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Partido Socialista francês entra no purgatório

Primeiro secretário, Jean-Christophe Cambadélis, renuncia após resultado ruim

Silvia Ayuso
Jean-Christophe Cambadélis, após anunciar demissão.
Jean-Christophe Cambadélis, após anunciar demissão.G. VAN DER HASSELT (AFP)

O segundo turno das eleições legislativas da França apenas confirmou para o Partido Socialista aquilo que já se sabia – e se temia – desde a campanha presidencial: começou sua passagem pelo purgatório. O partido que dominou o Palácio do Eliseu e a Assembleia Nacional no último quinquênio agora se encontra à beira do desaparecimento político e do abismo econômico. Com uma previsão de 48 deputados, em comparação aos 284 do último mandato, não há como esconder a debacle do que era até agora um dos grandes partidos da França. A formação socialista deverá decidir, nos próximos dias, como seguir adiante sem se afogar no ‘tsunami Macron’, começando por superar suas próprias divisões internas, que são muito profundas. E o fará sem seu primeiro secretário, Jean-Christophe Cambadélis, que anunciou sua renúncia assim que soube dos resultados.

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Com o gesto sério, Cambadélis compareceu minutos depois do fechamento das urnas com o mesmo rosto sóbrio que exibiam todos na sede socialista, em Paris. Em um breve discurso, reconheceu uma derrota indiscutível e anunciou sua demissão do comando do partido – que agora, para ele, deverá “abrir um novo ciclo”.

“Os eleitores quiseram dar uma oportunidade ao novo presidente e não quiseram dar nenhuma a seus adversários”, resumiu Cambadélis sobre os resultados, que confirmam a ampla vitória da formação de Emmanuel Macron. Agora “a esquerda tem que mudar tudo, tanto seu molde como seu recheio, suas ideias e sua organização. A esquerda deve abrir um novo ciclo”, insistiu o socialista, que reconheceu que será um “desafio imenso” e uma “tarefa de grande fôlego” que ele apoiará, mas não à frente do PS. “Acompanharei esse combate decisivo com vontade, mas não o farei como primeiro secretário do Partido Socialista”, afirmou.

O desaparecimento de Cambadélis foi progressivo ao longo da última semana. Ele, que era o líder dos socialistas desde 2014, sofreu uma humilhante derrota ao ser eliminado no primeiro turno. O distrito parisiense que o confirmou como deputado desde 1997 lhe deu as costas de maneira brutal. Assim como o PS a nível nacional, o primeiro secretário não obteve nem 10% dos votos, perturbado pelo candidato da formação A República em Marcha (LRM), Mounir Mahjoubi, membro do gabinete de Macron. Triste consolo: Cambadélis não é a única figura socialista que ficou pelo caminho. Nem Benoît Hamon, candidato presidencial, nem o ministro de François Hollande Matthias Feckl, nem deputados históricos como Patrick Menucci conseguiram passar para o segundo turno. A votação deste domingo ampliou ainda mais a lista de derrotas, como a da também ex-ministra de Hollande Najat Vallaud-Belkacem.

O debate sobre o futuro do PS, adiado

Em uma tentativa de não acabar com as poucas esperanças que restavam aos candidatos ainda em disputa, os dirigentes socialistas decidiram adiar até o fim das eleições o inevitável debate sobre o futuro da formação e a orientação que o partido deve adotar para sobreviver na era “sem esquerda nem direita” de Macron.

O PS tem muito o que discutir, inclusive se mantém seu nome. Mas o primeiro que deve decidir é para onde vai, e sobre isso tampouco há consenso. Hollandistas como o ex-porta-voz do Eliseu, Stephane Le Foll, que conseguiu ser reeleito, apostam por uma oposição construtiva no novo mandato. Por outro lado, os frondeurs, aqueles que, como Hamon, se rebelaram durante o Governo de Hollande, a quem acusam de ser o principal responsável pela queda socialista, reivindicam um giro decisivo à esquerda. O problema para ambos os lados: as eleições, tanto as presidenciais como as legislativas, castigaram os partidários das duas opções.

Para a ex-ministra da Ecologia e antiga candidata presidencial socialista, Ségolène Royal, são precisamente essas disputas internas as responsáveis pela debacle socialista. “Os eleitores já não aguentam (...) os franceses querem que, quando os partidos existem, pelo menos se entendam entre si e não mostrem essas divisões”, opinou ela, entre os dois turnos.

Uma debacle econômica, além de política

A busca de uma solução não é só uma urgência política. Também está em jogo para os socialistas sua sobrevivência econômica.

No último fim de semana, antes mesmo de se conhecerem os resultados do primeiro turno, algum engraçadinho publicou um anúncio em um site imobiliário colocando à venda a sede do PS, um palacete de 3.000 metros quadrados no elegante 7ème Arrondissement de Paris, muito perto da Assembleia Nacional.

Mas o que por enquanto não passa de uma piada, em algum momento – não muito longe – pode se tornar realidade. Na França, as doações financeiras aos partidos estão condicionadas a seus resultados eleitorais legislativos. E passar de 284 para meia centena de deputados, como ocorreu com o PS, representa, segundo cálculos do Les Echos, um prejuízo de 17 milhões de euros anuais. Ou seja, o PS deverá contar com 85 milhões de euros a menos no próximo quinquênio. A ideia de vender o palacete de Solferino não é nova. A própria Ségolène Royal já havia proposto isso em 2008. Mas representa uma despedida da sede adquirida por François Mitterrand. Claro que na era Macron já não há espaço para tabus, nem para símbolos.

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