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Donald Trump volta a ser seu pior inimigo na gestão do coronavírus

Presidente dos EUA deixa de dar coletivas de imprensa diárias, consideradas a princípio uma vantagem eleitoral, depois de fazer papel ridículo ao recomendar injeção de desinfetante contra a covid-19

Pablo Ximénez de Sandoval
Donald Trump na Casa Branca.
Donald Trump na Casa Branca.Andrew Harnik (AP)
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U.S. President Donald Trump rubs his hands between U.S. Sen. Roy Blunt (R-MO) and Small Business Administration (SBA) Administrator Jovita Carranza  while defending his comments on using household disinfectants as a measure against the coronavirus prior to signing the "Paycheck Protection Program and Health Care Enhancement Act," approving additional coronavirus disease (COVID-19) relief for the U.S. economy and hospitals treating people sickened by the pandemic, during a signing ceremony in the Oval Office at the White House in Washington, U.S., April 24, 2020. REUTERS/Jonathan Ernst - RC25BG9SV1IF
“Por favor, não comam pastilhas de detergente nem se injetem nenhum tipo de desinfetante”, pedem médicos
US President Donald J. Trump participates in a news conference on the COVID-19 pandemic with members of the Coronavirus Task Force, in the James S. Brady Press Briefing Room of the White House in Washington, DC, USA, 23 April 2020. *** Local Caption *** .
Trump sugere tratar coronavírus com “injeção de desinfetante” ou com luz solar

O show acabou. A reeleição do artista está em perigo. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse no sábado que não dará mais coletivas de imprensa diárias para atualizar as informações sobre o coronavírus. “Não vale a pena!”, tuitou, depois de dois dias sendo ridicularizado nacionalmente por sugerir teorias bizarras para combater o vírus. As palavras de Trump chegaram com mais de 50.000 mortes nos Estados Unidos pela covid-19 e a maior paralisação da economia em um século. Trump parece ter percebido que não pode transformar sua gestão da crise do coronavírus em um comício eleitoral constante.

A crise do coronavírus ofereceu a Donald Trump uma oportunidade única de se apresentar como líder do país a sete meses das eleições e com seus rivais trancados em casa. As entrevistas coletivas diárias na Casa Branca para atualizar as cifras bem como a ação do Governo federal foram até mesmo criticadas como atos eleitorais, e Trump não esconde que ele também as vê dessa maneira. Chegou a se gabar da audiência na televisão. Mas Donald Trump na frente de um microfone é um campo minado. Em algum momento, iria acabar explodindo.

Esse momento chegou na quinta-feira, quando Trump disse no púlpito da Casa Branca que era necessário pesquisar se o vírus poderia ser morto “colocando o corpo” sob uma “tremenda luz ultravioleta”. Depois, sugeriu que talvez se pudesse injetar desinfetante para matar o causador da covid-19. Não está claro quais são as fontes de Trump para lançar essas teorias no ar. “Para mim, parece interessante”, foi sua justificativa. O rosto da médica Deborah Birx, coordenadora da equipe contra a pandemia, enquanto escutava essas palavras de Trump, já virou piada na Internet.

O rebuliço na mídia e nas redes sociais foi imediato. Desta vez, porém, foi diferente de outras saídas de tom por parte de Trump. Não era escândalo, mas zombaria. Até o candidato presidencial democrata Joe Biden emergiu para pedir aos apoiadores de Trump que não cometessem suicídio. “Não acredito que tenho que dizer isso, mas, por favor, não bebam água sanitária”, escreveu ele no Twitter.

Uma empresa que fabrica dois conhecidos produtos de limpeza publicou uma declaração pedindo que ninguém os ingerisse. O chefe do órgão regulador de segurança alimentar também pediu que, sob nenhuma circunstância, as pessoas introduzissem desinfetante em seus corpos. O Centro para o Controle de Doenças publicou um tuíte no qual dizia educadamente: "Limpadores e desinfetantes domésticos podem causar problemas de saúde se não forem usados ​​adequadamente". Trump retuitou essa mensagem.

Na manhã de sexta-feira, Trump se justificou dizendo que tinha falado aquilo de modo “sarcástico”. Muito poucas vezes Trump tentou atenuar suas palavras com o argumento de que estava brincando. Em geral ele redobra a aposta. À tarde, ele deu as informações do dia sobre o coronavírus, mas, pela primeira vez, não admitiu perguntas. No sábado, não houve a coletiva de imprensa. Na parte da tarde, Trump deixou clara a nova situação em um tuíte: "Que sentido fazem as coletivas de imprensa da Casa Branca quando a insípida mídia mainstream nada faz além de formular perguntas hostis e depois se recusa a relatar os dados com precisão. Eles têm audiências recordes e os americanos recebem fake news. Não vale a pena o tempo e o esforço”.

Nessa altura, o Departamento de Emergências de Maryland afirmava que havia recebido 100 ligações de pessoas interessadas em saber sobre o uso de desinfetante contra o vírus. A autoridade de saúde de Nova York informou que havia registrado 30 casos de lesões por ingestão de produtos de limpeza entre quinta e sexta-feira, o triplo do mesmo dia do ano anterior. A autoridade de saúde de Illinois disse ter visto um “aumento significativo” nas consultas sobre problemas com produtos de limpeza.

Como todos os episódios desta crise do coronavírus, o erro de Trump tem uma dimensão de saúde pública, mas também eleitoral. Tudo isso está acontecendo a sete meses da eleição presidencial que os dois partidos veem como a mais importante em várias gerações. Para o Partido Republicano, o apego de Trump à televisão é uma faca de dois gumes, e está começando a cortar do outro lado. No momento, está difícil para Trump se apresentar como um líder moderado e coerente em uma situação de emergência nacional.

Trump é a cara dos Estados Unidos em uma crise em que 26 milhões de pessoas pediram auxílio-desemprego no mês passado. A melhora da economia, o principal argumento de reeleição de Trump, pode desaparecer por completo daqui até novembro. Não só a presidência está em jogo, mas a maioria no Senado. O Partido Republicano mostrou que está disposto a ir às eleições abraçado a Trump e defender, desculpar ou ignorar quase tudo o que o presidente diz. Quase tudo. A ideia de injetar-se desinfetante parece difícil.

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