“Nossos filhos estão vivos até que se prove o contrário”
Familiares afirmam que as provas apresentadas pela Procuradoria “não são conclusivas”
O México já conhece parte da verdade, que retratou o horror em Iguala. O procurador-geral do México, Jesús Murillo Karam, deu uma entrevista coletiva de pouco mais de uma hora para fornecer informações de três acusados, que relataram diante das autoridades o assassinato dos 43 estudantes de Guerrero, desaparecidos em 26 de setembro. Os pais dos jovens já responderam à mensagem do Governo. “Não aceitamos de maneira alguma a declaração. Não têm certeza de que isso seja o certo”, afirmou a mãe de um dos desaparecidos. “Acreditam que seja a verdade deles, mas para nós é mais uma mentira. Temos certeza de que os jovens continuam vivos”, disseram.
Os pais dos estudantes falaram com a imprensa depois da mensagem do procurador-geral e algumas breves palavras que o presidente Enrique Peña Nieto dedicou ao anúncio, durante um evento com empresários. Pela manhã, o procurador havia se reunido com os pais em Iguala para comunicar a notícia, que depois seria divulgada para todo o país ao vivo.
“Estão tentando encerrar o caso de maneira descarada”, disse Felipe de la Cruz, pai de um dos estudantes que sobreviveram à violenta noite de 26 de setembro. “O fato de que o procurador diga que os sacos encontrados em Cocula possam ser dos jovens, sem provas, é uma forma de tortura que não vamos permitir”, disse esta tarde, acompanhado de outros pais na escola rural de magistério Raúl Isidro Burgos.
De la Cruz tem sido o porta-voz do descontentamento dos pais. Em um vídeo que começou a circular pelas redes sociais na quinta-feira à noite, é possível vê-lo na reunião dos pais com o presidente Peña Nieto em 29 de outubro. “São mais de 30 dias sem resultados... chegamos ao limite de tolerância e paciência”, dizia De la Cruz ao presidente. Ao final de sua intervenção, exigiu que Peña Nieto encontrasse os jovens com vida e pediu que considerasse sua renúncia se não pudesse resolver o caso.
Na sexta-feira, depois da informação detalhada por Murillo Karam, os pais insistiram na ideia, ganhando força em alguns setores que saíram às ruas para protestar pelo desaparecimento forçado dos jovens. “Chega de hipóteses... Nos disseram que estão destroçados ou em cinzas. Já basta de tanta incompetência e tanta dor. É justo que digam que, caso não possam, que vão embora”, disse um dos pais na sexta-feira.
Alguns especialistas alertaram para a radicalização dos discursos. “Existem grupos que estão se aproveitando da situação”, afirma José Antonio Crespo, historiador do Centro de Pesquisa e Docência Econômica (CIDE). “Estão exigindo que os jovens apareçam com vida, algo difícil de ocorrer. E com isso tem-se um pretexto permanente de mobilização e confronto”, avalia.
Os pais exigiram das autoridades que a equipe de peritos argentinos dê a última palavra sobre as investigações, a partir de provas conclusivas, em vez dos resultados oficiais apresentados pela Procuradoria-Geral da República. “A verdade tem que chegar através de um estudo científico que reconheça os corpos. Não pode ser apenas o depoimento de três detidos. Seria irresponsável por parte da procuradoria”, disse um dos pais.
Vidulfo Rosales, advogado da Tlachinollan –uma ONG de referência no Estado de Guerrero— que prestou consultoria legal aos pais, destacou que o Governo não cumpriu os compromissos assumidos em 29 de outubro. “Pedimos que o presidente assine um convênio para que os especialistas da Comissão Interamericana de Direitos Humanos possam auxiliar nas investigações”, disse, alertando que se os especialistas argentinos não tiverem acesso às provas apresentadas esta tarde, as conclusões do caso “não serão aceitas”.
A relação entre os pais e o Governo encontra um novo pretexto para o rancor. O presidente Peña Nieto começa neste fim de semana um giro internacional que o levará à Austrália e China entre os dias 9 e 15 de novembro. “O presidente quer viajar para dizer ao mundo que resolveu o caso dos estudantes. Isso nos enche de ira e de coragem”, disse De la Cruz. Minutos antes, o próprio presidente informou a um grupo de empresários que o Estado prenderá “a todos que participaram desses crimes abomináveis” e que sua Administração “não descansará até que haja justiça”.
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