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Ysani Kalapalo, a youtuber indígena que Bolsonaro exibiu na ONU

Representante da comunidade do Xingu viajou a Nova York e foi citada como liderança indígena pelo presidente, mas não tem a aprovação de sua tribo

Ysani Kalapalo tem mais de 275.000 inscritos em seu canal.
Ysani Kalapalo tem mais de 275.000 inscritos em seu canal.REPRODUÇÃO / YOUTUBE
Diogo Magri
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Acossado há semanas por críticos de todo o mundo por conta dos incêndios que fizeram a floresta amazônica arder, o presidente Jair Bolsonaro dedicou boa parte do seu discurso de abertura na Assembleia Geral da ONU para falar sobre a preservação do meio ambiente no Brasil. Durante a fala, aproveitou para citar a indígena Ysani Kalapalo, uma jovem que, segundo o presidente, “goza da confiança e do prestígio das lideranças indígenas interessadas em desenvolvimento, empoderamento e protagonismo”. Ysani, que é youtuber, viajou a Nova York como parte da comitiva de Bolsonaro e foi alçada por ele ao posto de principal representante da categoria dentro do Governo. A “indígena de direita” é, no entanto, deslegitimada pela própria tribo. E, antes de apoiar o discurso bolsonarista, foi admiradora de Jean Wyllys e se disse traída por Dilma Rousseff.

Natural do Parque do Xingu, em Mato Grosso, Ysani Kalapalo esteve, até 2015, à frente do Movimento Indígenas em Ação, pelo qual protestou contra a instalação da Usina de Belo Monte, em Altamira, e chegou a discursar em 2013 no X Seminário LGBT do Congresso Nacional, promovido pelo então deputado federal do PSOL Jean Wyllys. Lá, disse que "foi um privilégio receber o convite do grande deputado" e que "a luta dos povos indígenas se compara muito à luta dos homossexuais". Também nesse período, a ativista acusou publicamente a Havaianas de violar os direitos autorais dos povos do Xingu ao lançar a coleção de chinelos Tribos, que trazia em suas estampas desenhos de povos indígenas brasileiros.

Conforme conta em seu canal de YouTube, no qual acumula mais de 275.000 inscritos, Ysani percebeu há quatro anos que repetia ideias nas quais não acreditava. Além de se considerar traída por Dilma Rousseff, que teve seu apoio enquanto presidenta, a youtuber conta no vídeo "Por que eu sou indígena de direita", publicado em maio, que estudou política e se reconheceu mais nos posicionamentos de direita. "A indígena do século 21" é a frase que aparece na capa de seu canal.

Desde de 2018, quando se encontrou com Jair Bolsonaro, a ativista defende o discurso do atual presidente. Também através de um vídeo, ela isenta Bolsonaro de culpa pelas queimadas na Amazônia neste ano, que desencadearam uma crise internacional para o Governo brasileiro. Segundo Ysani, "a Amazônia é muito quente e qualquer fogo que você acende pode se espalhar rapidamente. É uma coisa que já existe há milhares de anos. Na minha região, tem também um fogo que se acende sozinho, debaixo da terra". Dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) apontam que a área desmatada da floresta amazônica aumentou 222% se comparada ao mesmo período do ano passado.

Foi com esse discurso que Ysani Kalapalo foi elevada a representante indígena na comitiva de Bolsonaro para a Assembleia Geral da ONU, onde também presentou Bolsonaro com um colar usado pelo mandatário na viagem. Na noite desta segunda-feira, publicou em seu Instagram um vídeo com o General Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança institucional da Presidência: "É 'nóis' em Nova York caminhando de boa", falou. A ida de Ysani com o Governo para os Estados Unidos motivou uma carta de repúdio assinada por caciques de 14 povos indígenas do Xingu, inclusive o cacique dos Kalapalo, povo de Ysani. De acordo com os líderes, o convite para a comitiva "demonstra mais uma vez o desrespeito com os povos e lideranças indígenas renomados do Xingu" e "tem o objetivo de ofender e desmoralizar o movimento indígena no Brasil".

A liderança indígena brasileira mais reconhecida no mundo é o cacique Raoni Metuktire, 89 anos, da etnia Caiapó, que visitou a Europa no início do ano buscando o apoio para ações em defesa da Amazônia em meio a críticas a Bolsonaro. No discurso desta terça, o presidente afirmou que Raoni foi usado "como peça de manobra por governos estrangeiros na sua guerra informacional para avançar seus interesses na Amazônia". Também apresentou Ysani como uma líder alternativa e oposta ao cacique dentro da comunidade, uma vez que, segundo Bolsonaro, a visão de um representante não é a de todos os índios brasileiros: "Acabou o monopólio do senhor Raoni", avisou ele.

No vídeo usado pela youtuber para criticar Raoni, intitulado “Ele não é nosso cacique geral” e publicado no dia 17 de setembro, Ysani concorda ao dizer que uma liderança não pode representar todas as aldeias do Xingu. “Cada cacique cuida de sua própria aldeia, um único não dita a regra por todos. Estou aqui para desmentir as fake news sobre queimadas, porque isso não é culpa do Governo. Faz parte da nossa cultura queimar a roça para plantar mandioca”, afirma.

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