Barcelona somos todos
O fanatismo independentista rompeu a unidade imprescindível
A multidão de manifestantes que neste sábado, dia 26 de agosto, percorreu as ruas de Barcelona para expressar sua repulsa ao terrorismo foi, de forma majoritária, uma demonstração de unidade e também uma mostra da capacidade de caminhar juntos de uma sociedade açoitada pelos terríveis atentados do dia 17 de agosto passado, os piores vividos pela Espanha desde 11 de março de 2004. As centenas de milhares de pessoas que se uniram à marcha compreenderam que o verdadeiro inimigo que altera a convivência e afeta a existência normal dos cidadãos são os terroristas. Agrupados sob um mesmo lema (“No tinc por”, Não tenho medo), os coletivos sociais, os serviços de emergência e as forças de segurança que socorreram as vítimas nos primeiros momentos do brutal atropelamento na Rambla expressaram a uma só voz sua repulsa ao terrorismo jihadista.
Mas, paralelamente, um grupo menor, ainda que muito significativo e muito bem organizado, certamente com respaldo institucional, quis capitalizar esse protesto pacífico para extrair dali um rendimento político espúrio. Não só é lamentável que em certas circunstâncias tão marcadas pela comoção se tenha tentado transformar a marcha em um ato independentista, como uma prova a mais, e decisiva, de até que ponto a causa do separatismo degenerou na intolerância e no fanatismo mais demencial. As vaias contra o Rei e contra Mariano Rajoy, que compartilhavam a frente da marcha ao lado de cidadãos muçulmanos, são um fato a mais na construção de um falso relato de vitimismo. Ondular esteladas, a bandeira da Catalunha, estrategicamente posicionadas atrás do chefe de Estado e do presidente do Governo, foi uma tentativa bem calculada e perfeitamente orquestrada para desvirtuar o objetivo de uma convocatória alheia aos vaivéns políticos.
Quem tentou empanar a manifestação não deixa de ser um grupo de radicais, infelizmente não tão pequeno quanto uma classe política demasiadamente complacente quer nos dar a entender. Mas, por menos que sejam, gozam de uma grande força ao contar com o amparo da Generalitat, que em última instância legitima suas ações. É necessário cortar pela raiz esses laços e que as forças moderadas se descolem dos sectários e dos intolerantes para recuperar uma vida política sadia, na qual se anteponha o respeito à lei e às ideias. Foi vergonhoso observar nas imagens dos canais de televisão como os mesmos que aclamam Iglesias portando esteladas impediram com seus gritos expressarem-se representantes de outros partidos políticos.
Não foi só dor o que se testemunhou em Barcelona, mas a necessidade de unidade na ação. Às autoridades cabe acolher esse sentimento e transformá-lo em ações eficazes: desde a promoção de medidas no âmbito do pacto antiterrorista, ao qual deveriam se somar Podemos, PDCat, ERC e PNV, até as possíveis reformas do Código Penal ou a perseguição dos novos perfis jihadistas.
Felizmente, por hora, a tentação de instrumentalizar a marcha de sábado foi repelida pelos grandes partidos de âmbito nacional. Não deveria ficar aqui este esforço. Se é possível tirar algo positivo da manifestação de ontem é a demonstração de que em nossa democracia cabem todos. Como todos couberam nas ruas da cidade recentemente afetada pelo terrorismo, desde o Rei até os representantes de todos os partidos de âmbito nacional e autoridades autonômicas e municipais, como todos cabem em um Estado de direito que enfrenta o terrorismo sem medo.
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