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O ‘campo minado’ de Dilma Rousseff

CPI, tribunais analisando irregularidades e impeachment são os desafios da presidenta

Rousseff durante encontro dos BRICS, na Rússia.
Rousseff durante encontro dos BRICS, na Rússia.IVAN SEKRETAREV (AFP)

Uma CPI investigando o escândalo da Petrobras, dois tribunais analisando denúncias eleitorais e supostas contas irregulares, além de uma oposição batendo panela ao insistir na tese do impeachment. Tudo isso, aliado à crise econômica que só deve começar a passar no ano que vem e a um Congresso Nacional rebelde, mostra que a presidenta Dilma Rousseff (PT) não terá folga nas próximas semanas. Por mais que diga que não “vai cair”, ela precisará montar uma boa estratégia política para ao menos melhorar sua avaliação popular.

Na última pesquisa de opinião divulgada no início deste mês, Rousseff atingiu o pior índice de popularidade desde o início de seu primeiro mandato: 68% da população avaliam sua gestão como ruim ou péssima. A série de notícias negativas só ampliaram o campo minado que a presidenta tem adiante. Eis o que a aguarda nos próximos dias:

TSE ouve delator

Um dos mais recentes réus confessos a assinar o termo de delação premiada com a Justiça na Operação Lava Jato, o empreiteiro Ricardo Pessoa, da Construtora UTC deverá depor no Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo no próximo dia 14 de julho no processo do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que investiga, a pedido do oposicionista PSDB, se houve abuso do poder político e econômico da  campanha de Rousseff, entre outros aspectos, investiga se seu caixa eleitoral recebeu recursos ilegais na eleição do ano passado.

Aos investigadores que apuram o escândalo da Petrobras, Pessoa afirmou que parte das propinas que pagou para manter contratos com a Petrobras foram mascaradas em forma de doações eleitorais oficiais, que ele também fez ao oposicionista Aécio Neves e a seu vice na chapa, Aloysio Nunes Ferreira. No caso de Rousseff, por exemplo, o delator diz ter pago 7,5 milhões ao tesoureiro de sua campanha, o hoje ministro da Comunicação Social, Edinho Silva. Tanto a presidenta como o ministro negam as irregularidades.

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O PT, partido de Rousseff, tentou impedir o depoimento de Pessoa, mas no último dia 8 o Supremo Tribunal Federal autorizou que o empreiteiro depusesse neste caso. Outras três pessoas já falaram na Justiça Eleitoral de São Paulo sobre este caso: os delatores Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, que afirmaram terem pago propinas, e Herton Araújo, ex-diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (o IPEA, que é um órgão público, ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República).  Araújo afirmou que no ano passado foi obrigado a adiar a divulgação de dados sobre o aumento da miséria no Brasil para evitar que eles fossem usados na campanha eleitoral.

O PSDB deseja que o TSE considere a campanha de Rousseff culpada e anule a eleição do ano passado, convocando novas eleições, um desfecho considerado, por ora, drástico. Por anos, o tribunal vem aprovando prestações de contas de campanha com "ressalvas", mas a coexistência da investigação da Petrobras complica as coisas. Ainda assim, em declarações recentes, integrantes do tribunal dizem que serão necessárias provas "robustas" para anular a eleição.

TCU julga “pedaladas”

Previsto inicialmente para o próximo dia 21 de julho, o julgamento do Tribunal de Contas da União sobre as finanças do ano passado do Governo Rousseff deve ser adiado por algumas semanas. No entanto, o relatório do ministro Augusto Nardes indica que as contas da Presidência da República deverão ser completamente rejeitadas, o que é algo incomum. Geralmente, a rejeição é parcial e pouco interfere no andamento de uma gestão.

A principal razão para a reprovação seria as “pedaladas fiscais”. A prática consistiu em atrasos, pelo Tesouro Nacional, de pagamentos de compromissos a bancos públicos que precisaram utilizar recursos próprios para pagar beneficiários de despesas do governo, como as relacionadas ao programas Bolsa Família, seguro desemprego e abono salarial. O relatório de Nardes mostra que o levantamento desses recursos junto aos bancos públicos configura operação de crédito, um ato proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Independentemente de quando será julgado, o Governo tem até o dia 21 para apresentar sua defesa. O veredito do TCU será analisado pelo Congresso, mas dificilmente poderia embasar um pedido de impeachment, já que se referem a contas do mandato anterior. De todo modo, os analistas e constitucionalistas repetem que o processo de impedimento tem enorme componente político.

