_
_
_
_
_
Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

O sonho secreto de Lula com Cuba

Lula pretenderia “abrasileirar” Cuba e a Venezuela política e socialmente, e mais tarde, pondo-se a sonhar, possivelmente também a Argentina

Juan Arias
Lula presenteia Fidel Castro com uma camiseta do Brasil. / R. Stuckert AFP
Lula presenteia Fidel Castro com uma camiseta do Brasil. / R. Stuckert AFP

O ex-presidente Lula da Silva, que seria hoje o mais votado se fosse novamente candidato à Presidência da República, acalenta, segundo um de seus conselheiros próximos, um sonho secreto com Cuba.

Apesar das críticas feitas por alguns setores, o ex-presidente Lula está, com efeito, multiplicando suas viagens à ilha caribenha, atuando assim como um ministro extraoficial de Relações Exteriores do Governo da presidenta Dilma Rousseff.

O sonho de Lula é que Cuba, que inevitavelmente terá de sair do túnel de sua ditadura militar para abrir espaços de democracia, faça isso conforme o “modelo brasileiro” por ele idealizado em seus oito anos de Governo.

E o sonho de Lula com Cuba abraçaria também a irmã Venezuela. Não por acaso, dias atrás, em Havana, depois de declarar formalmente que “Maduro é um homem bem intencionado que deseja o melhor para seu país”, o que equivale a dizer nada e tudo ao mesmo tempo, ele acrescentou que “a Venezuela precisa de paz e tranquilidade” para “recuperar todo seu potencial na geração de riqueza”. E isso sim quer dizer muito.

Lula é um político que sabe usar seu passado de sindicalista e fundador do maior partido de esquerda da América Latina, o PT, para conseguir ser um interlocutor fiável nos países do eixo do socialismo bolivariano, ao mesmo tempo em que seu pragmatismo político e sua falta de ideologia em nível pessoal (“Não sou de esquerda nem de direita”, é seu lema) o aproximaram do mundo do neoliberalismo, o que lhe permitiu e permite manter magníficas relações com os bancos e o empresariado internacional.

Em sua última conferência em Cuba, Lula explicou aos irmãos Castro como ele conseguia atrair os investidores estrangeiros. E o Brasil foi o primeiro a oferecer esses investimentos milionários, ajudando na construção do porto de Mariel, graças ao qual Cuba poderá ter mais facilidade nas suas relações econômicas com a Rússia, a China e o próprio Brasil. Ao mesmo tempo, o novo porto é estratégico por sua proximidade com o novo Canal do Panamá.

Lula levou em sua viagem a Cuba o chamado “rei da soja”, o ex-governador do Mato Grosso Blairo Maggi, para ensinar os cubanos a produzirem soja com melhor qualidade. Hoje o Brasil produz 4 toneladas de soja por hectare, contra 1,2 de Cuba. Maggi se ofereceu a enviar técnicos da Embrapa a Cuba e a receber cubanos dispostos a se especializarem no Brasil.

Os últimos Governos brasileiros acompanharam de perto a evolução do regime castrista, à espera de que este possa cair e se transformar em uma espécie de democracia incipiente.

Lula – sabedor de que o povo cubano é parecido com o brasileiro em sua idiossincrasia, em seu espírito festivo, em sua cultura popular – sonha com que Cuba possa, liquidada a ditadura, seguir o modelo político e social brasileiro.

Após décadas de ditadura com dependência do Estado por parte dos cidadãos, Cuba, em seus primeiros momentos de abertura, poderia imitar o capitalismo brasileiro, ainda fortemente dependente do Estado e com uma boa dose de nacionalismo, mas que ao mesmo tempo começa a se abrir às privatizações.

Também políticas sociais, como o Bolsa Família, implantadas por Lula – que as herdou de seu antecessor Fernando Henrique Cardoso, mas multiplicou-as até alcançar 15 milhões de famílias, com um total de 40 milhões de pessoas –poderiam ser transplantadas para Cuba, com a vantagem de que o primeiro Governo nascido depois da ditadura poderia continuar contando com a adesão da maioria dos cubanos que receberiam vultosas ajuda sociais, um aumento do salário mínimo, acesso ao crédito público e uma melhoria geral de vida junto com novas estruturas democráticas.

São estes 40 milhões de beneficiários das regalias sociais do Governo que asseguram hoje, por exemplo, a continuidade no poder do Partido dos Trabalhadores (PT).

Sob as asas do Brasil e seguindo as pegadas dos bem-sucedidos Governos do PT, Cuba poderia receber deste país os instrumentos necessários nos primórdios do seu nascimento para a democracia, sob a égide de Lula, que, à sombra, continua sendo o eixo da política brasileira.

E como Cuba não é hoje concebível sem a Venezuela, Lula está também à espera do que possa ocorrer nesse país, onde sempre apoiou o caudilho Chávez e hoje apoia institucionalmente Maduro, por ter sido eleito com voto popular. Ele quer colocar ambos os países na rota do Brasil, que não é a do acordo do Pacífico, já que haverá sempre uma veia aberta ou sutilmente antiamericana, algo que continuará fazendo parte por muito tempo do socialismo cubano- bolivariano.

Lula pretenderia, em uma palavra, “abrasileirar” Cuba e a Venezuela política e socialmente, e mais tarde, pondo-se a sonhar, possivelmente também a Argentina. Seria o “eixo Lula” da política na América do Sul.

Um sonho? Talvez, mas, segundo quem conhece bem o ex-sindicalista que ainda não desistiu de disputar novamente a Presidência, um sonho com olhos abertos.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_