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LITERATURA

Um encontro de poucos e bons

Tarrafa Literária leva Miguelanxo Prado e outros escritores alheios a badalação a Santos

O galego Miguelanxo Prado.
O galego Miguelanxo Prado.Divulgação

Desde a última vez que esteve no Brasil, por ocasião do lançamento de um livro no qual ilustrou a cidade de Belo Horizonte, Miguelanxo Prado ficou à espera de um novo convite – ou desculpa – para visitar o país. O momento chegou: o quadrinista galego, famoso na Espanha mas ainda pouco conhecido dos brasileiros, está aqui para participar da 7a Tarrafa Literária, evento que reúne em Santos um grupo de poucos e bons escritores que não necessariamente estão na pauta quente do circuito de festivais culturais.

A Tarrafa, criada em 2008 pelo livreiro santista José Luiz Tahan – cuja Realejo Livros é parada obrigatória para os apaixonados por livros (e futebol) em Santos –, tem esse propósito: falar de livros, cara a cara com quem os escreve, e celebrar o clima democrático da cidade portuária. Temas? Autores? Tanto faz, desde que o papo seja descontraído e de qualidade. Pode parecer uma curadoria fácil, mas exige habilidades de pescador: Tahan é quem joga a tarrafa (aquela rede de pescar circular que se lança com as mãos) até conseguir agarrar os peixes grandes.

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Autor de Ardalén, livro que alcançou o Premio Nacional del Cómic 2012 na Espanha e que em breve será lançado no Brasil pela Realejo Edições, Prado diz que foi fisgado pela comida mineira e “pelos brasileiros, que se importam com as relações emocionais”. Por isso mesmo, tem grandes expectativas para seu retorno ao Brasil e ao mercado brasileiro, onde, ainda que não seja presença constante, tem admiradores cativos. “Desde que foi anunciada minha participação na Tarrafa, tenho recebido muitas mensagens de pessoas que seguem meu trabalho, mesmo à distância”, diz o criador de cartazes, ilustrações para livros, animações para televisão e até do design dos alienígenas do desenho animado americano Man in Black.

Ardalén é sua obra mais extensa e, sem dúvida, a mais madura. Com 256 páginas (bastante, para um título de HQ), o livro é uma homenagem à memória como elemento fundamental na construção da identidade de cada um. A trama põe lado a lado dois personagens, um velho e uma mulher de uns 40 anos, que recordam a imigração de um espanhol a Cuba no começo do século XX. O espanhol é o avô da mulher, que o velho conheceu e por isso a ajuda a recriar o passado para que a neta reconstrua sua biografia e a si mesma.

José Luiz Tahan na Realejo Livros.
José Luiz Tahan na Realejo Livros.Zeca Meira

Quadrinhos, como se nota, para gente grande. “Acho que o leitor natural de Ardalén é uma pessoa que já tenha vivido o suficiente para sentir interesse por aqueles que a precedem e que possa se sentir parte de uma cadeia. Porque isso é o que somos”, fiz Prado. O autor, que trabalhou por quatro anos ininterruptos nessa obra, é conhecido por esse lado mais reflexivo e “sério”, como ele mesmo diz, mas também por uma vertente mais humorística e “absurda” – como definem muitos críticos o seu trabalho. “Há pessoas que acompanham meu trabalho e que se identificam com um lado, e outras, com o outro. Para mim é cômodo conversar com públicos diferentes e me custaria muito renunciar a um deles”, explica. Na realidade, suas histórias são complexas e capazes de juntar ambas caras em uma mesma moeda, como faz o profundo e ao mesmo tempo fluido Ardalén.

No menu da Tarrafa

Além da presença de Miguelanxo Prado e de conversas ao redor dos comics – das quais participam também os gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá – dois dos maiores nomes dos quadrinhos nacionais que se encontrarão com Milton Hatoum para falar de Dois irmãos, hit do escritor amazonense –, há muito mais no menu da Tarrafa.

Entre esta quarta-feira, 23, e o domingo, 27 de setembro, 30 escritores participam de uma série de debates e encontros mediados. Entre os convidados de fora do país, outro destaque é o angolano que vive em Portugal Gonçalo M. Tavares (Jerusalém), considerado um dos maiores talentos da literatura em português atualmente, que ministra uma oficina de escrita criativa e discute com o escritor brasileiro Bernardo Carvalho as experiências intra e extraliterárias de ambos.

Dos convidados nacionais, fazem parte os contistas e psicólogos Luiz Cancello, autor de O fio das palavras, e Alexandre Marques Rodrigues, de Parafilias, que debaterão o que existe de comum entre o divã e uma página em branco. A programação inclui também atividades musicais e para crianças. O show Leminskações, de Estrela Leminski, filha de Paulo Leminski, inaugura às 19h da quarta a Tarrafa, como sempre gratuita e concentrada no belo Theatro Guarany.

Tarrafa Literária23 a 27 de setembroSantos – São Paulowww.tarrafaliteraria.com.br

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