O guru do Brasil na pandemia tem 15 anos
“As pessoas preferem abrir o Instagram e ver algo engraçado do que notícias.” Com esse mote, humor e traços toscos, Pedro Vinício, de 15 anos, captura o clima de saco cheio no país e consegue milhares de seguidores
“Eu amo todo mundo. Alguns eu amo ter por perto, outros eu amo evitar, uns eu amo bem longe de mim. E tem aqueles que eu amaria nem ter conhecido.” Quanta experiência de vida é preciso para chegar a essa conclusão? Pedro Vinício Ferreira de Araújo, o autor, tem 15 anos. Com essas e outras frases sinceras e bem-humoradas, emolduradas por rabiscos e desenhos “ruins” —segundo o próprio—, o estudante provoca risadas à distância através de postagens diárias, chama a atenção de famosos como Fafá de Belém e Mônica Iozzi e cativa quase 90.000 seguidores no Instagram. Um jovem que colocou a criatividade a serviço da internet captura o clima de saco cheio no Brasil há mais de um ano mergulhado na pandemia da covid-19.
“Por trás de todos os desenhos existe uma pessoa que tentou fazer você sorrir”, resume Pedro já na bio do perfil, onde se classifica como artista. A definição não deixa de ser também um desejo, uma vez que o morador de Garanhuns, em Pernambuco, e filho de Neide e Mário Araújo afirma que quer cursar artes plásticas ou visuais quando crescer. Na escola, as atividades de artes dividem sua preferência com as aulas de história e português que tem no oitavo ano do ensino fundamental. “Agora meus amigos ficam falando que eu estou famoso, mas eu acho isso bem massa”, conta ele. Segundo o estudante, ele começou a se apaixonar pelas artes quando foi convidado por uma professora, ainda nos primeiros anos da escola, para pintar um muro. Começou a fazer quadros óleo sobre tela, dos quais tirava fotos para postar na internet, mas se arrependeu. “As fotos ficavam ruins, com muita sombra, aí fiquei com raiva e apaguei tudo”, justifica o exigente artista.
Com a dificuldade de comprar o material para pintura na pandemia, Pedro partiu para os desenhos digitais. Um aplicativo de ilustrações no computador, outro no celular e o capricho do óleo sobre tela foi trocado pelo improviso dos desenhos, rabiscos e frases debochadas. “Eu falo que os desenhos são ruins porque não me importo com a estética, e sim com as frases”, ri. As ilustrações são, inclusive, baseadas em desenhos que o jovem fazia durante todas as aulas, e não só nas de artes. Segundo ele, seus cadernos de estudo têm mais rabiscos do que exercícios. “Eu tive problema para fazer ele entender que o colégio é para ler e escrever, porque ele só queria desenhar e pintar. As professoras sempre me chamavam para conversar”, corrobora a mãe, Neide, de 40 anos. “Mas ele logo entendeu que era para desenhar em casa e foi melhorando. Sempre teve um perfil criativo, desde criança”, completa.
Se os desenhos têm origem na sala de aula, o principal conteúdo da sua página —as frases— vem de várias inspirações diferentes. A principal delas é a sua irmã, Marília Araújo, de quem Pedro ouve e anota desabafos, reclamações e outras confissões que acha interessante. Daí ele cria, por exemplo, as artes que dizem “na última vez que tive paz, eu estava assistindo TV Globinho” (um programa que acabou em 2012, quando Pedro tinha só 6 anos, mas Marília já era uma pré-adolescente) e “são tantos dias de luta que já estou ficando violenta”. Mas as ideias também vêm de filmes e séries que assiste —”gostei muito do último documentário que vi, sobre o Arnaldo Antunes”—, músicas dos Ramones e do Caetano Veloso, que ele gosta de ouvir, e conversas de outras pessoas —”gosto de observar o jeito que as pessoas escrevem nas redes sociais”. “Não existe uma rotina. Quando bate uma inspiração na mente, já escrevo para não esquecer e desenho quando der. Anoto bastante, porque qualquer coisa dá uma ideia”, explica.
A ideia original de Pedro era criar um perfil privado onde pudesse armazenar suas ideias. Só percebeu que deixar público tinha sido uma boa ideia quando, quatro meses após seu início, foi compartilhado por artistas como a cantora Fafá de Belém e as atrizes Mônica Iozzi e Andreia Horta. Com dezenas de milhares de seguidores, Pedro assume o objetivo de tentar fazer as pessoas sorrirem. “Eu acho que as pessoas gostam porque se identificam. É muito melhor abrir o Instagram e ver algo engraçado do que uma notícia nessa pandemia”, ressalta ele que, apesar da preferência, diz que um dos seus passatempos é acompanhar o noticiário através de vários jornais do mundo. Motivado pela identificação com seus seguidores, o jovem também conta que considera o autor das artes um personagem. “Às vezes eu me refiro a mim mesmo como uma menina, porque também quero que as mulheres se sintam representadas e identificadas. Não represento só eu com as frases, mas várias pessoas, por isso o perfil é um personagem”, justifica.
A mãe de Pedro deixa claro que a família nunca colocou dinheiro em parcerias ou divulgações no perfil do Instagram, mas que o estudante já recebeu propostas de duas editoras para lançar livros com as suas ilustrações, algo que ele vê com bons olhos. “No fim eu lido bem porque vejo ele feliz em fazer o que gosta, que é deixar outras pessoas felizes também”. Neide pondera, no entanto, que o foco atual precisa estar na escola, e não deixa de considerar “preocupante” o adolescente misturar os estudos com o trabalho na rede social. “Tem que ter regra, um controle, horário para entrar e sair do celular. A sorte é que o Pedro é um menino tranquilo”, garante. A mãe não abre mão disciplina: a cada lição de casa feita, Pedro ganha uma hora na rede social.
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