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O assassinato de um cantor evidencia a corrupção policial de Veracruz

O Governo concluía o caso culpando assassinos de aluguel, mas a família demonstrou que a polícia estava envolvida no crime

Juan Diego Quesada
Gibrán Martiz, em uma foto de Facebook.
Gibrán Martiz, em uma foto de Facebook.

O assassinato de Gibrán Martiz, um jovem cantor que mal estava abrindo caminho no mundo da música, voltou a deixar em evidência a corrupção das autoridades policiais de Veracruz, um Estado ao leste mexicano. O músico foi sequestrado em sua casa e apareceu, cinco dias depois, no interior de um veículo com um tiro. A polícia disse que encontrou o cadáver ao enfrentar os sicários (termo usado no México para designar os assassinos de aluguel) que tinham levado Gibrán. Era a cena perfeita de um crime. Eliminados os culpados e encontrado o desaparecido, o caso fechava. 

Só pela insistência dos pais do cantor, que visitaram hospitais, delegacias e interrogaram aos vizinhos que viram como o filho foi levado, se começa a conhecer, pouco a pouco, o que de verdade pode ter acontecido. Após vários dias alimentando a versão oficial, o Governo de Veracruz reconheceu que sete policiais estão envolvidos no caso. “Foram servidores públicos que levaram ele e um amigo (também assassinado) com quem o cantor vivia. Só queremos saber o que ocorreu, que o caso não seja concluído falsamente”, conta por telefone Erick, o irmão do cantor, que se tornou famoso graças ao programa de televisão A Voz do México, um popular reality show do país.

Gibrán Martiz, de 22 anos, era um cantor local e desconhecido que no último inverno apresentou-se em um concurso da Televisa onde se promove a carreira de artistas. Acabado o programa, neste janeiro ele decidia tornar-se independente. Levava apenas um dia vivendo em um apartamento que alugava em Xalapa, a capital de Veracruz, quando alguém o sequestrou, junto a seu colega de andar, um garoto de 17 anos com quem começava a colaborar em um disco. Era 7 de janeiro. A família tentou contatá-lo sem sucesso durante vários dias. Seus familiares se alarmaram ao saberem que ele não se apresentou a uma apresentação que estava marcada em uma discoteca. Seu irmão denunciou o desaparecimento em 12 de janeiro através do Twitter.

O pai, Efraín, foi a Xalapa para tentar encontrá-lo. Seu desaparecimento teve muito eco nas redes sociais. Pessoas do mundo do espetáculo envolveram-se no assunto. O cadáver apareceu nesta segunda-feira, 20 de janeiro, em um local afastado, após o suposto tiroteio entre policiais e criminosos. Os agentes que montaram a operação disseram que nos carros dos sicários, além dos corpos, encontraram uniformes de policiais, armas e coletes à prova de bala. Davam a entender que os assassinos tinham se passado por policiais. O procurador do Estado, Felipe Amadeo Flores, convenceu-se da versão e difundiu-a publicamente.

O pai do cantor estava convencido de que estava sendo enganado. Os assassinos de seu filho, pensava, são, de fato, policiais. Ou, ao menos, policiais haviam tido uma participação muito ativa no crime. Os vizinhos haviam informado a ele a cor e a matrícula do carro em que ele foi levado e, ao ir denunciar o caso, encontrou na garagem o veículo. “Não sou de fugir. Sou das pessoas que acha que em uma guerra destas deve-se colocar a família inteira, primos, irmãos, filhos. Para que as coisas mudem e o país melhore”, disse o pai durante esses dias.

Pouco a pouco a história está sendo esclarecida. Os policiais, segundo acredita a família pelas investigações que está tocando, envolveram por algum motivo dois jovens amigos de Gibrán. Os garotos têm antecedentes por roubo de carros. Em um dado momento, a polícia teve que ir com eles até o apartamento onde estavam Gibrán e seu amigo. Levar os quatro. O resto da história segue no escuro. As autoridades não explicaram qual é o papel exato dos policiais nem o motivo dos assassinatos. Imputa-lhes os delitos de abuso de autoridade e coação.

O Governo de Veracruz, e mais concretamente seu governador, Javier Duarte, receberam duras críticas por sua política de segurança e sua forma de administrar a justiça. Regina Martínez, uma jornalista da revista Processo que pesquisava assuntos espinhosos, foi assassinada em abril de 2012. A investigação de seu assassinato foi acompanhada de uma campanha de descrédito da jornalista, que tentava tampar uma possível conotação política do crime. Mais tarde foi descoberto um possível assassino, um viciado que estava doente. Na prisão, disse que havia sido torturado e a realidade é que a única prova contra ele era sua própria confissão. Deixaram-no livre. No caso de Gibrán já começam a circular fotografias nas redes sociais em que ele é visto armado e com drogas. Ninguém parece saber de onde elas saíram. Em Veracruz, as vítimas não descansam em paz ultimamente.

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