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Por que o desconhecido ‘Lionheart’ é o filme mais bem avaliado da Netflix

Produção nigeriana, dirigida e protagonizada pela estrela africana Genevieve Nnaji, tem pontuação máxima no site Rotten Tomatoes, um unânime 100%, acima de ‘O Irlandês’ e ‘História de um Casamento’

A atriz e diretora Genevieve Nnaji ao lado de Nkem Owoh, seu tio no filme.
A atriz e diretora Genevieve Nnaji ao lado de Nkem Owoh, seu tio no filme.

Lionheart é a joia oculta da Netflix. O filme não teve tanta repercussão (e orçamento investido na promoção) como o último de Martin Scorsese, O Irlandês, protagonizado pelo trio de veteranos atores formado por Robert De Niro, Al Pacino e Joe Pesci. Também não acumulou conversas como as provocadas pela relação de Scarlett Johansson e Adam Driver no recentemente lançado História de um Casamento. A produção nigeriana Lionheart, entretanto, é a mais bem avaliada da plataforma, de acordo com o Rotten Tomatoes, o prestigioso e temido site que calcula a nota média dos filmes de acordo com o cômputo das críticas profissionais de diversos veículos de comunicação. Lionheart tem a melhor avaliação, um unânime 100%, contra 97% de História de um Casamento e 96% de O Irlandês. Como é possível?

Para começar, Lionheart não tem nada a ver com essa ode à testosterona protagonizada por Jean-Claude Van Damme nos anos noventa (também chamado Lionheart, que no Brasil foi lançado como Leão Branco – O Lutador sem Lei). Em Lionheart (o que nos interessa) a trama gira em torno de Adaeze, a filha de uma família nigerina rica, formada nos EUA, que, quando seu pai fica doente, deve assumir o controle da empresa de transportes da família, Lionheart, e demostrar sua capacidade de liderança. Dirigido e protagonizado pela estrela africana Genevieve Nnaji (Nigéria, 1979), não oferece somente o relato de uma mulher inteligente e capaz: também introduz uma imagem do continente africano honesta e próxima.

Romper com esses clichês de miséria e exotismo e trazer uma perspectiva realista foi justamente um dos principais objetivos da diretora e atriz. “O mais valioso que aprendi com Lionheart é que precisamos promover filmes feitos por nós, sobre nós, em benefício dos outros”, disse Nnaji durante sua apresentação no Festival Internacional de Toronto de 2018. “A África está repleta de histórias e a maioria tem a ver com nossas lutas diárias, como a igualdade entre homens e mulheres. Acho, entretanto, que muitos nigerianos, muitos africanos, e o mundo em geral, não sabem absolutamente nada de nós. Acho que há muita desconexão e a maneira de fazer do mundo um lugar mais próximo e igualitário é apresentar uns aos outros para que possamos entender que não somos tão diferentes”.

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Enquanto O Irlandês, de Scorsese, foi criticado nas últimas semanas por seu maciço elenco masculino e, concretamente, porque o personagem feminino de Anna Paquin só diz uma frase – recordemos que a atriz interpreta Peggy Sheeran, a filha do bandido da máfia Frank Sheeran (Robert de Niro) –, em Lionheart a protagonista é uma mulher empoderada. O personagem de Nnaji não se acovarda diante de ninguém e demonstra seu valor em uma sociedade patriarcal: seu próprio pai acha que o tio de Adaeze, Godswill, pode ter desempenho melhor que o dela como chefe da empresa somente pelo fato de ser um homem. Os críticos ressaltaram que o papel de Nnaji é tão importante como crível nos tempos atuais.

“Adaeze, nas mãos de Nnaji, rapidamente se transforma em uma atrativa heroína do século XXI, uma lutadora honesta que tenta romper os vínculos do patriarcado enquanto tenta manter o legado familiar”, diz o Los Angeles Times. É a mesma opinião do The New York Times. “Lionheart fala sobre a importância de preservar um legado familiar, a necessidade de que exista consenso entre as classes e grupo étnicos da Nigéria, e a sabedoria das gerações anteriores, até mesmo quando a mudança é necessária”, diz o jornal.

São essas críticas que levaram o filme ao topo do Rotten Tomatoes, e é aí que está a armadilha de sua avaliação. Porque Lionheart conseguiu essa nota tão alta com somente sete críticas em veículos de comunicação importantes, contra as 365 de O Irlandês e as 269 de História de um Casamento. São tão poucas que o espaço Critics Consensus [Consenso da Crítica] ainda continua em branco. Mas os que o fizeram dizem que o filme deve ter a pontuação mais alta.

Isso não significa que o filme – que ficou de fora da categoria de Melhor Filme de Fala Estrangeira do Oscar por ser filmado em sua maioria em inglês (língua muito falada na Nigéria) –, seja melhor ou pior. Só mostra a fragilidade do sistema do Rotten Tomatoes, uma das plataformas mais temidas em Hollywood desde sua criação em 1998, que chegou a ser culpada pelas arrecadações ruins de superproduções que obtiveram uma nota negativa no site como Piratas do Caribe: A vingança de Salazar (2016) e Baywatch: S.O.S. Malibu (2017).

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