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Sequestro aumenta a polarização

A negociação em marcha sem cessar-fogo provoca forte divisão entre os colombianos

Soldados colombianos revistam um camponês.Foto: reuters_live | Vídeo: REUTERS-LIVE!/ AFP
Silvia Blanco

O diálogo de paz entre as FARC e o Governo colombiano tem sido, desde o começo, material inflamável que suscita uma enorme divisão no país. O sequestro do general Rubén Darío Alzate e seus acompanhantes ocorre quando a agenda da negociação em Havana enfrentava os temas mais complicados e que mais irritação causam nas ruas. Um exemplo é a justiça para as vítimas – e, portanto, se os guerrilheiros acusados de delitos graves irão para a prisão – ou como será o desarmamento e a reintegração na vida civil dos rebeldes desmobilizados. O sequestro ocorre quando os militares estão inquietos por seu futuro como instituição depois de uma guerra que durou cinco décadas. Tudo isso em um momento no qual o presidente anterior, Álvaro Uribe, atiça a fogueira dos medos e das dúvidas legítimas de muitos cidadãos sobre o processo.

Horas depois do sequestro, o agora senador Uribe, líder da oposição, pelo Partido de Centro Democrático, declarou em um comunicado que “os membros das Forças Armadas não deveriam continuar sendo igualados ao terrorismo”. Ele o publicou em sua conta no Twitter, uma poderosa plataforma com 3,3 milhões de seguidores, na qual lança dardos todos os dias, implacável, contra o presidente Juan Manuel Santos – a quem acusa de ter vendido o país ao castrochavismo –, e ao processo de paz. Nesta segunda-feira, por exemplo, disse em um tuíte: “Santos permitiu que as FARC se sintam em igualdade com as Forças Armadas, por isso os terroristas sequestram e dizem que é detenção”. Em outro ele afirmava que houve “639 soldados e policiais assassinados por terroristas das FARC durante o diálogo com Santos”.

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Há muitos ouvidos para essas mensagens e o sequestro do general Alzate dá oxigênio aos que acreditam que não há nada a negociar com a guerrilha. Uma pesquisa de outubro do instituto Cifras e Conceitos mostra que somente 39% dos cidadãos acreditam que as negociações serão concluídas com sucesso, e que a grande maioria rejeita que os guerrilheiros possam não ir para a prisão (85%). O grande descrédito das FARC e o ódio que seus crimes causam, em particular o sequestro – que se comprometeram a não praticar –, contribuem para a polarização. A lembrança dos sequestrados durante anos na selva, em penosas condições, está muito presente em um país onde seis milhões de pessoas foram deslocadas e 220 mil acabaram mortas pelo conflito.

O sequestro de um general impacta em cheio no Exército, uma instituição inquieta quanto à missão que terá se o processo de paz for levado adiante e quanto as penas que terão de cumprir seus membros acusados de delitos cometidos em decorrência do conflito. Santos lhes garantiu que gozarão de benefícios penais se a paz for assinada, ao mesmo tempo que se debate no Senado se os casos de execuções extrajudiciais, os chamados falsos positivos – civis assassinados e apresentados como guerrilheiros caídos em combate –, serão transferidos à justiça militar. Há mais de 4.000 militares investigados por esse motivo e organizações de Direitos Humanos, como a Human Rights Watch, temem que se forem julgados pelos tribunais militares estará sendo aberta uma via de impunidade.

No processo de paz, se negocia sem que haja um cessar-fogo. Essa condição o Governo estabeleceu para evitar que as FARC usem o diálogo para se rearmarem, como fizeram na frustrada tentativa anterior de diálogo, as conversações de El Caguán (1999-2002). “É difícil explicar às pessoas que estão negociando a paz em Havana e matando aqui na Colômbia”, reconhecia o presidente Santos em uma entrevista ao EL PAÍS em junho, depois de reeleito. Agora essa pressão aumentou, e o primeiro a fazer isso foi Uribe, que disse nesta segunda-feira: “A comunidade internacional, que tanto apoiou os diálogos com as FARC, deveria exigir desse grupo terrorista a cessação unilateral de atividades criminais”. Apesar da divisão que essas questões desencadeiam, houve avanços em três dos seis pontos da negociação. Se for retomada, fica agora o mais complicado. E com a fogueira em plena combustão.

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