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Pandemia de coronavírus
Coluna
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Coração de pedra

Quando em um país as autoridades são incapazes de sentir responsabilidade e menos ainda empatia e dor com as vítimas de uma tragédia, como a pandemia do coronavírus, estamos chegando ao abismo

Juan Arias
Presidente Jair Bolsonaro em cerimônia no Planalto no dia 17 de junho em Brasília.
Presidente Jair Bolsonaro em cerimônia no Planalto no dia 17 de junho em Brasília.ADRIANO MACHADO (Reuters)

O Brasil já perdeu 50.000 pessoas vitimadas pelo coronavírus, e o Governo de Jair Bolsonaro não é capaz de chorar por elas. Nenhum dia de luto nacional. Nenhuma palavra de consolo e solidariedade com os mortos. Estamos diante de um coração de pedra.

Não é só um número frio. São 50.000 famílias de luto. É muita dor. São muitas lágrimas. Cada morto é uma história de vida e de amor. E não se tratou de uma fatalidade. Foi uma tragédia anunciada, pois o máximo responsável pela nação chegou a burlar-se da pandemia e boicotou as medidas de prevenção pedidas pela ciência e a medicina. Humilhou seus ministros de Saúde e teve o sarcasmo de dizer que “todos temos que morrer”. Sim, todos vamos morrer um dia, mas muitas dessas pessoas podiam ter se salvado.

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As famílias das vítimas não tiveram nem o consolo de velar e enterrar como seus mortos como gostariam. Foi dor somada a dor. Muitos foram enterrados na calada da noite, em valas comuns. O silêncio cínico de um governo com coração de pedra aumenta a dor das famílias. Quando em um país as autoridades são incapazes de sentir responsabilidade e menos ainda empatia e dor com as vítimas de uma tragédia, estamos chegando ao abismo.

Fariam bem as famílias das vítimas em denunciar a algum tribunal internacional a atitude de um presidente que durante todo o desenrolar da epidemia intentou negar a realidade e burlar-se dela. O Brasil é, conforme relatos vindos de fora, o país que mais desprezou seu perigo, que menos informações deu e que menos escutou a voz dos especialistas mundiais.

E a tragédia do coronavírus no Brasil não acabou e ainda pode ceifar muitas vidas. Os cemitérios ainda receberão muitas novas vítimas que poderiam ter sido salvas. E assim como as autoridades da nação revelaram um coração endurecido com as vítimas, o mesmo fazem com relação aos médicos e enfermeiros que sacrificaram sua vida para salvar as dos outros. Em alguns casos, foram até agredidos pelas tropas do presidente.

Os brasileiros podem ter muitos defeitos e muitos problemas atávicos por resolver, como o do racismo ou as graves diferenças sociais, mas ninguém pode acusá-los de terem coração de pedra. Eles sabem chorar e em cada tragédia natural souberam demonstrar solidariedade e compaixão com as vítimas.

É um país que precisaria ter neste momento um presidente capaz de detectar a dor das pessoas. Mas um governo cujo vocabulário, quando não soez, está sempre povoado por vocábulos de negatividade, como guerra, armas, ódio, inimigos, enfrentamento e ameaças, e nunca de palavras que favoreçam a convivência pacífica, como paz, liberdade, diálogo, solidariedade e compaixão, já é um governo morto.

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