Daniel Ortega consegue a reeleição por tempo indeterminado
A Assembleia Nacional da Nicarágua aprova uma reforma da Constituição que garante a permanência do mandatário sandinista no poder
A Assembleia Nacional da Nicarágua, controlada pela governista Frente Sandinista, aprovou nesta terça-feira em sua totalidade uma reforma da Constituição que garante ao presidente Daniel Ortega a reeleição sem limites, o que despertou a preocupação com o estado da democracia no país centro-americano. Em uma carta aberta, cinco ex-chanceleres nicaraguenses afirmaram que a reforma viola acordos internacionais subscritos pela Nicarágua e relacionados ao respeito à democracia representativa, direitos humanos, separação de poderes e alternância no poder. A reforma debilita “ainda mais a institucionalidade democrática da Nicarágua”, alertaram.
A mudança da Constituição foi aprovada por 64 votos a favor e rejeitada por 25 deputados que representam a oposição no Parlamento. A discussão desta terça-feira foi a segunda da reforma no âmbito legislativo, visto que a lei nicaraguense estabelece duas votações para reformar a Constituição – a primeira discussão foi realizada em dezembro. Setores críticos ao Governo de Ortega assinalam que a reforma concede mais poderes ao presidente, que já controla o Parlamento, o Poder Judiciário e o Poder Eleitoral, cujo presidente, Roberto Rivas, foi acusado de armar quatro fraudes eleitorais para favorecer a FSLN. Agora Ortega poderá, além disso, emitir decretos com força de lei, usurpando uma das funções do legislativo.
Ortega foi reeleito em novembro de 2011, depois de participar da eleição nesse ano violando a Constituição, que estabelecia que não poderia ser presidente quem ocupasse o cargo ou já o tivesse ocupado em duas ocasiões –– duas cláusulas que se chocavam com as ambições do mandatário sandinista, que aproveitou sua influência na Corte Suprema para exigir dos juízes que emitissem uma sentença removendo essa proibição.
A decisão estabelecia que as cláusulas constitucionais eram inconstitucionais para Ortega. Ele venceu as eleições, segundo o Tribunal Eleitoral, com 66% dos votos, em um pleito que os observadores da União Europeia classificaram como “opaco”. Com as mudanças na Constituição, também se elimina o mínimo de votos necessários para um candidato ser nomeado presidente, o que favorece o líder sandinista, que, segundo as pesquisas, conta com 65% de apoio à sua gestão.
Horas antes da votação na Assembleia Nacional, cinco ex-chanceleres nicaraguenses publicaram uma carta em que pediam aos deputados que não aprovassem as alterações na Constituição, já que elas violam acordos internacionais assinados pela Nicarágua. Os ex-ministros de Relações Exteriores Harry Bodán Shields, Enrique Dreyfus Morales, Emilio Alvarez Montalván, Eduardo Montealegre Rivas e Norman Caldera Cardenal afirmaram no texto que “o exercício do poder sem garantias de alternância e sem cláusulas que certifiquem eleições livres, transparentes e verificáveis que impeçam a perpetuação sem limites de uma pessoa no exercício da Presidência da República, tal como estabelecem as mudanças constitucionais em processo de aprovação, violenta prima facie compromissos democráticos assumidos pela Nicarágua”.
Além disso, lembraram que o país é membro do Sistema de Integração Centro-americana (Sica), em cujos estatutos constam os compromissos democráticos endossados no final dos anos 80 do século passado pelos mandatários da região nos Acordos de Esquipulas II ––que teve entre os signatários na época o então presidente Ortega––, “especialmente o compromisso de realizar processos eleitorais em condições de liberdade, transparência e respeito à vontade popular, com mecanismos de controle e supervisão independentes, que permitam constatar essa livre expressão da vontade soberana do povo”.
Os deputados sandinistas justificaram as mudanças constitucionais, que para a oposição são um golpe de Estado à Constituição. “Eu sempre disse que essas reformas são um avanço no aprofundamento democrático da Nicarágua, na lógica com que a Frente Sandinista fez, lutou e derramou sangue”, disse Edwin Castro, deputado pela FSLN. Castro fazia referência à longa luta encabeçada pela Frente para derrubar a ditadura somozista que se perpetuara no poder na Nicarágua por mais de 40 anos, em uma dinastia familiar que muitos neste país comparam agora com a do presidente Ortega, de 68 anos, cuja esposa, Rosaria Murillo, é chefe de fato do Gabinete de Governo, e seus filhos, diretores de meios de comunicação e empresas privadas formadas com recursos da enorme cooperação da Venezuela, segundo denuncia a imprensa nicaraguense. Essa cooperação chega a mais de 500 milhões de dólares por ano. “Não precisamos de um Ortega forever”, disse o deputado oposicionista Alberto Lacayo durante a votação das mudanças constitucionais.
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