Corrupção atinge indígenas bolivianos
Morales intervém em uma instituição e prende dois ex-executivos por má administração
Um escândalo no Fundo Indígena da Bolívia desestabiliza o discurso oficial sobre a probidade dos indígenas, considerados certa vez pelo presidente Evo Morales como a “reserva moral da humanidade”. O Governo teve de intervir nessa instituição, que recebe uma importante quantidade de dinheiro proveniente das exportações de gás do país para realizar projetos produtivos nas comunidades “originárias”. Seus dois ex-executivos foram presos. A Controladoria do Estado moveu uma ação contra eles dois e contra vários dirigentes camponeses e indígenas envolvidos na má administração de um montante que pode chegar a 277 milhões de bolivianos (mais de 120 milhões de reais).
O presidente Morales requereu a investigação do Fundo Indígena depois de receber várias denúncias sobre a existência de uma trama para financiar projetos que acabavam não sendo realizados (“projetos fantasma”). Até agora foram detectados 153 projetos desse tipo e há suspeita de mais 100.
Um caso ilustrativo é o do financiamento para plantar um hectare de alho para cada uma das famílias de um grupo de 500 que vivem em Puerto Acosta, povoado situado a 194 quilômetros de La Paz. Segundo a denúncia que processam as autoridades, três diretoras da Federação de Mulheres Camponesas Bartolina Sisa –organização fundadora do partido do Governo, o Movimento ao Socialismo (MAS)– enganaram as famílias e conseguiram que as mesmas assinassem testemunhos de que receberam o benefício completo em troca de meio quilo de alho para cada uma. As diretoras, por seu lado, obtiveram 1,2 milhão de bolivianos do Fundo Indígena.
A corrupção foi facilitada pelos procedimentos do Fundo, que depositava dinheiro em contas pessoais dos representantes das comunidades beneficiárias, já que estas não possuem contas conjuntas. Posto que o Fundo era uma “conquista” da luta realizada pelos indígenas há uma década por uma nova distribuição dos lucros petrolíferos do país, a instituição procurava evitar a mediação de organizações não governamentais e de municípios, entregando o dinheiro diretamente aos beneficiários. Pela mesma razão, oito dos nove postos da diretoria são ocupados por dirigentes nacionais dos camponeses e dos indígenas, todos eles militantes do Movimento ao Socialismo (MAS).
Para Carlos Romero, ex-ministro e atual senador desse partido, as dificuldades se deveram a esse excesso de representação das organizações sociais, sem um contrapeso adequado do Estado. Da mesma maneira, o relatório da Controladoria afirma que a forma de organização e de trabalho do Fundo deixa “muito a desejar”.
Para o vice-presidente Álvaro García Linera, por outro lado, “uma coisa são as responsabilidades pessoais dos que têm de responder logo à Justiça e outra coisa é o movimento social, a organização, com sua história, suas estruturas, seu discurso e sua capacidade de ação; isso não está envolvido; as falhas no Fundo Indígena não envolvem em absoluto o movimento indígena”. Segundo García Linera, fazer esse vínculo é “racista e direitista”, por isso exigiu: “Não toquem na organização; a organização é sagrada, é histórica, é o que sustenta a vitalidade de nossa pátria… e nos sentimos orgulhosos dela”.
O vice-presidente expressa a posição das próprias organizações, tanto indígenas como de outros setores, em relação às críticas da oposição boliviana contra seu desempenho corporativo no Governo, o qual considera a si mesmo um “Governo dos movimentos sociais”. Por isso, no contexto de outra investigação sobre salários excessivos nas empresas estatais, Juan Carlos Trujillo, dirigente da Central Operária Boliviana, fez saber ao presidente Morales que “não permitirá que a Controladoria meta o nariz” nas conquistas de operários e funcionários públicos.
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