Maduro prevê “processo duro e longo” para reabrir fronteira com a Colômbia
Presidente acirra a tensão após um ataque contra militares venezuelanos na região O mandatário colombiano pede “prudência”
“Que cessem as conspirações da Colômbia contra a Venezuela. Eles não sabem do que os bolivarianos somos capazes!”. Com essa mal disfarçada ameaça o presidente Nicolás Maduro deixou claro na segunda-feira que Caracas se prepara a usar o incidente armado da semana passada, quando três militares venezuelanos ficaram feridos num ataque armado cometido por supostos paramilitares colombianos, como trampolim para um litígio de grande escala.
Maduro convocou a imprensa internacional ao Palácio de Miraflores, em Caracas, para rebater “a campanha da oligarquia midiática” que, segundo denunciou, busca retratá-lo “como anticolombiano”. A entrevista coletiva ocorreu menos de 72 horas depois da ordem de fechamento da fronteira binacional por tempo indeterminado, além da suspensão de garantias constitucionais em vários municípios fronteiriços com a Colômbia.
Com o passar das horas, as exigências iniciais de Caracas para superar o impasse – a captura dos responsáveis pelo ataque e a reativação dos acordos de cooperação firmados em agosto 2014 numa reunião de cúpula bilateral – foram ampliadas. Segundo Maduro, seu chanceler irá “com otimismo” a uma reunião de emergência na quarta-feira em Cartagena, mas com o objetivo de obter “uma refundação da zona da fronteira”.
Questionado por um jornalista da agência oficial cubana sobre a disposição do seu Governo em reabrir rapidamente a fronteira, Maduro respondeu que não antevia condições para isso em um curto prazo. “A fronteira continuará fechada, cavalheiro”, disse, prognosticando um processo “duro e longo” para restabelecer a convivência na região.
Ele anunciou que os municípios onde vigora o estado de exceção – seis, todos do Estado de Táchira, incluindo a localidade de Rafael Urdaneta, onde as medidas foram implantadas na segunda-feira – foram agrupados na chamada Zona 1, sob o comando de um único chefe militar, o general Carlos Alberto Martínez. Sem entrar em detalhes, o presidente admitiu que nos próximos dias haverá intervenções em outras zonas fronteiriças “seguindo o mesmo modelo”. Além de Táchira, os outros Estados venezuelanos que fazem fronteiras com a Colômbia são Zulia, Apure e Amazonas.
A segunda-feira foi o primeiro dia útil com a fronteira interditada. Parte do comércio não abriu em Santo Antonio de Táchira. Pela manhã, o governador José Gregorio Vielma Mora declarou à emissora estatal Tele Sur que, durante os primeiros dois dias da campanha, manteve contato com o consulado da Colômbia para propor a deportação de 1.012 cidadãos colombianos. Mais tarde, em seu programa semanal de rádio, Vielma – que permaneceu apenas 48 horas à frente da Zona 1 -- recuou, esclarecendo que havia 791 detidos à espera de deportação no bairro La Invasión, em Santo Antonio, enquanto outros 725 colombianos haviam preferido deixar a Venezuela “por conta própria”. Segundo dados do Departamento de Migração da Colômbia, 861 colombianos foram atendidos desde sexta-feira, sendo 691 deportados e 170 menores de idade repatriados.
La Invasión é desde sábado de manhã o marco zero da campanha das forças militares e de segurança da Venezuela. Na entrevista coletiva, Maduro alertou que serão demolidas todas as moradias dessa favela, onde até agora viviam 3.000 pessoas. Durante os controles feitos na região, fardas e armas foram confiscadas, segundo Maduro. Um bordel com 300 prostitutas, algumas delas escravas sexuais e menores de idade, foi descoberto e demolido imediatamente. O mandatário também revelou a identidade dos supostos integrantes do grupo paramilitar que atacaram os militares venezuelanos na quarta-feira. Disse que uma desses integrantes, Érica Mocada Higuita, de 29 anos, foi presa. Outros estariam foragidos, sendo alguns na Venezuela e outros na Colômbia, segundo relatórios de inteligência.
Na fronteira corriam como pólvora as versões sobre maus tratos e arbitrariedades por parte das autoridades venezuelanas. Enquanto Maduro negava isso, alegando ser impossível por causa do protocolo de tratamento instruído entre as tropas venezuelanas, contavam-se às dezenas os testemunhos colhidos por jornais e rádios no outro lado da fronteira. De resto, o fechamento da passagem entre os dois países acarreta graves transtornos ao cotidiano dos moradores. Em Cúcuta, no lado colombiano, havia longas filas nos postos de gasolina, já que os proprietários de veículos costumam abastecer no lado venezuelano, onde o combustível é muito mais barato. Pacientes com diversas doenças e estudantes esperavam horas no lado venezuelano para passar por um “corredor humanitário” que os militares dizem ter aberto.
De Bogotá, viajaram na segunda-feira a Cúcuta a chanceler colombiana, María Ángela Holguín, e o ministro do Interior, Juan Fernando Cristo, para avaliar a situação, que pode desencadear uma crise humanitária à medida que os deportados continuam chegando da Venezuela. Durante a inspeção, foram vaiados por transeuntes.
No final da tarde, aproximou-se da ponte internacional Simón Bolívar, sobre o fronteiriço rio Táchira, o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe Vélez, arqui-inimigo do chavismo e apontado por Caracas como o cérebro de uma conspiração. Uribe pronunciou um breve discurso, aclamado pelos moradores.
O contraste entre a recepção aos ministros e ao líder da oposição indica um problema para o Governo de Juan Manuel Santos com relação à crise fronteiriça. Amplos setores da opinião pública, além de seus adversários políticos, acreditam que Santos se mostra excessivamente permissivo com a Venezuela em troca de manter abertas as relações comerciais com o país – um ávido comprador de alimentos e bens de consumo – e, sobretudo, de continuar contando com Caracas como fiador no processo de paz com as FARC em Havana.
O ex-presidente Andrés Pastrana, por exemplo, publicou nesta segunda-feira o seguinte comentário em sua conta do Twitter: “Que outros atropelos os colombianos precisam sofrer para que o Governo chame o nosso embaixador na Venezuela para consultas?”.
Santos reagiu na segunda-feira com promessas de “firmeza” na defesa de seus compatriotas deportados, mas “com a sabedoria e a prudência da diplomacia”. Segundo o presidente colombiano, uma confrontação com a Venezuela só favoreceria “interesses individuais e eleitorais”, sem conduzir a “uma solução satisfatória”.
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