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Coluna
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O milagre da unidade do Brasil em um mundo separatista

Se o Brasil quiser manter vivo e sólido o milagre da sua unidade, deve fortalecer o que tem tornado possível essa união

Juan Arias

Existe no mundo uma febre de separatismo que contrasta com o milagre da unidade sem fissuras do Brasil, apesar de se tratar um país-continente com 27 Estados, muitos deles maiores que alguns países europeus, mas onde todos sentem o “orgulho de ser brasileiro”.

Esse anseio de secessionismo em relação à Mãe Pátria sulca hoje os céus do planeta. Embora com motivações diferentes, existem atualmente tentações independentistas como estamos vendo na Ucrânia e em não poucos países da Europa “Unida”, como Espanha, Reino Unido, Bélgica e Itália, a ponto de preocupar e já ser chamado de “o crescente separatismo que agita a Europa”.

Na atualidade, entretanto, esse ardor independentista não se limita à Europa. Observa-se já até nos Estados “Unidos”, como é o caso do importante Estado do Texas, que desejaria ser independente, ou no México, onde alguns Estados do Norte flertam com a secessão.

O rescaldo do secessionismo que está ressurgindo atualmente poderia acabar contagiando outros países, arrastados por esse demônio da independência em um mundo onde se havia sonhado com a eliminação das fronteiras para podermos ser todos filhos e irmãos de uma única Pátria comum, embora mantendo cada um a riqueza da sua cultura, dos seus costumes e das suas peculiaridades. Um mundo que deveria estar composto pela riqueza da sua diversidade.

Esse milagre, que até agora é apenas uma doce quimera em nível planetário, existe no Brasil, que, mais do que um país, é um dos órgãos importantes do corpo humano mundial.

Caberia aos historiadores e antropólogos explicar esse fenômeno considerado na atualidade “milagroso”, mas que pressupõe desde já uma enorme responsabilidade para os que regem os destinos deste país de 8 milhões de quilômetros quadrados, no qual caberiam duas vezes todos os países da União Europeia, e que conta com a metade dos habitantes dos 28 Estados membros daquela União.

Não há nada de definitivo na História, e o Brasil não haveria de ser uma exceção. As tentações separatistas podem aparecer de repente, como nuvens negras num céu claro. Hoje, no mundo globalizado, as tentações podem ser globalizadas, assim como as epidemias.

Se o Brasil quiser manter vivo e sólido o milagre da sua unidade, que tantos contemplam até com estupor, deve desde já, olhando-se no espelho da atualidade mundial, fortalecer o que tem tornado possível essa união, visível a qualquer um que visite este país.

E uma das receitas necessárias e urgentes seria o fortalecimento da sua condição de República Federativa, cuja Constituição outorga grande espaço político e administrativo a cada Estado membro.

Qualquer tentação de querer debilitar os Estados e sufocar as identidades que, juntas, constituem a grande riqueza da sua diversidade cultural significaria abrir uma fresta para que penetre o vento de uma tentação separatista.

Isso deveria ser levado em conta pelos responsáveis por realizar neste país uma reforma política que nunca chega, porque todos fogem dela com medo de perder privilégios adquiridos. Nessa reforma já deveriam aparecer os componentes para uma partilha mais equitativa, por exemplo, das vagas de cada Estado no Congresso.

O poder central deveria ser repartido segundo a importância e as necessidades de cada território, sem que fosse fruto de conchavos ou interesses escusos, ao mesmo tempo em que essa unidade deverá ser um seguro de prosperidade para todos, na medida em que a justiça seja igual para negros e brancos, mulheres e homens, escolarizados e analfabetos, gente importante ou comum.

O Brasil deve crescer econômica, social e culturalmente de uma maneira justa e equitativa, para que, já que não existem brasileiros que desejam deixar de sê-lo – e esse é o milagre –, tampouco existam Estados de primeira ou de segunda categoria, e muito menos brasileiros de baixo e de cima, servidores e servos, e sim portadores de uma mesma dignidade e dos mesmos direitos e deveres.

Hoje, em um mundo que luta para se separar, o Brasil deveria se juntar cada vez mais no empenho por se manter unido, sentindo que essa unidade é um seguro de segurança e prosperidade para todos. Será que São Paulo e o Rio vão se enfrentar por causa de água?

Que já não baste o orgulho de ser brasileiro, e sim o de se sentir participante e defensor ativo desse projeto de unidade que o mundo atual, doente de separatismo, contempla com assombro e em muitos casos até com inveja.

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