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O Egito condena à morte o líder da Irmandade Muçulmana

Além da sentença de Mohamed Badie, o tribunal da província de Minia também condenou à morte por terrorismo outras 652 pessoas, supostamente seguidores da Irmandade

Parentes da Irmandade Muçulmana, no Cairo.
Parentes da Irmandade Muçulmana, no Cairo.M. ABD EL GHANY (Reuters)

A Irmandade Muçulmana foi duramente atingida nesta segunda-feira. Um tribunal da província de Minia condenou à morte o seu Líder Supremo, Mohamed Badie, assim como outras 682 pessoas, supostamente seguidores da Irmandade, pelos atos de violência que ocorreram na cidade de Adua e nos quais um policial foi morto. O incidente aconteceu horas depois que a polícia desmobilizou brutalmente o acampamento islâmico Rabá al-Audawiya em meados de agosto, provocando a morte de centenas de pessoas.

O juiz, Said Youssef, é o mesmo que, no fim de março, condenou à morte 529 pessoas acusadas de delitos muito semelhantes: o ataque à delegacia de Matay e o linchamento e assassinato de seu chefe. De acordo com a lei egípcia, uma sentença de morte deve ser revisada pelo mufti da República – uma autoridade religiosa – antes de ser confirmada. Na mesma sessão em que Youssef emitiu a sentença de morte contra Badie, e depois de receber o parecer do Grande Mufti da República, que não é obrigatório, ele decidiu comutar a pena de morte de 492 pessoas à prisão perpétua, mantendo a sentença de morte para o resto.

Segundo informações vazadas à imprensa nos dias anteriores, o Grande Mufti aconselhou comutar a pena a todas aquelas pessoas que não estiveram diretamente relacionadas ao assassinato do policial.

Além do Líder Supremo da Irmandade, entre os condenados estão outros líderes proeminentes do grupo, como Saad Katatny, ex-presidente do primeiro Parlamento eleito após a revolução que derrubou Hosni Mubarak.

Os dois processos desta segunda-feira fazem parte de um total de quatro grandes julgamentos com mais de 2.000 pessoas processadas, todas no mesmo distrito judicial, em Minia, e por acusações muito semelhantes que vão desde a destruição de propriedade, a incitação à violência e assassinato. As condenações despertaram uma grande polêmica tanto dentro Egito como na comunidade internacional. Tanto os Estados Unidos, como a União Europeia e a ONU criticaram a falta de garantias de um julgamento cujo veredicto, devido à gravidade da pena e do número de réus, não tem precedentes na história moderna.

Além da gravidade do veredicto, o fato de a Justiça egípcia não ter respeitado garantias processuais mínimas provocou uma enxurrada de críticas. Por exemplo, em ambos os julgamentos ocorreram apenas duas sessões, a abertura e o anúncio da pena, sendo esta última poucos dias depois. Vários advogados de defesa não foram autorizados a entrar na sala, e outros não puderam apresentar os seus argumentos. Além disso, a maioria dos acusados não esteve presente, ou porque são fugitivos da justiça, ou porque sua transferência ao tribunal foi considerada arriscada do ponto de vista da segurança.

“É duvidoso que o Estado egípcio vá realmente executar centenas de pessoas em um processo judicial. Mas o dano às famílias já foi feito”, disse o analista H.A. Hellyer, da Brookings Institution. Muitos observadores políticos concordam que as penas de morte serão revogadas no tribunal de cassação. Embora no Egito a pena de morte seja legal, nos últimos anos o Estado adiou a execução na maioria dos casos.

O duro veredicto faz parte de uma campanha de repressão cada vez mais intensa contra a Irmandade Muçulmana iniciada após o golpe de Estado no verão passado. Os meios de comunicação aliados ao grupo islâmico foram fechados e quase todos os seus líderes estão presos. No fim de dezembro, o Governo declarou o histórico movimento islâmico uma “organização terrorista”, que, apesar da perseguição, continua organizando manifestações regulares contra a repressão.

No entanto, não só os islamitas estão sendo perseguidos pela polícia e os tribunais, mas qualquer voz dissidente corre o risco de ser acusada de traição à pátria. Este é o caso do movimento juvenil 6 de Abril, que desempenhou um papel central na revolução que derrubou o ex-ditador Hosni Mubarak. Um tribunal do Cairo ordenou nesta segunda-feira que o grupo seja considerado ilegal ao considerá-lo culpado das acusações de “espionagem” e de “difamação do Estado egípcio”. Esse tipo de acusação, juntamente ao recebimento de recursos do exterior, eram comuns durante o antigo regime de Mubarak.

A decisão insta o presidente interino, Adly Mansur, o primeiro-ministro, Ibrahim Mahlab, e o ministro do Interior a congelar os ativos da organização, proibir qualquer atividade do grupo e confiscar suas instalações. Um de seus fundadores, e seu líder mais carismático, Ahmed Maher, está atrás das grades desde dezembro e condenado a três anos de prisão por organizar uma manifestação ilegal. Apesar disso, os jovens do 6 de Abril mantiveram seus protestos e no sábado passado se reuniram em frente ao Palácio Presidencial para exigir a anulação da draconiana lei de manifestações.

Mais de três anos depois da rebelião que retomou a chamada Primavera Árabe, o Egito está passando por um período de grande polarização política. As autoridades que chegaram ao poder depois do golpe militar planejaram um roteiro de gestão que deve acabar em eleições presidenciais nos próximos dias 26 e 27 de maio. Os dois únicos candidatos em disputa são Abdelfattá al-Sisi, um ex-ministro da Defesa e homem forte do novo regime, e Hamdin Sabbahi, um político da era de Nassar que ficou em terceiro lugar nas últimas eleições presidenciais vencidas por Mohamed Morsi, deposto. A campanha de Sabbahi tem repetidamente se queixado do fato de que o aparelho do Estado não é neutro e que favorece Sisi.

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