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Falta de consenso sobre presidência da Venezuela aprofunda a crise do Mercosul

Governo de Maduro substitui Uruguai à frente do bloco, apesar da oposição de Brasil e Paraguai

Federico Rivas Molina
Foto dos dirigentes regionais a última cúpula de presidentes do Mercosul, em 21 de dezembro de 2015.
Foto dos dirigentes regionais a última cúpula de presidentes do Mercosul, em 21 de dezembro de 2015.Telam

O Mercado Comum do Sul (Mercosul) atravessa uma das piores crises institucionais de sua história. A decisão do Uruguai de dar por encerrada sua presidência pro tempore e transferir o comando à Venezuela, país ao qual corresponde a sucessão, pela ordem alfabética, mergulhou o bloco em uma situação de acefalia que não tem precedentes. Caracas enviou na sexta-feira uma carta aos demais parceiros para comunicar que assumiu a presidência de 6 meses porque o cargo lhe corresponde "de forma automática", segundo a interpretação que fez dos estatutos da união. No entanto, Brasil e Paraguai afirmaram que não reconhecerão seu mandato porque entendem que os estatutos citados pela Venezuela exigem que o rodízio do comando seja definido com o "consenso dos parceiros", algo que não ocorreu. A Argentina, por ora, vem mantendo uma posição ambígua.

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"Temos por bem informar que, a partir do dia de hoje, a República Bolivariana da Venezuela assumirá com beneplácito o exercício da Presidência Pro Tempore do Mercosul, com base no artigo 12 do tratado de Assunção e em conformidade com o artigo 5 do Protocolo de Ouro Preto", escreveu a Chancelaria venezuelana em uma carta remetida aos países do grupo. O texto destaca que esses artigos são os "únicos instrumentos normativos fundacionais que regulam o procedimento e a continuidade do rodízio alfabético do comando no Mercosul".

O sistema funcionou até agora sem problemas, até mesmo quando a Argentina decidiu em 2013 não substituir a Venezuela, que estendeu seu mandato durante um ano. Em todos os casos as decisões foram tomadas com "o consenso e com a participação de todos os Estados partes", como estabelece o artigo 37 do Protocolo de Ouro Preto. O Paraguai citou esse artigo para denunciar como ilegítima a presidência da Venezuela no Mercosul. "É uma decisão unilateral da Venezuela. Para nós não existe a mencionada automaticidade que a Venezuela aponta com base no protocolo de Ouro Preto", disse o chanceler paraguaio, Eladio Loizaga.

Sem consenso

O Paraguai teve a adesão do Brasil à sua posição. O presidente interino, Michel Temer, disse que a Venezuela, antes de assumir o comando do Mercosul, tem de cumprir o processo de adaptação que iniciou em 2012, quando foi aceita como membro pleno. Em uma coletiva de imprensa em Brasília, Temer declarou que o "Brasil não está exatamente se opondo a que se transfira a presidência à Venezuela", mas "está ponderando que, para ser parte integral" do bloco, "tem que cumprir requisitos pactuados há quatro anos, que ainda não cumpriu".

A crise teve início depois da decisão do Uruguai de transferir o comando do Mercosul de qualquer jeito. Em um comunicado da Chancelaria, disse que "no dia de hoje não existem argumentos jurídicos que impeçam a transferência" do comando à Venezuela, apesar da oposição do Paraguai e do Brasil. O terceiro a discordar foi a Argentina, que até o momento vem mantendo uma posição ambígua. Sua chanceler, Susana Malcorra, defendeu o diálogo como a melhor saída para o atoleiro legal, sem condenar nem apoiar a Venezuela em suas ambições dentro do bloco. Um pouco mais direto, porém foi o presidente Mauricio Macri. Em uma entrevista dada ao diário El Comercio durante visita ao Peru, onde participou da posse de Pedro Paulo Kuczynski, o dirigente argentino atacou duramente a situação dos direitos humanos na Venezuela. "O que acontece ali é inaceitável. É a violação absoluta dos direitos humanos. Há presos políticos, existe desabastecimento, isso é algo com que não se pode conviver", disse Macri em Lima.

O certo é que o Mercosul está acéfalo e foi Macri quem viabilizou a verdadeira origem do problema. O giro político para a direita na região deixou a Venezuela sozinha e os parceiros do Mercosul já não estão tão propensos a respaldar o que consideram uma situação política insustentável. Além disso, o Paraguai decidiu cobrar o bloco pela entrada da Venezuela: quando houve a votação, o Paraguai estava suspenso do Mercosul por causa da destituição do presidente Fernando Lugo, decidida pelo Congresso em junho de 2012, uma medida que resultou na ativação da Carta Democrática do Mercosul contra o país. No Governo de Horacio Cartes consideram que a Venezuela "entrou pela janela" e não tem gabarito para ficar à frente do bloco em um momento em que está sob a lupa internacional pela qualidade da democracia no Governo de Maduro.

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