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Versão espanhola do Bom Senso F.C., o Racing se revolta

Após atrasos nos salários, os jogadores cumprem sua ameaça e depois do apito do árbitro se abraçam no meio-campo até a suspensão definitiva de um jogo pela Copa do Rei

Javier Lafuente
Goleiro do Racing comunica ao árbitro que time não disputará o jogo.
Goleiro do Racing comunica ao árbitro que time não disputará o jogo.ANDER GILLENEA (AFP)

A dignidade dos jogadores do Racing Santander se impôs ao disparate de seus dirigentes. A equipe verde e branca do norte da Espanha cumpriu sua promessa e não entrou em campo nesta quinta-feira pelo jogo de volta das quartas-de-final da Copa do Rei contra a Real Sociedad. Os atletas do Racing se reuniram no meio-campo e ali ficaram, abraçados. Não houve jogo. Assim como não houve um rastro de algum tipo de presença do presidente Ángel Lavín no estádio. Os jogadores estão com salários atrasados e pedem a renúncia da cúpula diretiva do clube.

Em todo o momento, o Racing manteve a equipe adversária informada de suas intenções. A primeira coisa que o treinador do time de Santander, Paco Fernández, fez ao chegar ao estádio El Sardinero foi se aproximar do vestiário da Real Sociedad e comunicar o técnico da equipe, Jagoba Arrasate, como atuariam. Ato contínuo, o técnico avisou a arbitragem. O Racing recebeu o apoio do vestiário rival durante todo o dia. No estádio estiveram presentes também o presidente da Real Sociedad, Jokin Aperribay, e o diretor de futebol do clube, Lorenzo Juarros. Ambos permaneceram no vestiário, e não no campo de jogo ou nas arquibancadas, “por respeito” aos jogadores do Racing.

O El Sardinero, apesar do apelo para que a torcida fosse ao estádio, registrou uma fraca presença de público. Só o setor mais incondicional dos torcedores dava um verdadeiro colorido, com constantes gritos de “Pague eles, Harry!”, "Eles sim merecem essa camisa" e um grande cartaz com o lema "Fora, Ladrões".

Era possível sentir a tensão nas imediações mais de uma hora e meia antes do início do jogo. Dezenas de pessoas foram se reunindo ante a entrada do estádio, por onde não se viu entrar o presidente, Ángel Lavín, apelidado de Harry. Alguns conselheiros sim o fizeram, como Jairo Lavín, sobrinho do presidente, vaiado e insultado em sua chegada.

Foi um dia longo para o clube de Santander. Depois de uma sessão de treinamento pela manhã, oi elenco participou em um hotel de Santander de uma reunião com representantes da Associação de Jogadores Espanhóis (AFE, na sigla em espanhol), que lhes informaram das consequências de não disputarem o confronto: até 6.000 euros de multa ao clube e inclusive a inabilitação para os jogadores de entre dois a cinco anos caso fossem denunciados. O presidente da AFE, Luis Rubiales, garantiu, no entanto, que a federação não atuaria contra eles.

“Com o que ouvimos, nossa opinião fica reforçada”, assegurava um dos jogadores depois do encontro. Em nenhum momento o plantel deu motivo a algum tipo de negociação. Segundo vários dos presentes, os capitães levaram até Rubiales no início do encontro, que teve mais de uma hora e meia de duração, que a única via para que jogassem era a demissão do Conselho de Administração do clube. “Estão fortes, unidos e convencidos. Nós não podemos fazer mais que estar com eles”, assegurou o presidente da AFE.

O encontro era um pedido dos jogadores da equipe de Santander há dias. No elenco existia verdadeiro mal-estar porque sentiam que a AFE não fazia o suficiente na defesa de seus interesses. Faz três semanas, em uma reunião entre o clube, a Federação e o sindicato de jogadores ficou definido, segundo várias fontes cientes do encontro, já que a federação tinha embargado a receita do Racing por avanço na Copa, que seria efetuado um pagamento de 70.000 euros (230.000 reais) a dividir, equivalente a uma folha de pagamento, através do sindicato. No entanto, o desembolso não só foi atrasado, como até hoje não foi realizado. “A ajuda chegará de forma iminente, nos próximos dias”, confirmou Rubiales.

“Chegou tarde, sim, mas já está, estamos contentes”, disse um eufórico Oriol, um dos mais experientes. A satisfação dos atletas era evidente. Três dias após o comunicado, no qual asseguravam que sua decisão era “irrevogável", a união entre os jogadores era palpável. “Está fazendo com que fiquemos mais fortes, sabemos que temos o respaldo de todo mundo. Só queremos que tudo isto acabe e ver se saímos reforçados. Que não se nos esqueça, o nosso é a Liga (Campeonato Espanhol), ficar entre os primeiros”, comentava Mariano. O clube está na terceira divisão atualmente.

O problema do Racing deixou de ser faz tempo um assunto meramente esportivo.

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