram com mais facilidade”. Ir às compras se transforma em uma corrida: é preciso aproveitar as ofertas antes que acabe o prazo. Além do mais, acreditamos ter desperdiçado o tempo quando passamos duas ou três horas em um shopping center ou procurando oportunidades na Internet e saímos de mãos vazias.

Ir às compras se transforma em uma corrida: é preciso aproveitar as ofertas antes que acabe o prazo.

E isso apesar de haver a cada poucas semanas, como recorda Silveira, campanhas supostamente únicas e especiais: depois da Black Friday virá a Cyber Monday , a segunda-feira dos eletrônicos, e em seguida as compras natalinas de dezembro, as liquidações, o Valentine’s Day, os dias das mães e dos pais, e de novo mais liquidações… Mas “nos esquecemos logo. Ativar nosso desejo de felicidade é facílimo. Vale qualquer desculpa”.

Apresenta-se uma escassez não só de tempo, como também de produto. Há mais pessoas competindo por essas ofertas e pode nos parecer que se dedicarmos um momento a refletir se necessitamos ou não do artigo, outra pessoa pode chegar e levá-lo. Uma loja online, por exemplo, dá a seus clientes premium acesso prioritário às ofertas durante a primeira meia hora. Ou seja, dá a entender que, se não tiver um pouco de vantagem, você vai perder sua oportunidade.

2. O efeito contágio

Na sexta-feira não estaremos sós: muitos vão falar de suas compras e compartilhar nas redes sociais. E por se tratar de uma tradição importada, temos a impressão de que “se foi um sucesso lá, aqui também vai ser”, explica Silveira. Milhões de americanos fazendo fila desde a meia-noite não podem estar equivocados.

É preciso “ativar nosso mecanismo racional para conter o impulso de compra” e “adiar a gratificação imediata frente à pressão social”

Além de se apresentar como um acontecimento único e temporário, “há enfeites, é como uma festa, com isso se tenta dar sensação de alegria e se apela a nossas emoções. Se, além de tudo, muita gente participa, como vamos ficar de fora?”.

3. Como nos proteger

Para evitar compras irracionais e decepcionantes, o principal, segundo Silveira, é tentar pensar a longo prazo. É preciso “ativar nosso mecanismo racional para conter o impulso de compra” e “adiar a gratificação imediata frente à pressão social”. Quer dizer, devemos nos perguntar se não podermos esperar para ter certeza de que realmente precisamos do produto. Ajuda lembrar que, na realidade, “não é um dia excepcional: dentro de algumas semanas vão nos oferecer mais pechinchas e descontos”. As oportunidades se apresentam como únicas, mas a cada dois meses.

Gastar dinheiro com outras pessoas é mais gratificante do que gastar consigo

Outros conselhos incluem fazer uma lista do que realmente necessitamos, para evitar aquelas compras por impulso de que nos arrependeremos em seguida, e ter em mente todos os truques das lojas para nos fazer acreditar que estamos diante de uma oferta irrecusável: os comerciantes nos deixam pistas que parecem nos situar, mas que muitas vezes nos despistam e embora não achemos, a decisão acaba sendo mais emocional que racional.

Por exemplo, os preços são apresentados ressaltando o quanto vamos economizar e não o que gastamos. O contexto também é importante. Em seu livro Priceless, William Poundstone explica o truque que Williams-Sonoma usou para dobrar as vendas de sua máquina de pão de 279 dólares: pôs à venda outra de 429 dólares ao lado. De repente, um produto com um preço acima do mercado se tornou uma pechincha. O EL PAÍS publicou mais conselhos para evitar cair nos truques que os vendedores usam para nos fazer sentir mais felizes e espertos.

4. Vale, mas ainda assim apetece-me comprar

Este artigo do The Atlantic reúne os conselhos do Journal of Consumer Psychology para nos sentir melhor com nossas compras, se finalmente mordemos a isca:

- Compre mais experiências e menos objetos. Como também detalha Robert Wiseman em 59 Seconds, os objetos começam a perder sua novidade assim que os tiramos da caixa; em troca, as experiências (como viaja e jantares, por exemplo), melhoram em nossa lembrança com o tempo: esquecemos os pequenos contratempos e ficamos com o melhor.

- A frequência importa mais que a intensidade. Ou seja, é melhor comprar muitos produtos pequenos ao invés de um grande.

- Não contrate o seguro extra. Gastamos muito dinheiro em um serviço que, em general, é só um gasto desnecessário.

- E a isso se pode acrescentar: dê presentes. Estudos comprovam que gastar dinheiro com outras pessoas é mais gratificante do que gastar consigo.

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