Em greve por fechamento de fábrica da Petrobras, petroleiros resistem à guinada liberal da estatal

Mais de 20.000 trabalhadores paralisaram atividades em 113 unidades, mesmo com decisão do STF a favor da companhia. Grupo pede suspensão de demissões e fim da paridade internacional de preços

Trabalhadores da Petrobras protestam em frente à sede da estatal no Rio de Janeiro.MARCELO CARNAVAL (Reuters)

Mais de 20.000 petroleiros da Petrobras ― cerca de um terço dos funcionários da estatal ―entraram em seu 13º dia de greve, nesta quinta-feira, mesmo com a ameaça da estatal de descontar salários dos empregados parados. Nesta quarta-feira, o embate chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que deu decisão favorável à petroleira e determinou que seja restabelecido o percentual mínimo de 90% de funcionários que devem continuar trabalhando durante a greve. A Federação Única dos Petroleiros (FUP) informou que irá recorrer da decisão do Supremo.

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A mobilização atinge 113 unidades da estatal em 13 Estados, segundo a Federação Nacional dos Petroleiros (FNP). A categoria cobra a revogação da demissão de funcionários da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná, a Ansa, desativada pela Petrobras. Com a decisão, a empresa anunciou o desligamento de 396 empregados. Os petroleiros também pedem o cumprimento do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) que, segundo a federação, não vem sendo respeitado. A categoria reivindica ainda o fim da política de paridade da petroleira com o mercado internacional, que segundo a FNP, impõe à população preços abusivos para o gás de cozinha e combustíveis. Desde o Governo de Michel Temer, a política de preços da Petrobras baseia-se na paridade internacional dos produtos no exterior e na flutuação do câmbio.

Nesta quinta-feira, os petroleiros associados à FNP também protestaram contra a política de desinvestimento — o que supõe fechamento de plantas ou venda do ativo para terceiros — da Petrobras. A estatal afirma, no entanto, que empenhou todos os esforços para a venda da empresa desativada no Paraná, cujo processo de desinvestimento iniciou-se há mais de dois anos. “As negociações avançaram com a companhia russa Acron Group mas, conforme comunicado ao mercado em 26 de novembro de 2019, não houve efetivação da venda. Devido à perspectiva de manutenção das características do seu mercado de atuação e às projeções de resultado negativo, a continuidade operacional da ANSA não se mostra viável economicamente, e por isso estão sendo encerradas as atividades da empresa”, afirmou a petroleira por meio de nota.

Sob o comando de Castello Branco, a Petrobras vendeu ativos, incluindo operações na África e saiu de negócios como o de fertilizantes. Faz parte de sua missão reforçar o balanço da empresa, que teve sua imagem arranhada por diversos escândalos de corrupção nos últimos anos, e se concentrar nos campos de pré-sal descobertos em 2006.

Além do desinvestimento, há um movimento de redução da participação do Governo na estatal. A equipe econômica de Paulo Guedes mostrou na semana passada que seguirá ao pé da letra a cartilha de redução de Estado. O governo tirou parte da sua participação na “joia da Coroa”, com a venda de milhões de ações da petroleira. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) logrou captar 22 bilhões de reais ao vender parte das ações da estatal, em uma das maiores operações de vendas de ações ocorrida no Brasil em dez anos. O Governo não fala, ao menos por ora, em privatização da maior estatal brasileira, e mantém hoje 50,2% do controle da Petrobras, uma das maiores petroleiras do mundo. Desde a chegada da ultradireitista ao poder, foram colocados no mercado cerca de 30 bilhões de reais de ações da Petrobras, que eram mantidas pelo banco de fomento e também pela Caixa.

“Movimento descabido”

A Petrobras afirmou por meio de nota, no início da greve, que o movimento é “descabido” e que tomou as providências necessárias para garantir a continuidade das atividades. Segundo a estatal, as unidades estão operando nas condições adequadas, “com reforço de equipes de contingência quando necessário, e não há impactos na produção até o momento”. A Petrobras obteve autorização para contratar trabalhadores temporários.

Décio Oddone, diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), enviou carta ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) alertando sobre um risco de eventual desabastecimento de combustíveis no Brasil com a greve dos petroleiros. Segundo documento, obtido pela agência Reuters, Oddone afirmou que embora a Petrobras, visando uma solução temporária, tenha alocado equipes de contingência para atuar nas unidades operacionais, assegurando a operação e a segurança, “a situação foge da normalidade”. Oddone afirmou nesta quinta à Reuters que até agora não houve impactos no abastecimento devido à paralisação, “mas pode vir a ter”.

Em sua carta ao tribunal, Oddone disse ainda que o prolongamento da greve poderá afetar não só a produção e o abastecimento, como a arrecadação de impostos em todas as esferas da federação. “Não há informações de negociação e indicativos do fim da greve, de modo que caso não haja uma composição breve, toda a cadeia poderá ser afetada”, alertou o documento.

A Federação Única dos Petroleiros afirma que a greve não provoca riscos à produção da companhia. Segundo a FUP, a estatal usa dois discursos para tratar da questão do desabastecimento da forma que melhor lhe convém. "Nos autos dos processos, alega que há desabastecimento, e para a imprensa emite notas dizendo que a situação está normalizada. A FUP reitera que não há desabastecimento de combustíveis provocado pela greve dos petroleiros em nenhum estado da federação', disse em nota.




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