_
_
_
_
_

Centenas de manifestantes são detidos em protesto na Rússia, dentre eles o líder da oposição

Protestos clamam contra a corrupção e pedem demissão do primeiro-ministro Medvedev

Policiais detêm o líder da oposição Navalny durante as manifestações em Moscou.
Policiais detêm o líder da oposição Navalny durante as manifestações em Moscou.MAXIM SHEMETOV (REUTERS)
Pilar Bonet

Dezenas de milhares de pessoas saíram neste domingo às ruas de Moscou, São Petersburgo e outras cidades do amplo território russo – inclusive Novosibirsk, na Sibéria, e Vladivostok, na costa do Pacífico, em resposta a uma convocatória de protesto contra a corrupção, organizada por Alexei Navalny. Esse político, que pretende disputar a presidência da Rússia em 2018, foi detido na capital, junto com centenas de pessoas.

As manifestações foram proibidas pelas autoridades, mas, apesar disso, foram realizadas com a participação de inúmeros jovens, segundo informaram as redes sociais e os meios de comunicação russos nas províncias. A julgar por essas informações e pela manifestação de Moscou, a participação de adolescentes em idade escolar foi a característica dominante nos “passeios” (como foram rebatizados os atos para escapar das proibições). Em seu conjunto, trata-se de manifestação de maior envergadura realizada nos últimos anos na Rússia. Na capital, os manifestantes eram ainda mais jovens do que na última marcha, em fevereiro, em homenagem ao político de oposição Boris Nemtsov. Ele foi assassinado perto do Kremlin no fim de fevereiro de 2015. De certo modo, os protestos lembraram aqueles ocorridos em 2011 e 2012 contra as irregularidades nas eleições parlamentares e presidenciais, respectivamente.

Mais informações
Rússia afirma que o mundo se aproxima de uma nova guerra fria
Chefe de campanha de Trump escondeu que já trabalhou para a Rússia
Entenda a espionagem orquestrada pela Rússia para ajudar Donald Trump

Às vésperas das eleições presidenciais de 2018, Navalny se apresenta como o principal adversário de Vladimir Putin, no poder desde 2000. Sobre a possibilidade de Navalny se candidatar há hoje uma certa confusão. O político cumpre – em liberdade provisória – uma condenação por estelionato, e a legislação russa proíbe a candidatura de pessoas que cumprem pena de prisão. Na opinião de observadores, existe uma ambiguidade deliberada para dar opção ao Kremlin de decidir na melhor oportunidade (quando tiver calculado a envergadura da ameaça representada por Navalny) se o deixa participar ou não contra o candidato governista, previsivelmente Putin.

Em 2 de março, Navalny divulgou no YouTube uma investigação dedicada ao chefe de Governo Dmitri Medvedev. No domingo, mais de 11,7 milhões de pessoas já tinham visualizado o filme incriminador, que acusa o primeiro-ministro de ser o beneficiário de um império formado por mansões luxuosas e centenas de hectares em diversas regiões da Rússia (os arredores de Moscou, as regiões de Kursk e Ivanov, as montanhas do Cáucaso e o litoral do Mar Negro), assim como na Toscana, na Itália. Segundo Navalny, a isso se somariam explorações agropecuárias, vinhedos e vinícolas, além de dois iates de luxo. Um mínimo de 70 bilhões de rublos (cerca de 3,8 bilhões de reais) em dinheiro e propriedades teriam ido parar na rede de fundos beneficentes, controlada por pessoas de confiança, sobre a qual se sustenta o esquema que supostamente favorece o primeiro-ministro, que por quatro anos (de 2008 a 2011) substituiu Putin na presidência.

As autoridades russas qualificaram como propaganda eleitoral a última investigação divulgada por Navalny (cujos dados implicam na colaboração de fontes do próprio governo) e ignoraram as graves acusações, da mesma maneira que fizeram com denúncias anteriores de Navalny que atingem altos funcionários, como o procurador-geral Iuri Chaika.

A pouca idade dos participantes nas manifestações deste domingo e a extensão geográfica da convocatória indica que a politização e o descontentamento já chegou às províncias russas, ainda que não se saiba qual será a evolução política e a atitude do regime, que para salvar sua imagem, poderia em última instância prescindir de Medvedev.

No total, os organizadores dos protestos do domingo pediram autorização para realizar manifestações em 100 localidades, mas foram autorizados em 24 delas, segundo o jornal Moskovski Komsomolets. Em locais como Novosibirk, Perm, Kazan e Nizhni Taguil, os juízes legalizaram as marchas, que tinham sido proibidas pelas autoridades locais, informou o mesmo jornal. O poder de convocatória dos atos variou entre algumas centenas de pessoas em Barnaul, em Altai, a milhares (em Vladivostok, Novosibirsk, Samara, Ecaterimburgo, Khabarovsk, Irkutsk e São Petersburgo, entre outros). Em Moscou, centenas de pessoas foram detidas, e um policial sofreu uma contusão. Em São Petersburgo e em Vladivostok, respectivamente, foram presas dezenas de pessoas. Além de Navalny, que passaria a noite no comissariado, também foram detidos membros do Fundo da Luta contra a Corrupção (FLC), organização que o político preside. O centro de negócios onde funciona a sede do FLC foi evacuado com o pretexto de que havia uma ameaça de bomba, segundo funcionários de outras empresas abrigadas pelo Fundo, que esperavam na rua para continuar seu trabalho.

Na capital russa, houve uma impressionante mobilização de forças de segurança, que também fizeram patrulha em helicópteros. As prisões, em muitos casos, tiveram caráter arbitrário. Nas delegacias foram parar turistas e pessoas que simplesmente se encontravam por acaso no local do protesto. Fechado em um furgão policial blindado, o correspondente do canal Dozhd continuava trabalhando e entrevistando estudantes que, como ele, foram detidos e estavam no veículo. Os manifestantes levavam patos de borracha, em alusão às aves que podiam ser vistas em um dos lagos das mansões atribuídas a Medvedev. Outros carregavam um cartaz com os dizeres: “quero uma casa como a dos patos”. Em Moscou não houve bandeiras nem faixas, mas em algumas ocasiões, os manifestantes fizeram coros em alusão a Dmitri Medvedev (marcando as distâncias com uma expressão dura e o diminutivo “Dimon”, em vez de “Dmitri”) e ao presidente (“Putin ladrão”). As forças de segurança foram xingadas com gritos de “vergonha, vergonha” quando realizavam as prisões.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_