“Não adianta punir servidores corruptos e deixar as empresas livres”
Novo controlador quer colocar em prática lei que autoriza extinguir empresas corruptas
O promotor paulistano Roberto Porto, 46, já enfrentou o Primeiro Comando da Capital e as máfias chinesa e coreana —o que lhe rendeu um tiro na perna durante uma emboscada em 2001. Também investigou a prática de lavagem de dinheiro por parte de bispos da Igreja Universal e do esquema MSI/Corinthians. Agora, o recém-empossado controlador-geral de São Paulo, se volta contra um dos maiores e mais resilientes inimigos da máquina pública brasileira: a corrupção.
Porto trabalhou por 12 anos no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público Estadual, até ser indicado pelo PMDB para chefiar a Secretaria de Segurança Urbana de São Paulo, na administração Fernando Haddad (PT). Ao cargo atual Porto chegou por convite do prefeito, depois que o então controlador do município, Mário Spinelli, foi chamado para estruturar a controladoria de Minas Gerais, agora governado pelo PT.
A grande aposta do controlador para enfrentar a corrupção na administração municipal —que segundo investigações é responsável por desvios de ao menos 500 milhões de reais— é a nova lei anticorrupção, regulamentada pelo prefeito em maio de 2014. Além de multas milionárias, ela permite, em última instância, que a administração solicita a extinção jurídica de uma companhia. “Não adianta nada punir os funcionários públicos corruptos se as empresas continuam a tentar corromper”, afirma o controlador, no momento em que o debate sobre o papel das empresas na corrupção da máquina pública ganha peso por causa da Operação Lava Jato, que investiga esquema de desvios em contratos de empreiteiras e outras empresas com a Petrobras. Legislação do gênero ainda não foi utilizada no país _há uma lei anticorrupção federal com mecanismos para punir empresas, mas ela está a espera de regulamentação. O promotor está ansioso para promover a estreia: “No município de São Paulo estamos prontos para colocar em prática, e eu tenho muita vontade de fazê-lo. Há uma grande expectativa com relação a isso”.
A lei não pode ser aplicada retroativamente para punir os envolvidos no caso da máfia dos fiscais do ISS, desmantelada em 2013 pela CGM. Mas Porto promete atenção especial às empresas envolvidas no caso e diz que tem carta branca para “ir para cima” de grandes empresas. “Um dos pilares do combate à corrupção é o acompanhamento do corruptor ativo, que atualmente está muito tranquilo com suas práticas. Independentemente de quem seja o envolvido, construtoras ou empreiteiras, o prefeito Haddad deu carta branca para ir para cima de quem quer que seja.”
A pequena [corrupção], alimenta a grande, uma está muito atrelada à outra. Seria ingênuo da minha parte achar que porque combatemos a grande corrupção como no caso do escândalo do ISS que a pequena está resolvida. Não. O caminho é inverso, é um ciclo vicioso que começa lá na ponta, na rua
Mas nem só de grandes máfias vive o combate à corrupção. “A pequena (corrupção) alimenta a grande, uma está muito atrelada à outra. Seria ingênuo da minha parte achar que porque combatemos a grande corrupção como no caso do escândalo do ISS que a pequena está resolvida. Não. O caminho é inverso, é um ciclo vicioso que começa lá na ponta, na rua. Temos que quebrar esta lógica”, afirma.
Para aprimorar o trabalho da CGM, Porto solicitou ao prefeito que trouxesse para a estrutura da organização dez agentes que trabalharam com o promotor no GAECO por dez anos. “O nossos sistema de análise dos dados do patrimônio dos servidores é excelente, conseguimos detectar sem problemas a evolução irregular destes valores. O que faltava era um trabalho de campo. Porque aí você consegue lidar realmente com a grande corrupção. Tem um caso que estamos investigando de um funcionário de subprefeitura que aparentemente está envolvido com corrupção. Eu não tinha braços fora da CGU para acompanhar os passos desta pessoa, e daí vem a importância deste incremento com os agentes do GAECO”.
Máfia do ISS
A operação da CGM contra os fiscais corruptos já levou à demissão de dezenas de servidores e à prisão de quatro. Mas Porto não acredita que o grupo foi completamente neutralizado. “O impacto na arrecadação do ISS, que aumentou 70%, por si só demonstra que existe uma redução da atividade do grupo. Mas não acredito que detectamos todos os envolvidos”, diz.
Segundo ele, não apenas a arrecadação ISS aumentou desde o início das atividades da CGM, mas de outros impostos também, o que é um indicador de que outras máfias de fiscais corruptos agiam na administração. O balanço geral, para o controlador, é positivo: “Algumas pessoas criticam as nossas investigações, dizem que elas passam a impressão de que todo funcionário público é corrupto. Mas não penso assim. Estamos passando por um momento que é traumático, um momento de depuração. Outras instituições já passaram por isso e hoje são apontadas como exemplo de lisura e confiança por parte da população, como a Polícia Federal, por exemplo”.
Corrupção existe em todos os órgãos, públicos ou privados. São como as bactérias do nosso organismo: elas sempre vão existir, mas você precisa mantê-las num nível saudável para o corpo sobreviver
Atualmente 62 servidores da Prefeitura são alvo de sindicâncias, sendo 42 por enriquecimento ilícito. “A maioria destes casos são servidores isolados, não máfias propriamente ditas, nada como o caso dos fiscais do ISS”, afirma. “Alguns são funcionários com cargo de chefia. Esperamos em breve encaminhar os pedidos de demissão destas pessoas”.
O fim da corrupção na máquina pública, no entanto, é algo inalcançável, segundo Porto. “Eu acho difícil. Ela existe em todos os órgãos, públicos ou privados. São como as bactérias do nosso organismo: elas sempre vão existir, mas você precisa mantê-las num nível saudável para o corpo sobreviver, e isso requer acompanhamento diário. Se eu estancar a corrupção no município hoje e relaxar, amanhã ela está de volta”, afirma.
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.