CPI da Petrobras

A Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga os bilionários desvios de recursos da Petrobras descobertos na Operação Lava Jato convocou os presidentes das duas maiores construtoras do Brasil: Marcelo Odebrecht, da Odebrecht, e Otávio Marques de Azevedo, da Andrade Gutierrez.

Ambos são investigados por pagar propinas a autoridades para garantir contratos com as empreiteiras. Odebrecht é considerado um dos empresários mais próximos ao PT e, se ele resolver mudar sua estratégia de defesa e acusar o partido, pode complicar a vida da presidenta.

Outro convocado para depor foi o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, homem-forte da gestão Rousseff. No caso dele, o pedido foi porque a Polícia Federal, que é subordinada ao ministro, supostamente grampeou a cela de um dos réus confessos e delatores do esquema ilegal, o doleiro Alberto Youssef.

Há um certo alívio para Rousseff até o momento porque a CPI,  sob influência de aliados dela e outros interessados em trancar as investigações, pouco acrescentou ao que a operação Lava Jato já apurou. Uma parte dos depoentes que vão até ela nada falam e os que falam, praticamente só repetem o que já disseram aos policiais e procuradores federais, apesar de ganhar os holofotes e impor mais desgaste político no noticiário. Para a consultoria internacional Eurasia Group, que analisa o risco político para agentes do mercado financeiro, o maior risco segue sendo a implicação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Lava Jato. Na semana passada, a Eurasia aumentou de 20% para 30% a chance de Dilma Rousseff não terminar o mandato.

Oposição batendo panela

Desde o início deste segundo mandato de Rousseff, as vozes do impeachment e anti-PT ressoam, inclusive reforçados por protestos que, em ao menos duas ocasiões, levaram milhares 'as ruas. As mesas lideranças radicais divulgam uma nova convocatória para o dia 16 de agosto.

Nesta semana, os pedidos de impeachment de Dilma voltaram a ganharam força após a convenção do partido oposicionista PSDB que reelegeu Aécio Neves para a presidência da legenda. Até o momento, porém, nenhum argumento jurídico definitivo foi apresentado. Os próprios tucanos esperam o andamento dos julgamentos na Justiça Eleitoral e no Tribunal de Contas da União para dar o próximo passo. Enquanto isso, tratam de propalar notícias negativas contra a gestão petista e de dificultar votações no Congresso Nacional sempre que possível.

“Do ponto de vista jurídico o impeachment é possível. Se decretado a irregularidade das contas do Governo, ela [Rousseff] pode ser condenada por crime de responsabilidade. E isso é passível de perda de mandato”, disse o líder da minoria na Câmara, o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE).

Para esse parlamentar, a autoconfiança da presidenta não é capaz de evitar um impeachment. “Quando ela chama uma entrevista para dizer que não vai cair, ela chamou o impeachment para sua sala. Para mim, é claro que ela não tem liderança política para sair sozinha dessa crise política”.

Já os aliados da petista e a própria presidenta entendem que a ação da oposição é uma tentativa de golpe. “Passaram do limite da legalidade para atingir o limite do golpismo”, afirmou a senadora Gleisi Hoffman (PT-PR).

Fernando Azevedo: “Governo tem de recompor sua base”

O cientista político Fernando Antônio de Azevedo, professor na Universidade Federal de São Carlos, diz que os principais desafios de Dilma Rousseff diante dessa crise serão recompor sua base no Congresso Nacional e adotar medidas para acelerar o ajuste fiscal.

Pergunta. Dilma Rousseff disse em uma entrevista que não vai cair do cargo. Como o senhor avalia a estratégia dela? Ela se sente segura ou apenas se manifestou para "marcar posição" diante de tantas críticas?

Resposta. O tema do impeachment ressurgiu no último fim de semana na convenção do PSDB e ganhou grande destaque na mídia por ser um evento partidário do maior partido da oposição. Nesse contexto, o governo tinha duas opções: ignorar o assunto, como fez no início do ano, ou reconhecer que o tema entrou na agenda política e reagir politicamente. A entrevista de Dilma, ao lado de outros movimentos, como a reunião com os líderes políticos da base governista e a nota de apoio dos presidentes de partidos aliados, faz parte da estratégia do governo de marcar posição e mostrar que tem ainda apoio e força política suficiente para se contrapor à ameaça de impeachment da oposição.

P. Por qual razão a oposição insiste nessa discussão de impeachment? É uma tentativa de emplacar um terceiro turno, como dizem alguns petistas? O Governo demorou a reagir?

