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MP prevê que general “monitore” ONGs e exclui menção a LGBTs em pasta de Direitos Humanos

Medida Provisória muda atribuições da Secretaria de Governo, sob controle do general Carlos Alberto dos Santos Cruz

Gil Alessi

O general Carlos Alberto dos Santos Cruz tomou posse nesta quarta-feira à frente da Secretaria de Governo. Além das atribuições de praxe da pasta que comandará, como interlocução com Estados e municípios, uma Medida Provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro na terça-feira coloca as ONGs que atuam no país sob a batuta do militar reformado. De acordo com o texto, caberá à secretaria “supervisionar, coordenar, monitorar e acompanhar as atividades e as ações dos organismos internacionais e das organizações não governamentais no território nacional”. Na redação anterior o papel da pasta neste ponto era de auxiliar “no relacionamento e na articulação com as entidades da sociedade civil”. A mudança foi vista como preocupante por representantes de diversas ONGs, além de ser considerada inconstitucional por alguns advogados.

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O presidente já havia dirigido uma série de críticas à atuação das entidades, e nesta quarta-feira disparou novamente contra elas. Ele justificou a transferência de poderes da Funai para o ministério da Agricultura, sob controle de uma ruralista, afirmando que os indígenas são “manipulados” por ONGs. “Mais de 15% do território nacional é demarcado como terra indígena e quilombolas. Menos de um milhão de pessoas vivem nestes lugares isolados do Brasil de verdade, exploradas e manipuladas por ONGs”, escreveu no Twitter. Não foi o primeiro ataque do capitão às entidades da sociedade civil. Em dezembro ele já as havia acusado de atrapalhar o “desenvolvimento do país”: “Reduzir o Estado, desenvolvimento sem entraves de ONGs, acordos comerciais bilaterais já em andamento e mudar a atual pífia linha educacional. Vamos alavancar o Brasil!”.

Ao confrontar as ONGs, Bolsonaro entra na lista de líderes mundiais de direita que elegem as  entidades financiadas por fundações internacionais como inimigas. Donald Trump encabeça a fila: o presidente dos EUA vetou o financiamento público a algumas entidades que atuam com saúde da mulher. O mandatário húngaro, Viktor Orban, que fez questão de vir à posse de Bolsonaro, elaborou um pacote legislativo chamado Stop Soros, cujo objetivo era deter a “elite globalista” liderada pelo bilionário e filantropo George Soros, que financia diversas ONGs.

Se o presidente adotou um tom agressivo, Cruz chegou a dar declarações mais conciliadoras, afirmando que sua secretaria serviria como “porta de entrada” para reivindicações de “MST, ONGs, gays, Fiesp, OAB, índios, todos”.

Juana Kweitel, diretora-executiva da Conectas, que atua na área dos Direitos Humanos, afirma que já “há alguns anos a Secretaria de Governo tem um papel de interlocução com a sociedade civil, mas não de controle, isso é novo e chama a atenção”. Para ela, “não compete à presidência controlar atividades da sociedade civil organizada, a democracia depende de uma sociedade civil atuante”. Em sua avaliação, no entanto, o texto da MP é vago e deve ser regulamentado por decretos futuros. Ela não descarta tentar reverter as alterações propostas pelo presidente no Congresso, ou até mesmo judicializar a questão.

Existe ainda a possibilidade de que a mudança nas atribuições da Secretaria seja inconstitucional. “A Constituição Federal assegura liberdade de associação e a vedação de interferência estatal no funcionamento das associações”, afirma Aline Gonçalves de Souza, pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas – São Paulo. Ela é autora de trabalhos sobre o marco regulatório do 3º setor, mecanismo aprovado em 2014 justamente para regulamentar as relações entre Estado e entidades. Segundo Souza, esta legislação “faz toda a fiscalização do recurso publico que é repassado paras as entidades que realizam politicas publicas, e é uma legislação extensa, com muito mecanismos de controle e de âmbito nacional”.

A reportagem tentou sem sucesso entrar em contato com o general Cruz para comentar as mudanças.

População LGBTI não citada

A medida provisória editada por Bolsonaro também chama a atenção pela exclusão da população LGBTI em um dos trechos. A expectativa era que a nova pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que será comandada pela pastora Damares Alves, ficasse encarregada de formular políticas voltadas para este grupo, mas o termo desapareceu. Em nota, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) criticou a ausência de qualquer secretaria ou estrutura voltada para a população LGBTI. “Não há citação explicita às LGBTI em momento algum. Dentre as políticas e diretrizes destinadas à promoção dos direitos humanos estão incluídos explicitamente as mulheres, criança e adolescente, juventude, idoso, pessoa com deficiência, população negra, minorias étnicas e sociais e Índio, ou seja as LGBTI, que antes eram citados nas estruturas de Ministérios e Secretarias Especiais da Presidência, foram excluídas”.

Ainda segundo a ABGLT, o Conselho Nacional de Combate a Discriminação "que conhecemos como Conselho Nacional LGBT, continua, mas de acordo com seu decreto tem a função de formular e propor diretrizes de ação governamental, a execução depende de uma pasta específica que ainda não sabemos se será mantida como diretoria como estava antes e onde será alocada".

Sergio Queirós, Secretário Nacional da Proteção Global, órgão que será responsável pela questão LGBT no novo Governo, disse que ela "terá a mesma estrutura do governo anterior. Nenhum direito da comunidade será suprimido", disse ao UOL.

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