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China desafia a soberba da Tesla, de Elon Musk

Um acidente e o protesto viral da dona de um veículo elétrico da marca abrem outra crise de reputação para a companhia

Tesla
Uma mulher protesta contra a Tesla subindo num veículo da marca no Salão do Automóvel de Xangai.VCG (a)
Dani Cordero

A mais nova tempestade que se abateu sobre a Tesla começou na segunda-feira, com uma jovem chinesa sobre o capô de um dos modelos da marca norte-americana no Salão do Automóvel de Xangai. “Os freios não funcionam”, gritava ela, enquanto uma pequena multidão se formava ao seu redor, com dezenas de celulares gravando a ação. Com as imagens viralizadas, a montadora automobilística controlada por Elon Musk teve que enfrentar sua enésima crise, ao ser acusada pela mídia próxima ao Governo chinês de tratar seus clientes com “arrogância”, enquanto um de seus executivos insinuava que algum outro interesse poderia se esconder por trás do protesto.

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EA6078. PEKÍN (CHINA), 25/03/2021.- Elon Musk, director general de Tesla Inc., habla durante el China Development Forum, el 20 de marzo de 2021 en el salón de eventos Diaoyutai en Pekín (China). El que ya se puedan comprar vehículos Tesla con bitcóins es uno de los clics tecnológicos de la semana en América. Elon Musk confirmó que ya es posible comprar un vehículo eléctrico Tesla con la criptomoneda bitcóin y que a final de este año esa posibilidad estará disponible a nivel mundial, algo que impulsó el valor de la divisa digital por encima de los 56.000 dólares. El anuncio coincidió con una alerta de Consumer Reports (CR), organización dedicada a las pruebas de productos, que advirtió que las cámaras que equipan los vehículos de Tesla despiertan "preocupaciones sobre la privacidad", días después de que se supiese que China limitó el uso de los autos del fabricante en ciertas áreas del país. EFE/EPA/WU HONG
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Ao invés de se desvalorizarem, as ações da Tesla acolheram o golpe com uma alta de 0,9% nesta semana, apesar da possíveis repercussões do caso no mercado chinês, que já responde por cerca de 30% das suas vendas. Contudo, a reputação da marca volta a estar em xeque. Como quando, no sábado passado, a polícia do Texas encontrou um Model S estampado contra uma árvore, com duas pessoas sem vida em seu interior e nenhuma delas ao volante, como se tivesse sido consequência do sistema de condução automática. Ou quando o próprio Musk arrebentou a janela do seu protótipo do Cybertruck logo após dizer que o vidro era inquebrável.

Nessas sucessivas polêmicas, como diz com certa ironia Albert Gallegos, diretor de relações internacionais da Associação de Vendedores de Automóveis dos EUA, “a culpa é sempre do cliente, nunca dos seus carros ou da tecnologia”. “Sua política é bastante arrogante e já aconteceu em várias ocasiões de se desvencilharem do problema”, acrescenta. No caso da jovem Zhang Yazhou, a pressão externa obrigou a um ato de contrição em capítulos diários.

Essa correção na forma de responder aos protestos não representou uma mudança de estratégia na defesa da sua tecnologia. O veículo em questão, um Model 3 dirigido pelo pai da manifestante, trafegava a 118,5 quilômetros por hora e freou até 48,5 antes de sofrer um acidente, segundo os dados apresentados pela Tesla às autoridades chinesas numa tentativa de arquivar o assunto e salvar sua imagem. Segundo o monitoramento do veículo, nos 30 minutos que antecederam ao acidente os freios teriam sido acionados 40 vezes, dados que Zhang põe em dúvida, após passar meses discutindo com a marca sobre uma suposta falha no sistema de freios. “Podem ter razão, mas não se pode responder como responderam. Essa é a grande diferença da Tesla para o resto de marcas de automóveis: a forma de tratar esses casos”, afirma Juan Felipe Muñoz, analista da consultoria Jato, especializada no mercado automobilístico.

A Tesla está tirando proveito da sua aposta no mercado chinês, onde fabrica carros desde 2019 e se transformou em uma importante exceção: não aterrissou na China pelas mãos de um sócio local, como historicamente fizeram as demais marcas estrangeiras. A concorrência é feroz no maior mercado mundial de veículos elétricos, com inúmeros fabricantes locais e os olhos atentos do Governo diante de qualquer concorrência desleal. No primeiro trimestre deste ano, o grupo californiano conseguiu vender ali 69.600 carros, quase quatro vezes mais que no primeiro trimestre do ano anterior.

Mas a Tesla padece na China do mesmo problema que já demonstrou ter nos EUA e Europa: a falta de uma vasta rede de concessionários e oficinas autorizadas que facilite a comunicação entre cliente e vendedor. Foi algo que admitiu em janeiro o diretor financeiro da empresa, Zach Kirkhorn: “A expansão dos serviços é realmente importante para a estratégia futura da companhia”, disse ele, segundo a Reuters. “Se você pula a concessionária, se expõe a que o cliente queira tratar diretamente com você e faça o que fez a garota em Xangai, porque não tem a quem recorrer”, observa Muñoz.

“Não ter concessionárias vai gerar problemas para eles, porque agora estão chegando as outras marcas com carros elétricos, depois de eles terem passado sete anos sozinhos. E todas estão apoiadas por concessionários. O que farão os possíveis compradores?”, pergunta-se Gallegos.

“O estranho é que não tenham tido mais problemas”

Algumas marcas europeias optaram por adiar os lançamentos de seus veículos elétricos por causa de falhas no desenvolvimento de seu software. A Tesla, porém, ainda não admitiu erros em sua tecnologia. Esteve Almirall, professor de operações e inovação da escola de negócios Esade, em Barcelona, não considera que os problemas da Tesla sejam tão graves. “Sua tecnologia é superior, mas tem o inconveniente de sua profunda dificuldade. O estranho é que não tenham tido muitos mais problemas”, afirma, dando como certo que essa vanguarda tecnológica expõe a empresa de Elon Musk a mais acidentes que outras marcas tradicionais.

Almirall considera, porém, que por trás das denúncias na China há “um nacionalismo econômico que deseja impor fabricantes locais à frente do mercado”. Muñoz acredita que o caso de Xangai mostre certo “superdimensionamento”, embora responsabilize também a marca por não ser capaz de “reconhecer erros” em seus produtos.


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