R. A discussão do impeachment nesse momento, em que não há nenhum elemento concreto para tal, interessa mais a Aécio Neves e as correntes mais radicalizadas da oposição do que aos setores mais moderados e com interesses eleitorais a longo prazo, como [Geraldo] Alckmin e [José] Serra. O cenário mais favorável para Aécio seria o impedimento conjunto da Dilma e do [Michel] Temer e a convocação de novas eleições. Sem dúvida, nesse caso, uma nova eleição poderia ser interpretada como um terceiro turno. Além do mais corre o risco de ser vista também como um golpe branco, pois a impressão que se tem é que se procura um pretexto jurídico qualquer para legitimar à vontade política de derrubar o governo.

P. Quais são os próximos grandes desafios da gestão Rousseff? Se defender das pedaladas fiscais? Reverter algumas derrotas no Congresso?

R. Do ponto de vista político acredito que recompor minimamente a base de apoio no Congresso para assegurar a governabilidade; no âmbito do TCU aprovar as contas do governo para sustar a discussão do impeachment e no plano da economia adotar novas medidas que acelerem o ajuste fiscal e a recuperação da confiança dos investidores na economia brasileira.

P. Na sua opinião, como a oposição deveria se posicionar? Deveria insistir na tese do impeachment ou fazer algum outro tipo de contraponto?

R. Como o presidente Fernando Henrique Cardoso publicou no EL PAÍS, em seu artigo "A responsabilidade das oposições", nada justifica arruinar ainda mais o futuro do país com uma política do quanto pior, melhor. Ao invés disso, a oposição deveria se contrapor ao governo propondo políticas e medidas alternativas, como um governo paralelo (shadow cabinet) a exemplo do que existe na Inglaterra.

Maria Braga:“Oposição deveria parar de agir como criança”

A cientista política Maria do Socorro Sousa Braga, professora na Universidade Federal de São Carlos, acredita que os opositores de Dilma Rousseff agem como crianças que perderam um jogo. “A oposição deveria se organizar como um time coeso e programático ao redor de um projeto político para o país”, diz.

Pergunta. Dilma Rousseff disse em uma entrevista que não vai cair do cargo. Como o senhora avalia essa declaração? Ela se sente segura ou apenas se manifestou para "marcar posição" diante de tantas críticas?

Resposta. Penso que a presidente manifestou-se com muita propriedade diante de uma conjuntura onde setores até hoje não aceitaram a vitória legítima dela. E precisava fazer isso nessa direção já que tentam por todos os meios deixa-la impedida de continuar no governo.

P. Por qual razão a oposição insiste nessa discussão de impeachment? É uma tentativa de emplacar um terceiro turno, como dizem alguns petistas? O Governo demorou a reagir?

R. O governo é muito maior que essa busca desses setores que buscam instabilizar a ordem pública, e tem outras preocupações. A oposição está buscando um meio de impeachment porque não aceitou a sua própria derrota. E pior, essa postura raivosa e ilegal do ponto de vista das instituições eleitorais, mostra o quanto estão sendo irresponsáveis e nada propositivas. Infelizmente o Brasil está com uma oposição muito fraca programaticamente, e ao não terem o que propor de forma a construir uma alternativa exequível, ao eleitorado tão segmentado como o Brasileiro, ao que tivemos nesses últimos 12 anos resolveram apelar para outros meios. Alguns desses meios parte da própria oposição também lançou mão quando estava no poder. Diria que foram apenas mais hábeis ao conseguirem que a opinião pública não tivesse conhecimento.

P. Quais são os próximos grandes desafios da gestão Rousseff? Se defender das pedaladas fiscais? Reverter algumas derrotas no Congresso?

R. Os grandes desafios da presidente é manter as conquistas sociais alcançadas ao longo dos anos petistas e buscar equilibrar as contas públicas. Todos os aspectos dos quais a oposição busca lançar mão para desestabilizar o governo dependem de ações políticas e menos da presidente, com certeza a parte dela já está em desenvolvimento tendo em vista a distribuição de cargos que vem ocorrendo para os partidos aliados, especialmente para o PMDB.

P. Na sua opinião, como a oposição deveria se posicionar? Deveria insistir na tese do impeachment ou fazer algum outro tipo de contraponto?

R. A oposição deveria parar de agir como uma criança que não sabe perder um jogo. Em vez disso deveria se organizar como um time coeso e programático ao redor de um projeto político para o país. E sempre que necessário criticar e também propor alternativa aquilo que não concorda, visando não as ambições pessoais de algumas lideranças mas o bem comum. de uma República.

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