Brasil dá adeus ao sonho do ouro olímpico inédito: “O futebol feminino não acaba aqui”
Seleção das veteranas Marta e Formiga, comandada por Pia Sunhage, dá adeus aos Jogos Olímpicos de Tóquio após cair nas quartas de final na disputa pelos pênaltis com o Canadá. Expoentes da modalidade chegam à reta final de suas carreiras sem a conquista sonhada
Mais uma vez, o Brasil deu adeus ao sonho do ouro olímpico inédito no futebol feminino. A derrota por 4 a 3 nos pênaltis para o Canadá, após o empate por 0 a 0, nas quartas de final, encerra a trajetória da seleção brasileira nos Jogos Olímpicos de Tóquio antes mesmo de ter a chance de brigar por um lugar no pódio. É a terceira Olimpíada em que o país fracassa na modalidade, e na que pode ter sido a última oportunidade da geração capitaneada pelas veteranas Marta e Formiga de vencer uma competição de primeiro nível. Assim como em 2016, o Brasil chegou cheio confiante no torneio, fez bons jogos na primeira fase, mas não entregou o resultado que esperava nos momentos mais decisivos da competição.
“O futebol feminino não acaba aqui”, disse Marta, ao deixar o campo. A camisa 10 homenageou a colega de equipe Formiga, que se despede das Olimpíadas após admiráveis sete participações, um recorde, aos 43 anos. “Inspiração para todas as meninas, poderia ter tido um final mais feliz.” Agora, as maiores expoentes da modalidade chegam à reta final de suas carreiras sem o desejado título. Aos 35 anos, não há garantias de que a capitã e melhor jogadora da história estará no próximo ciclo. “Não posso dar essa resposta agora. Falei para as meninas e falei diretamente para a Formiga que eu gostaria de ver mais uma vez aquela emoção de lutar pela medalha com ela. Mas agradeço demais por tudo que ela fez pela nossa seleção durante esses anos todos”, afirmou.
Marta terá 37 anos na Copa do Mundo de 2023 e 38 nos Jogos de Paris. Formiga já disse que essa foi a sua despedida, e Cristiane, 36 anos, ficou de fora da convocação para os Jogos após lesões seguidas nos últimos anos. “Peço para as pessoas não apontarem o dedo para ninguém, se tiver que apontar para alguém apontem para mim, já estou acostumada”, concluiu uma emocionada Marta, em entrevista à TV Globo, encerrando sua quinta participação em Jogos Olímpicos.
O algoz e o roteiro é parecido com a Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016. Na época, o Brasil também fez uma ótima primeira fase, se classificando como líder sem muitos problemas. Nas quartas de final, um 0 a 0 com a Austrália levou o jogo para os pênaltis, mas naquela vez as brasileiras conseguiram vencer. O mesmo placar foi repetido na semifinal, contra a Suécia, quando a seleção perdeu nas cobranças e teve o sonho do ouro em casa interrompido. Na disputa pelo bronze, o Brasil ainda perdeu para o Canadá por 2 a 1, acabando em quarto lugar. Agora, nem a chance de brigar pelo bronze será possível.
A derrota antes do pódio marca a terceira Olimpíada seguida em que o Brasil não consegue medalhas no futebol feminino. Antes, duas pratas com gosto amargo da derrota nas finais, em 2008 e 2004, marcaram uma geração excelente do futebol feminino brasileiro que não foi capaz de vencer uma competição de alto nível. Somam-se às frustrações olímpicas as campanhas que terminaram com derrota nos Mundiais de 2003, 2007, 2011, 2015 e 2019.
Outro fracasso, porém, não significa que o trabalho esteja indo na direção errada. Apesar de ter tomado decisões questionadas durante a preparação e a campanha olímpica, Pia Sundhage demonstrou ser um acerto como escolhida para o cargo de treinadora. Sua contratação veio acompanhada de mudanças estruturais na gestão do futebol feminino brasileiro, como a participação de mais mulheres na comissão técnica, na direção da CBF e movimentos em prol da igualdade de pagamento entre seleções masculina e feminina. Houve também evolução dentro de campo, com um time notavelmente mais organizado do que no trabalho anterior. Pia não confirmou oficialmente se seguirá no comando da equipe. Em entrevista ao SporTV, a lateral Tamires disse que a treinadora falou em “continuar o trabalho” na reunião que fez as jogadoras após a derrota, ainda no gramado.
A eliminação nos pênaltis do time mais forte
A partida que começou às 5h da manhã no horário de Brasília foi sonolenta. As poucas chances criadas pelos times se resumem a boas participações da goleira canadense Labbé, em chute de Debinha e cabeçada de Erika, além de uma bola parada do Canadá que explodiu no travessão da goleira Bárbara. Pior para o Brasil, de quem se esperava mais no jogo. A seleção de Pia Sundhage é teoricamente mais forte que as canadenses, e comprovou isso com uma melhor campanha na primeira fase. Enquanto o Brasil goleou a China (5 a 0), empatou com a Holanda (3 a 3) e venceu a Zâmbia (1 a 0), o Canadá ganhou apenas do Chile (2 a 1). Empatou com Grã Bretanha (1 a 1) e Japão (1 a 1). Porém, as brasileiras não conseguiram encontrar seu melhor jogo mesmo consideradas as favoritas.
Pia Sundhage escalou o Brasil com Bárbara no gol; Bruna Benites, Erika, Rafaelle e Tamires na defesa; Marta, Formiga, Andressinha e Duda no meio-campo; e Debinha e Bia Zaneratto no ataque. Posicionada aberta pela direita, Marta ficou longe do ataque e, quando pesou o cansaço, tampouco conseguiu ajudar na criação de jogadas. A veterana Formiga também cansou rapidamente e precisou ser substituída. Debinha, a artilheira da seleção, não conseguiu aproveitar as poucas chances que teve. Ludmila entrou no segundo tempo e ganhou na velocidade da zaga canadense por algumas vezes, mas não encontrou companhia. Andressa Alves, que vinha sendo a melhor opção no banco de reservas durante os três primeiros jogos, entrou somente aos 10 minutos do primeiro tempo da prorrogação. Assim, o Brasil viu a possibilidade de uma vitória sem dramas se transformar numa nervosa disputa de pênaltis.
Bárbara abriu as cobranças defendendo o pênalti de Sinclair, o que tranquilizou as brasileiras. Em seguida, Marta, Debinha e Erika converteram suas cobranças. Então começaram os erros. Andressa Alves escolheu o canto esquerdo da goleira e viu Labbé defender seu chute, o penúltimo da série. Já foi o suficiente para o Canadá empatar em 3 a 3. Na última rodada, as canadenses abriram 4 a 3, Rafaelle repetiu o erro de Alves e também parou na goleira rival. Labbé escolheu pular para o mesmo canto nas cinco cobranças do Brasil e, mesmo assim, conseguiu defender as duas últimas.
O Canadá segue na jornada olímpica e espera o vencedor entre Holanda e Estados Unidos para saber quem enfrenta na semifinal. Do outro lado da chave, a Austrália venceu a Grã-Bretanha e aguarda o ganhador de Suécia x Japão para formar o outro confronto.
Apoie nosso jornalismo. Assine o EL PAÍS clicando aqui
Inscreva-se aqui para receber a newsletter diária do EL PAÍS Brasil: reportagens, análises, entrevistas exclusivas e as principais informações do dia no seu e-mail, de segunda a sexta. Inscreva-se também para receber nossa newsletter semanal aos sábados, com os destaques da cobertura na semana.