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Trump e Kim Jong-un jogam a paz nuclear no cara ou coroa

Fracasso do diálogo entre os líderes reabriria a possibilidade de um conflito, mas sem rede diplomática

Jan Martínez Ahrens
Um míssil norte-coreano Hwasong-12, lançado supostamente em agosto
Um míssil norte-coreano Hwasong-12, lançado supostamente em agostoAP
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A História gosta de se sentar ao lado do tabuleiro. Olhar os contendentes e ver como fracassam ou vencem. Donald Trump e Kim Jong-un decidiram aceitar o desafio e, quebrando as regras, realizar um cara a cara que os coloca no fio da navalha. Ambos têm tanto a perder como ganhar. Não é só o fato do Líder Supremo colocar em jogo sua sobrevivência e o presidente dos EUA correr o risco de um ridículo cósmico. Um fracasso reabriria a possibilidade de um conflito nuclear, mas dessa vez sem rede diplomática.

O jogo é o cara ou coroa. Da reunião sairá o pacto ou a derrota. Poucos especialistas acham que existem outros caminhos. “O fracasso não é opção. Trump não pode legitimar o regime sem obter a desnuclearização. Se falhar, seria um péssimo sinal, e não podemos nos esquecer de que o Irã acompanha de perto o que acontece”, afirma Jonathan Schanzer, vice-presidente do think tank Fundação à Defesa das Democracias.

Para assegurar-se de que nada saia errado, a Casa Branca sinalizou um caminho inequívoco. Não baixará a guarda e manterá “a pressão máxima”. As sanções, as manobras militares e o cerco internacional continuarão apertando o pescoço da paupérrima Coreia do Norte até conseguir um acordo. “Não iremos cometer os erros do passado. Revisamos tudo o que foi feito em negociações anteriores e todas levaram a uma distensão; foram feitas concessões em troca da manutenção do diálogo. Mas dessa vez o presidente tem claro que não dará nenhuma recompensa a Kim Jong-un”, afirma um porta-voz da Casa Branca.

Esse cerco, auxiliado pela China, é possivelmente o causador da mudança do Líder Supremo, mas também abriu uma margem para legitimar seu regime. Kim é alguém odiado no cenário mundial que, após tensionar o arco nuclear, conseguiu que uma tirania comunista hereditária, embarcada em uma vertiginosa corrida armamentista, sinta-se em condições de igualdade com a mais poderosa democracia do mundo. Para consegui-lo, ofereceu a desnuclearização. Algo que sabe que será bem recebido. Os EUA, sob a égide de Trump, não pedem avanços democráticos e se dão por satisfeitos com a retirada do armamento nuclear. E à China basta assegurar a continuidade de uma ditadura que age como muro de segurança frente à Coreia do Sul e as tropas americanas.

Esse é o quadrante ideal dessa negociação. Mas a realidade não costuma se dar bem com a geometria. “Se Trump não sentir que tem o que quer, corremos o risco que volte atrás, considere a via diplomática morta e passe à ação”, afirma Jenny Town, do Instituto EUA – Coreia na Universidade John Hopkins. “Esse ato de diplomacia tão desconcertante também pode nos aproximar da guerra. Se as negociações fracassarem na reunião, as partes ficarão sem o recurso da diplomacia”, escreveu o especialista Victor Cha no The New York Times.

Essa sombra de fracasso é acrescida pela própria personalidade dos líderes. Kim é letal e não possui capacidade de diálogo. Filho e neto de tiranos, mantém seu país em uma caverna escura, enquanto ele se deixa adorar sob um cenário kitsch. Trump, apesar de sua experiência empresarial, nunca realizou antes uma negociação desse tipo. Imprevisível e instintivo, suas reações podem tanto ajudar como afundar qualquer esforço.

“Eu acho que o acordo é possível. A Coreia do Norte nunca viveu uma pressão como a de agora e não negociou com alguém tão imprevisível como Trump. Isso até pode ser uma vantagem. Mas é preciso ter consciência do que aconteceu outras vezes: os norte-coreanos decidiam uma coisa e depois faziam outra”, afirma o especialista Schanzer.

A desconfiança em relação a Pyongyang não parou de aumentar desde que a reunião foi anunciada na noite de quinta-feira. Sem data e locais concretos para o encontro, os especialistas alertam que Trump ocupou o espaço de seus diplomatas e passou à liderança de uma negociação insólita, enquanto seu rival norte-coreano não falou em público. Tudo o que se sabe vem do relato de emissários sul-coreanos que jantaram com o tirano. E nem sequer há uma concordância sobre o que Pyongyang entende ao referir-se à desnuclearização.

As diferenças são muitas e a velocidade, alta. A reunião pode acabar com um choque de trens ou uma nova ordem coreana. Mas dificilmente existirão saídas intermediárias.

Apoio da ONU e da Europa

A ONU, a UE e as principais capitais europeias viram com bons olhos a futura reunião entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o tirano norte-coreano, Kim Jong-un. O secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, comemorou através de seu porta-voz “a liderança e a visão de todas as partes”. A UE considerou o passo como “positivo” e a chanceler alemã, Angela Merkel, falou de um “lampejo de luz”.

Mais prosaico, nos Estados Unidos, o vice-presidente Mike Pence lembrou que a Casa Branca não fez nenhuma concessão para conseguir esse cara a cara e atribuiu todo o mérito ao presidente, Donald Trump, e sua estratégia de cerco. “Aumentamos constantemente a pressão ao regime de Kim. Nossa política é firme: todas as sanções continuam valendo e manteremos a pressão até que a Coreia do Norte dê passos concretos, permanentes e verificáveis”, disse Pence em um comunicado.

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