O Papa viajará com passaporte argentino
Francisco I recusa o privilégio de usar documentos de identificação expedidos pelo Vaticano O Governo confirma que fez os trâmites do Papa como o de qualquer cidadão de seu país
O papa Francisco fará sua próxima viagem em maio. Visitará Jordânia, Palestina e Israel. E o fará com o passaporte argentino que acabou de renovar, onde figura com o nome de Jorge Mario Bergoglio e aparece com uma foto atual, vestido de branco. O máximo pontífice, que se caracterizou neste quase um ano de papado por seus gestos de simplicidade e que criticou com veemência o drama global dos imigrantes, decidiu que não vai viajar com o passaporte do Vaticano, cuja cidadania recebeu ao ser nomeado chefe da igreja católica, senão com o aquele do país do “fim do mundo”, como o descreveu depois de ser designado nesse cargo.
O passaporte da Argentina de Bergoglio iria caducar no próximo setembro. Ele comunicou-se, então, com o embaixador de seu país no Vaticano, Juan Pablo Cafiero, para renová-lo, mas pediu que a burocracia se cumprisse como com qualquer outro cidadão no exterior, sem privilégios. "Sua Santidade entrou em contato com Cafiero e o informou de que queria continuar viajando pelo mundo com o passaporte argentino”, contou o Ministério do Interior do país sul-americano em um comunicado difundido nesta segunda-feira.
Cafiero não obrigou Francisco a ir até a sede da embaixada argentina na Itália, onde, assim como outros 48 países, Buenos Aires elabora a documentação de identidade para seus cidadãos. Dirigiu-se na última sexta-feira à austera residência de Santa Marta, onde o Papa preferiu morar em lugar do palácio apostólico. Ali foi munido de um computador para tirar uma foto dele, as impressões digitais e a assinatura. Em 15 minutos cumpriu com a papelada e então Bergoglio perguntou: “Quanto devo?”. A renovação do passaporte custa 400 pesos (118 reais) e a do documento nacional de identidade, que o Papa também pediu, 35 pesos (10 reais). Nos próximos dias, Bergoglio receberá seus novos documentos em Santa Marta, onde estabeleceu seu domicílio ante as autoridades argentinas.
Francisco não é o primeiro chefe de Estado do Vaticano que opta por viajar com passaporte de seu país de origem. João Paulo II deslocava-se com o da Polônia e por isso em 1979, um ano depois de se tornar Papa, não pode visitar seu país porque o então regime comunista lhe negou o ingresso. A Santa Sede outorga a nacionalidade aos papas, aos cardeais que vivem ali ou em Roma, a seus diplomatas em funções e a outros servidores públicos. O passaporte do Vaticano foi usado como ferramenta de imunidade por alguns padres acusados de abusos sexuais nos EUA.
O Papa, por outro lado, decidiu viajar pelo mundo como cidadão de um país em desenvolvimento. Ele irá em agosto a Coreia do Sul, depois a Filipinas e Sri Lanka, em 2015 aos EUA e em 2016 à Argentina. Em vários países, como nos EUA, deverá obter um visto. Poucos dias depois da repressão da Guarda Civil espanhola contra imigrantes que se afogaram em águas rumo a Ceuta, ainda ressoam as palavras de Francisco de julho: “Quem de nós chorou pela morte destes irmãos e irmãs, de todos aqueles que viajavam sobre as barcas, pelas jovens mães que levavam a seus filhos, por estes homens que buscavam qualquer coisa para manter a suas famílias? Somos uma sociedade que esqueceu a experiência do pranto... A ilusão pelo insignificante, pelo provisional, nos leva à indiferença para os outros, nos leva à globalização da indiferença”.
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